Mal o ano começou e a polêmica veio com ele, nas onze páginas da entrevista concedida pelo ex-ministro José Dirceu à revista piauí, cujos ecos ressoam e respingam sobre cabeças pensantes deste país onde a mídia (impressa ou eletrônica) exerce o papel de marcar o ritmo da música que governo e povo dançam, ao som intermitente dos disses-me-disses e das lavagens de roupas sujas, à vista de declarações dadas e desmentidas, ou não dadas e mentidas.
Complexo e duro o jogo em que uma reportagem escrita por profissional experiente, sem ter sido gravada para a devida documentação para casos de má interpretação, parece marcar faltas nos campos adversários, quando por força da repercussão esperada, o texto é esmiuçado como se fora a medição de regras num campo minado, com disputa acirrada, de jogadores incansáveis.
O personagem lendário Zé Dirceu entrou em campo novamente – logo ele, que parecia encontrar-se no banco dos reservas, mas cuja característica principal de guerreiro e combatente o torna figura central com audiência garantida, para o bem ou para o mal, dividindo com seus pares, aliados ou inimigos políticos, histórias e mais histórias, com direito a elucidações, controvérsias e até processos judiciais de reparação ou esclarecimento.
Consultor e capitalista
No seu blog, publicadas as notas que explicam os equívocos da matéria, o ardiloso homem público que sempre foi deixa claro que joga bem, em face dos conteúdos tornados alvos de interesse de boa parcela da classe política nacional, como um augúrio de embate sólido entre situação e oposição em ano eleitoral recém-iniciado.
Foi dada a partida e os jogadores dos times que disputarão o campeonato político partidário nacional já podem ler nas entrelinhas tanto do texto-estopim que disparou atabalhoadamente o primeiro chute no gramado da esperança nacional. Há indicações para todos os gostos também nas diversas reportagens e artigos que sucedem, como efeito dominó, os urros das onças cutucadas com vara curta pelo engenhoso entrevistado.
A mídia segue sendo alvo do ataque do Zé, que demonstra sua capacidade de permanecer nas manchetes e nas primeiras páginas apesar do afastamento compulsório da vida política e, guardadas as devidas proporções, é possível detectar o quanto há de profundidade nos temas que a reportagem aborda, enquanto se apresenta um novo Dirceu, de feição moderna, exercendo as funções de consultor e capitalista.
Jogadas de mestre
Talvez ele tenha se exposto e se deixado seduzir pela necessidade recorrente dos holofotes a que se acostumou na vida inteira, mas o certo é que, se uma repórter acompanha um entrevistado por dias, em viagem por alguns países, estabelece-se, evidentemente, um grau suposto de confiança que os deixará em situação capaz de revelações plausíveis para divulgação consentida, ou para declarações em off, por acordo tácito.
As notas de esclarecimento publicadas pelo Zé em seu blog, em síntese, espelham um universo de fatores que compuseram não só o texto da piauí, mas sobretudo dão a largada para novas partidas que prometem ser acirradas, e que serão disputadas entre ele e seus companheiros de partido contra os adversários de oposição explícita, estendendo-se à mídia, nem sempre esclarecedora, com direito a dúvidas de apuração necessária, apesar de uma ou outra jogada de mestre, sub-reptícia e implícita. Esperemos os lances dos próximos jogos.
O campeonato está só começando.
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Jornalista, Rio de Janeiro, RJ