Não é difícil chegar à conclusão de que o tema mudanças climáticas e seus principais satélites (aquecimento global, efeito estufa etc.) estiveram na lista de prioridades de parte significativa da mídia noticiosa brasileira nos últimos meses. Basta ler os jornais. Basta estar atento ou atenta às reportagens especiais dos telejornais e aos programas jornalísticos de maior fôlego veiculados, sobretudo, pelos canais pagos.
Se é trivial, portanto, responder à pergunta ‘o jornalismo brasileiro dispensou atenção ao tema das mudanças climáticas recentemente?’, o mesmo não ocorre se a indagação fosse um pouco mais complexa: ‘Como o jornalismo brasileiro cobriu o tema mudanças climáticas recentemente?’
São subsídios para formar uma ou mais respostas a esta pergunta que a caríssima leitora ou o caro leitor vão encontrar no documento Mudanças climáticas na imprensa brasileira – Uma análise de 50 jornais no período de julho de 2005 a junho de 2007, cuja íntegra pode ser obtida aqui (arquivo PDF).
O texto analisa o tratamento editorial dispensado por 50 jornais diários brasileiros ao debate sobre as chamadas mudanças climáticas. O estudo abrange veículos de todos os estados do país, trazendo uma radiografia da cobertura produzida entre julho de 2005 e junho de 2007.
Políticas públicas
Os resultados da pesquisa – fruto de um esforço coordenado pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI), com o apoio da Embaixada Britânica no Brasil – constituem subsídios relevantes para uma leitura mais aprofundada sobre o papel desempenhado pela grande mídia na ampla discussão que vem sendo travada, em nível mundial, acerca das alterações registradas no clima do planeta e das possíveis conseqüências desse fenômeno, no futuro.
Trata-se de um debate central para as políticas de desenvolvimento das diversas nações e – não é exagerado afirmar – para toda a humanidade. Essa é, certamente, a primeira premissa a partir da qual o presente estudo foi elaborado. Isso porque não é possível pensar sob a perspectiva do desenvolvimento sem que se leve em conta o processo de degradação ambiental gerado, nos últimos séculos, a partir da expansão da economia mundial. Por outro lado, vale lembrar que esse cuidado com a sustentabilidade, tão difundido nas décadas mais recentes, traz em sua essência uma preocupação que está na raiz do trabalho desenvolvido pela ANDI desde sua fundação: construir um contexto favorável à qualidade de vida das novas gerações.
Apontadas tais considerações, surge ainda outra importante questão que também embasa a configuração do presente estudo: por que nos dedicarmos a uma análise aprofundada sobre a relação entre a atuação da mídia e o debate acerca das mudanças climáticas?
Nossa opção foi por dedicar esforços na compreensão de como um ator central para a democracia – a imprensa – vem atuando frente a esse importante debate. Para sustentar a necessidade de compreendermos melhor essa relação mídia/mudanças climáticas vale apontar cinco outras premissas fundamentais:
1.
O tema mudanças climáticas conforma uma questão da mais alta relevância para as sociedades contemporâneas.2.
Exatamente por isso, precisa ser agendado de forma prioritária entre a população em geral, mas, sobretudo, entre os chamados tomadores de decisão e formadores de opinião.3.
Precisa ainda ser informado de maneira contextualizada.4.
Da mesma forma, necessita ser alvo de políticas públicas monitoradas pelos atores que conformam o sistema de freios e contrapesos, peça fundamental para a boa governança e para a transparência nas sociedades democráticas.5.
Por fim, ressaltamos que o jornalismo tem como funções fundamentais, exatamente:** agendar os temas prioritários para as democracias contemporâneas;
** prover informação contextualizada sobre esses mesmos temas;
** atuar como watchdog dos formuladores e executores de políticas públicas, colaborando para elevar o nível de accountability dos mesmos.
Janelas de oportunidade
Essas cinco afirmações constituem os pilares da presente investigação.
Nosso objetivo, portanto, é apresentar um mapa bastante detalhado acerca do tratamento editorial oferecido pelas redações brasileiras aos assuntos relacionados às mudanças climáticas. Nesse sentido, cabe apontar algumas perguntas que nortearam a elaboração da pesquisa:
** A imprensa agendou o tema no período? Se sim, como?
** Ao prover informações sobre o tema, a mídia o contextualizou? Ouviu a diversidade de atores envolvidos com o assunto? Buscou abordar o assunto a partir de variadas perspectivas?
** Os diferentes veículos noticiosos desempenharam seu papel de fiscalização dos formuladores e executores de políticas públicas?
Dados que permitem elaborar respostas para estas e outras perguntas estão amplamente distribuídos ao longo da publicação. As principais estatísticas, ademais, podem ser rapidamente encontradas no resumo executivo.
Para finalizar esta rápida apresentação do estudo, gostaria de lembrar o que nos parece ser uma das principais conclusões que se podem derivar da análise de conteúdo realizada: é possível enxergar muitos dos resultados obtidos como lacunas e problemas da cobertura. Não obstante, é possível também vê-los como diversas janelas de oportunidade para o trabalho que a imprensa, certamente, seguirá dedicando ao tema – por decisão própria ou compelida pela realidade. Nosso olhar, como poderão verificar, está mais próximo da segunda alternativa.
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Cientista político e coordenador de relações acadêmicas da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI); foi o coordenador geral da pesquisa sobre a imprensa e as mudanças climáticas