As mulheres são consideradas mais honestas e mais competentes que os homens, diz uma pesquisa do Ibope e do jornal O Estado de S.Paulo sobre a participação feminina na política, publicada no domingo (13/1). Por que, então, embora 57% dos entrevistados já tenha votado em mulher e apenas 31% declare que política é coisa de homem, a participação das mulheres na política ainda é tão pequena? É isso que a matéria discute e tenta explicar.
Para começo de conversa, a ‘liberalidade’ do brasileiro tem um limite: as mulheres são consideradas melhores e mais aptas, mas apenas para os cargos ‘menores’. Segundo a pesquisa, 80% votariam numa mulher para vereador, mas o porcentual vai caindo à medida que o cargo ganha importância: 78% para prefeita, 76% para deputada estadual; 75% para deputada estadual; 73% para senadora; 72% para governadora de estado até chegar em 69%, para presidente da República.
A aceitação das mulheres, ao que tudo indica, fica apenas na resposta às pesquisas, pois não se reflete na composição do Congresso: no Senado, são apenas 10 entre as 81 vagas e dos 518 deputados federais só 45 são mulheres – um máximo de 12%, embora a lei determine que os partidos devem ter 30% de mulheres entre seus candidatos.
Duas influências
E isso é apenas o começo, pois as que conseguem chegar lá têm de enfrentar a oposição dos colegas de cargo. Segundo a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), as poucas mulheres que chegaram ao Congresso enfrentam uma barreira invisível: ‘São sempre tangidas para áreas de assuntos de mulher – questões femininas, dos jovens, da infância, da educação. Duro é entrar no debate que interessa, a discussão dos temas econômicos’.
A deputada não está sozinha ao denunciar o preconceito dos colegas políticos. Luíza Erundina, ex-prefeita de São Paulo, ‘se queixa, ainda hoje, de que os caciques do PT lhe deram pouco apoio em 1988: Lula nem foi à posse’.
Afirma Fátima Pacheco Jordão, analista de pesquisas do Ibope:
‘Há um processo de maturação em curso, apontando para a gradual aceitação das mulheres no topo do poder. Esse fenômeno é resultado de duas influências. Uma, a atribuição de muitos cargos de poder às mulheres pelo governo Lula; outra, o destaque de mulheres que disputam e, em alguns casos, ganham o poder em seus países, como as presidentes Michelle Bachelet, no Chile, Cristina Kirchner, na Argentina, e a primeira-ministra Angela Merkel, na Alemanha. Mas a influência maior vem da canidatura de Hillary Clinton, nos Estados Unidos.’
O choro dos corruptos
Michelle Bachelet e Angela Merkel são efetivamente bons exemplos, com trajetória política comparável, no Brasil, à da governadora gaúcha, Yeda Crusius. Fizeram carreira política independente e venceram única e exclusivamente por seus méritos.
Já Cristina Kirchner e Hillary Clinton fazem parte de um outro grupo: o das mulheres que conviveram com o poder ocupando o cargo de primeira-dama e partiram para disputar o cargo que um dia foi do marido. O caso da presidente Argentina foi tratado claramente pela imprensa. Mas, quando se trata da ex-primeira-dama dos Estados Unidos, as coisas não são ditas com todas as letras. Parece que o complexo de terceiro mundo nos impede de noticiar o que até a campanha de Hillary diz claramente: dois pelo preço de um. Bill Clinton é o mais importante cabo eleitoral da mulher, fazendo campanha para ela e dando suporte ao mote de campanha de Hillary, que se declara pronta a governar desde o primeiro dia. Ela não diz, mas os eleitores norte-americanos sabem que, se houver um problema, logo no primeiro dia, ela contará com a experiência do marido para dizer o que fazer.
Segundo Fátima Pacheco Jordão, há ainda outros fatores que deverão, nas próximas eleições, favorecer as mulheres:
‘O desencanto com as representações políticas dominadas pelos homens, o fato dos eleitores acreditarem que, em política, as mulheres são mais honestas do que os homens (48% dos 1.000 entrevistados acreditam nisso) e, finalmente – talvez o dado mais importante –, as eleições de 2008 são para cargos considerados menos importantes: vereadores e prefeitos.’
A candidatura de Hillary Clinton pode até influenciar as mulheres do Brasil a disputar cargos maiores, mas é bom lembrar que se ela está tão forte, isso não é resultado exclusivamente do carisma pessoal ou da carreira política da candidata. É forte porque tem o marido ao seu lado e, dando suporte à candidatura, uma máquina política muito forte. Se vencer, não será porque derramou uma lágrima e comoveu as mulheres. As lágrimas de Hillary estão mais para o choro dos corruptos nas CPIs do Congresso brasileiro do que para uma genuína demonstração de emoção.
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Jornalista