Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Octavio Frias de Oliveira
morre em São Paulo aos 94


Leia abaixo os textos de segunda-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Segunda-feira, 30 de abril de 2007


MEMÓRIA / OCTAVIO FRIAS DE OLIVEIRA
Folha de S. Paulo


Morre publisher da Folha, Octavio Frias de Oliveira


‘O empresário Octavio Frias de Oliveira, publisher do Grupo Folha, morreu ontem à tarde aos 94 anos em São Paulo.


Protagonista da modernização da mídia brasileira na segunda metade do século, Frias pertenceu a uma geração de empreendedores pioneiros dos quais ele era um dos últimos remanescentes e o único a se manter em atividade profissional até o ano passado.


Em novembro, como decorrência de uma queda doméstica, o empresário foi submetido a cirurgia para remoção de hematoma craniano. Teve alta hospitalar na passagem do ano e desde então vinha se recuperando na casa de sua filha Maria Cristina.


Suas condições clínicas pioraram nas últimas semanas, levando à instalação de um quadro de insuficiência renal grave. Ele estava inconsciente havia dois dias. Seu coração deixou de bater às 15h25.


O velório será hoje, a partir das 9h, no cemitério Gethsêmani, à Praça da Ressurreição, 1, Jardim Colombo, São Paulo. O sepultamento será às 12h no mesmo local.


Empreendedor


Depois de atuar no serviço público e nos ramos financeiro e imobiliário, em 1962 Frias adquiriu a Folha em sociedade com Carlos Caldeira Filho.


Em algumas décadas saneou as contas da empresa e a reorganizou em termos industriais, levando a Folha a se tornar o maior e um dos mais influentes jornais do país.


Fez da Folha, também, a base do que é hoje um conglomerado que abrange o maior portal de internet do país, o UOL, o jornal ‘Agora’, o Instituto Datafolha, a editora Publifolha, a gráfica Plural e o diário econômico ‘Valor’, este em parceria com as Organizações Globo.


Fora da mídia, foi também o fundador e proprietário da Granja Itambi, em São José dos Campos, em terreno que comprou para construir sua casa de campo. A empresa chegou a ser uma das maiores do país, com 1.700 funcionários. Hoje, se dedica à pecuária.


Dinamismo


Em agosto do passado foi lançada sua biografia, ‘A Trajetória de Octavio Frias de Oliveira’, de autoria de Engel Paschoal. O livro traz 332 páginas redigidas com base em depoimentos do próprio biografado e de pessoas que testemunharam sua carreira.


Personalidade inquieta e dinâmica, Frias continuava a receber visitantes, supervisionar as empresas e emendar pessoalmente os editoriais até ser hospitalizado em 2006.


Sua atuação na imprensa foi marcada pela independência em relação a governos e grupos econômicos, assim como pela pluralidade das visões que abrigou em seus veículos de informação. Inteligência objetiva, gosto pela inovação e informalidade no trato são aspectos pessoais destacados pelos que conviveram com ele.


Octavio Frias de Oliveira deixa a viúva, d. Dagmar Frias de Oliveira, e quatro filhos, Maria Helena, Otavio, Luís e Maria Cristina.’


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Frias confiava no Brasil, diz Lula


‘O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, 61, afirmou que o Brasil perde um de seus ‘mais lúcidos e destacados homens de imprensa’ com a morte ontem do empresário Octavio Frias de Oliveira.


‘Responsável pela modernização do jornal Folha de S.Paulo e pela sua transformação num dos mais importantes órgãos de comunicação do país, o dr. Frias tinha uma personalidade marcante e cativante, que unia simplicidade, dinamismo, inteligência e confiança no Brasil’, afirmou o presidente.


‘Conheci-o nos anos difíceis em que lutávamos para superar o autoritarismo e reconquistar a democracia. Desde aquela época, ficamos amigos. Tinha por ele grande respeito e carinho. São esses sentimentos que, nesse momento, em meu nome e no do povo brasileiro, quero transmitir à sua família e aos colaboradores e leitores do Grupo Folha.’


O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, 75, lamentou a perda de um amigo. ‘Perdi um amigo e o Brasil, um homem de coragem. Conheci o Frias nos anos difíceis do período autoritário e pude acompanhá-lo de perto durante muitos anos. Sempre o vi inquieto e preservando a independência da Folha, que, junto com a família, era sua grande paixão.’


JOSÉ ALENCAR, 75, vice-presidente da República:


‘É uma perda irreparável. Era uma figura notável.’


JOSÉ SARNEY, 77, ex-presidente e senador (PMDB-AP):


‘Perde o Brasil o seu maior e mais digno construtor de nossa imprensa moderna. Ele era uma criatura do nosso tempo que marcava com sua coragem, seu civismo e seu patriotismo.’


ELLEN GRACIE, 59, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal):


‘Octavio Frias foi um marco no jornalismo brasileiro. Em meu nome e em nome do STF lamento essa grande perda. Frias foi um exemplo de atitudes corretas e de grande rigor com os fatos, sempre com muita ética na prática do jornalismo. Ele deixa um exemplo de coerência para todos nós.’


MARTA SUPLICY, 62, ministra do Turismo e ex-prefeita de SP (PT):


‘É com tristeza que recebo a notícia da sua morte. Quero expressar meu respeito ao grande homem que foi, e transmitir meus sentimentos à família.’


TARSO GENRO, 60, ministro da Justiça (PT):


‘Foi uma grande personalidade da história política e jornalística do nosso país. Acolheu nas páginas da Folha toda a diversidade política e ideológica brasileira.’


RENAN CALHEIROS, 51, presidente do Senado (PMDB-AL):


‘Em nome do Senado, lamento a morte do dr. Frias. Ele não era apenas um empreendedor. Era um homem à frente do seu tempo’


ARLINDO CHINAGLIA , 57, presidente da Câmara (PT-SP):


‘Foi um empresário que entra para a história do Brasil como um empreendedor que, por ter uma visão muito além da comercial, transformou a Folha num dos maiores jornais do país.’


AÉCIO NEVES, 47, governador de Minas Gerais (PSDB):


‘O país perde um de seus homens de maior visão. Considero imensurável a contribuição que Octavio Frias deu à sociedade brasileira em seus mais diferenciados segmentos.’


SÉRGIO CABRAL FILHO, 44, governador do Rio (PMDB):


‘Foi um exemplo de homem de comunicação que sempre lutou para fazer do jornalismo brasileiro um dos mais respeitados do mundo.’


YEDA CRUSIUS , 62, governadora do Rio Grande do Sul (PSDB):


‘Foi um empreendedor, que escreveu a história da imprensa com toda uma cultura de responsabilidade. Isso só se faz quando se tem coragem. O legado dele tem o seu tamanho.’


GILBERTO KASSAB, 46, prefeito de São Paulo (DEM):


‘Seu Frias deixa um exemplo a ser seguido, um homem que construiu um órgão de comunicação que é referência para todos os brasileiros, que ajudou a construir a democracia.’


CESAR MAIA, 61, prefeito do Rio de Janeiro (DEM):


‘Jornalismo no Brasil se confundia com Octavio Frias. A inovação, a coragem e a criatividade que passou às gerações que com ele conviveram e que irão sucedê-lo é um exemplo muito difícil de ser copiado.’


PAULO MALUF, 75, deputado federal (PP-SP), ex-prefeito e ex-governador de São Paulo:


‘Conheci Octavio Frias de Oliveira em 1957, parece que foi ontem. Era um homem perfeito: ético e corajoso ao extremo.


Inaugurou uma nova forma de jornalismo no Brasil, de ouvir todos os lados. Fez um jornal pluralista para que o leitor formasse seu ponto de vista.’


GERALDO ALCKMIN, 54, médico e ex-governador de São Paulo:


‘Com muita coragem, grande amor ao Brasil e invejável visão de futuro, Octavio Frias de Oliveira soube colocar seu nome com o relevo merecido entre os defensores da imprensa independente e da democracia.’


ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, 79, senador (DEM-BA):


‘Octavio Frias de Oliveira marcou uma posição de grande destaque na imprensa brasileira e ninguém o ultrapassou na maneira educada, cortês e sincera de tratar não só os políticos, mas qualquer brasileiro.’


TASSO JEREISSATI, 58, presidente do PSDB:


‘O Frias representa o jornalismo feito com independência e liberdade. Realmente, significa a perda de um dos nomes mais ilustres da imprensa e da recente história brasileiras.’


HENRIQUE MEIRELLES, 61, presidente do Banco Central:


‘A dedicação e o amor do dr. Frias ao jornalismo brasileiro e à construção do Grupo Folha permanecerão como exemplo a ser seguido por todos que prezam a liberdade de imprensa e a democracia.’


MARCO AURÉLIO MELLO, 60, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral):


‘Ele era um amante do jornalismo informativo e independente. Sua trajetória foi fundamental para a democracia. O que ele plantou no Brasil em termos de jornalismo continuará frutificando.’


IVES GANDRA MARTINS, 72, professor de Direito Constitucional:


‘Perdemos um dos maiores símbolos da democracia e da liberdade. Tinha o bom senso dos sábios. Uma das três grandes figuras da imprensa mundial do século 20 e 21.’


CEZAR BRITTO, 45, presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil):


‘Sua morte não desfalca apenas a imprensa. Desfalca o país inteiro. Seu Frias foi um grande brasileiro -um cidadão na acepção plena da palavra.’


PAULO SKAF, 51, presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo):


‘O Brasil perde um dos seus mais importantes empresários. A comunicação perde um líder que soube somar ética, qualidade e coragem. Que seu exemplo de vida sirva para sempre na construção de um futuro melhor para todos.’


JOSÉ SÉRGIO GABRIELLI, 57, presidente da Petrobras:


‘O jornalismo perde um de seus grandes líderes, que comandou em momentos distintos da conjuntura nacional o grande veículo que é a Folha.’


LÁZARO DE MELLO BRANDÃO, 80, presidente do Conselho de Administração do Bradesco:


‘É uma perda profunda para nós, seus amigos, a sociedade e o Brasil, pelo trabalho que realizou no sentido de construir um grande jornal que orientou e mostrou caminhos de construção da democracia.’


ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES, 77, empresário, presidente do grupo Votorantim:


‘O sr. Frias era amigo do meu pai. Homem sério, competente e também de uma extrema delicadeza. Perdemos não só um grande jornalista mas um grande brasileiro. Era como um pai para mim. Uma pessoa correta, sincera, séria e muito alegre também. Em momentos difíceis, dizia ‘não fique amedrontado, o Brasil é um grande país’. Viveu para o trabalho. Lamento profundamente.’


JORGE GERDAU JOHANNPETER, 70, presidente do conselho de administração do Grupo Gerdau:


‘Octavio Frias de Oliveira foi um inovador na imprensa brasileira. Contribuiu muito para a democracia e a livre discussão de idéias.’


JOÃO SAYAD, 61, secretário estadual de Cultura:


‘Vamos sentir muita falta de uma pessoa tão querida, tão cheia de energia. Um exemplo para todos nós. É o que estou sentindo.’


MARIA CONCEIÇÃO TAVARES, 77, economista e ex-deputada:


‘Sinto muito a morte do doutor Frias. O maior diretor de jornal que conheci em minha vida. Acho que os profissionais da velha guarda sentirão como eu a perda desse grande jornalista.’


RAUL CUTAIT, 56, médico gastroenterologista, professor da Faculdade de Medicina da USP:


‘Eu tinha uma grande admiração por ele como pessoa e como jornalista. Era de uma vivacidade e de uma curiosidade muito grandes.’


DOM ODILO SCHERER, 57, arcebispo de São Paulo:


‘Lamento muito, é uma notícia dolorosa. Quero manifestar minha solidariedade com todos os membros da Folha, com a direção e, antes de tudo, com a família do seu Frias. Quero manifestar também a minha solidariedade a todos os que se beneficiaram de seu trabalho, todos os trabalhadores, todos os jornalistas, todas as pessoas da Folha de S.Paulo. Peço a Deus que olhe pelo seu Frias e o acolha também no seu reino.’’


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Repercussão


‘‘Era um patriota, um democrata, um homem de grande visão empresarial e um dos maiores inovadores da imprensa brasileira’


ROBERTO CIVITA


presidente do Conselho Administrativo do Grupo Abril e da Editora Abril


‘Foi o homem que transformou a Folha no jornal de opinião que é hoje. Mesmo sendo concorrentes, tive o privilégio de ser sempre seu amigo’


RUY MESQUITA


acionista, membro do Conselho de Administração e diretor de Opinião do Grupo Estado


‘Ele era um admirador do meu trabalho porque via em mim um homem tão esforçado quanto ele’


SILVIO SANTOS


proprietário do SBT


‘Ele foi um homem que dedicou toda a sua vida ao trabalho’


JOÃO CARLOS SAAD


presidente do Grupo Bandeirantes


‘Ele fez com que a Folha se tornasse um jornal reconhecido. E teve a sorte de que seus filhos se interessassem pelo negócio’


JAIME SIROTSKY


presidente do Conselho de Administração do grupo RBS


‘Embora eu não o tenha conhecido pessoalmente, sempre reconheci nele o pluralismo’


MAURÍCIO AZÊDO


jornalista, presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa)


‘Foi uma figura ímpar, um empresário de rara visão. Frias tinha um forte compromisso com o Brasil e sua gente’


BORIS CASOY


âncora da TV JB


‘Não tinha vinculação com o jornalismo, mas deu uma contribuição indelével para a imprensa nacional’


ALBERTO DINES


editor do ‘Observatório da Imprensa’’


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Empresário foi obstinado por independência e novidades


‘Obcecado pelo trabalho, estabeleceu para a imprensa brasileira um patamar inédito de distanciamento frente aos poderes político e econômico, baseado na pluralidade e no espírito público do jornalismo.


Penúltimo dos nove filhos do casal Luiz Torres de Oliveira e Elvira Frias de Oliveira, Frias nasceu em Copacabana, em 5 de agosto de 1912.


Pertencia a uma família tradicional do Rio de Janeiro. Seu bisavô fora o Barão de Itambi, político influente no Segundo Reinado. Seu avô, Luiz Plinio d’Oliveira, construiu os Arcos da Lapa, adutora que trazia água de Santa Tereza para o centro da capital.


Apesar dessas raízes, sua infância foi marcada por dificuldades. Em 1918, seu pai, que era juiz de direito em Queluz (SP), licenciou-se para trabalhar com o industrial Jorge Street, casado com uma tia de Elvira, um pioneiro do setor têxtil. A família mudou-se para São Paulo, e Frias foi estudar no Colégio São Luís, mantido por padres jesuítas e um dos mais conceituados da cidade.


Antes de completar oito anos, Frias perdeu a mãe. Em seguida, a família foi abalada com a quebra da indústria de Street e passou a viver apuros financeiros. Já não era mais possível pagar em dia as mensalidades do colégio, freqüentado pela elite paulista, e o menino Frias ia às aulas com sapato furado, forrado com jornal por dentro para tapar o buraco. Gostava de história universal, sonhava em ser advogado, mas resolveu abandonar os estudos aos 14 anos para começar a trabalhar.


Seu primeiro emprego (1926) foi como office-boy na Companhia de Gás de São Paulo, que pertencia, como grande parte dos serviços públicos da época, a empresários ingleses.


Passou a ajudar nas despesas da casa e chamou a atenção de seus chefes. Em três meses foi promovido a mecanógrafo, ou seja, operador de máquinas de contabilidade.


Em 1930, foi convidado e aceitou um posto na Secretaria da Fazenda do governo do Estado, a fim de organizar a confecção mecânica dos tributos. Para aumentar a renda, vendia rádios à noite. Em 1940, já era diretor do Departamento Estadual do Serviço Público, respondendo pela diretoria de Contabilidade e Planejamento.


Embora adotasse, desde cedo, uma atitude cética em relação à política, alistou-se nas tropas da Revolução Constitucionalista, que eclodiu em julho de 1932. Permaneceu dois meses em Cunha, na região do Vale do Paraíba, onde passou o aniversário na trincheira, participou de escaramuças e viu companheiros serem mortos. Acreditava que a ação militar contra o governo central, entretanto, era uma aventura fadada ao fracasso e não alimentava simpatia pela liderança oligárquica do movimento.


Nos anos seguintes, manteve-se distante tanto do comunismo como do integralismo, as duas correntes que empolgavam a juventude. Seus interesses estavam na atividade empresarial. Passou a se dedicar aos negócios a partir do início da década de 40, contrariamente aos conselhos de seu pai, que prezava a estabilidade do serviço público.


Quando garoto, Frias assistiu a inúmeras discussões entre seu pai e seu tio-avô, o empresário Jorge Street, que ergueu três impérios empresariais e foi três vezes à falência.


Construiu, 15 anos antes da Revolução de 1930 e do advento das leis trabalhistas, a Vila Maria Zélia, no Brás, que provia os operários de moradia, escola e assistência médica. Freqüentemente, as discussões entre o juiz e o industrial, parentes por casamento, versavam sobre as vantagens e desvantagens da social-democracia escandinava, que despertava, então, grande curiosidade.


Em 1943, Frias participou, na condição de um dos acionistas-fundadores, do estabelecimento do Banco Nacional Imobiliário (BNI, mais tarde Banco Nacional Interamericano), sob a liderança de Orozimbo Roxo Loureiro. Como diretor da carteira imobiliária, lançou um programa de condomínios a preço de custo. Foram construídos, assim, mais de uma dezena de prédios, entre eles o Copan, que viria a se tornar um dos símbolos de São Paulo.


Convidado por Frias, de quem se tornou amigo, Oscar Niemeyer projetou ainda, além do Copan, a Galeria Califórnia, na rua Barão de Itapetininga, um prédio na praça da República e outro na rua Direita, antiga sede das Indústrias Matarazzo. Um discípulo de Niemeyer, o arquiteto e pintor Carlos Lemos, projetou na mesma época, com financiamento do BNI, o Teatro Maria Della Costa. Cândido Portinari e Di Cavalcanti fizeram painéis para alguns desses edifícios e também se tornaram amigos de Frias.


Como diretor de banco, viajou várias vezes aos Estados Unidos, onde tomou contato com a cultura empresarial norte-americana e foi fortemente influenciado por ela.


O BNI inovou ao criar o ‘canguru-mirim’, campanha de estímulo à poupança infantil. Chegou a vender prédios para o advogado José Nabantino Ramos, então controlador da Folha e um dos pioneiros na introdução da psicanálise em São Paulo.


Por divergências quanto à administração, Frias deixou o banco. No dia seguinte ao rompimento com Loureiro, Frias caiu do cavalo e quase teve uma fratura de espinha. Ficou seis meses engessado. Semanas depois, o automóvel que dirigia entrou na traseira de um caminhão parado, sem sinalização, na via Dutra. Morreram Zuleika Lara de Oliveira, sua primeira mulher, e um irmão dele, José. Seis meses após sua saída do banco, o BNI foi adquirido pelo Bradesco, depois de ter entrado em liquidação.


Frias fundou, em 1953, uma empresa própria (Transaco -Transações Comerciais), uma das primeiras firmas especializadas na venda de ações diretamente ao público.


Traduziu para o português o livro ‘Do Fracasso ao Sucesso na Arte de Vender’, clássico comercial do norte-americano Frank Bettger. Organizou cursos de vendas -algo inédito no Brasil-, para uma equipe que chegou a contar com 500 vendedores.


Frias se casou novamente com Dagmar de Arruda Camargo, que já tinha uma filha de casamento anterior, Maria Helena, e com quem teve três filhos: Otavio, Luís e Maria Cristina.


Data desse período na Transaco sua primeira ligação com a imprensa: a empresa prestou serviços profissionais à ‘Tribuna da Imprensa’, o jornal carioca de Carlos Lacerda, e à ‘Folha da Manhã’ de Nabantino.


Este havia transformado um diário pouco expressivo num jornal moderno. Em 1960, foram reunidos três títulos da empresa (o carro-chefe ‘Folha da Manhã’, a ‘Folha da Tarde’ e a mais antiga ‘Folha da Noite’, fundada por Olival Costa e Pedro Cunha em 19 de fevereiro de 1921) num só jornal -a Folha de S.Paulo.


Em 1954, o empresário comprou um pequeno sítio nas proximidades de São José dos Campos, no interior paulista. Mas as intenções de lazer não duraram muito tempo.


Logo o sítio se transformou em granja e depois num empreendimento avícola de porte, que chegou a manter um plantel de 2 milhões de aves. Atualmente, a Granja Itambi se dedica apenas à pecuária.


Associado ao empresário Carlos Caldeira Filho, Frias fundou a Estação Rodoviária de São Paulo, inaugurada em 1961. Mas o principal empreendimento dos dois sócios seria concretizado pouco depois, em 13 de agosto de 1962, com a aquisição da Folha de S.Paulo, que disputava, com o ‘Diário de S.Paulo’, a posição de segundo jornal da capital paulista, e que atravessava período de dificuldades financeiras.


Agastado com a greve dos jornalistas de 1961, Nabantino decidira se desfazer do controle acionário do jornal.


Frias e Caldeira, respectivamente presidente e superintendente da empresa, voltaram-se à tarefa prioritária de recuperar o equilíbrio financeiro do jornal. Para dirigir a Redação, Frias nomeou o cientista José Reis, um dos criadores da Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência (SBPC).


Trouxe para integrar a equipe o responsável pela modernização do rival ‘O Estado de S. Paulo’, o jornalista Cláudio Abramo, que viria a suceder Reis e manter, com Frias, uma produtiva convivência profissional que se prolongou por mais de 20 anos.


Em 1964, a Folha apoiou a derrubada do presidente João Goulart e o estabelecimento de um regime de tutela militar -temporária, conforme se acreditava- sobre o país.


Superada a fase de adversidades econômico-financeiras, a nova gestão passou a se dedicar à modernização industrial e à montagem de uma estrutura de distribuição que alicerçou os saltos de circulação que estavam por vir. Foram comprados novos equipamentos e impressoras nos EUA.


Em 1968, a Folha se tornava o primeiro jornal latino-americano a ser impresso no sistema offset. Em 1971, outro pioneirismo: o jornal adotava composição ‘a frio’, abandonando os tradicionais moldes de chumbo. A Folha crescia em circulação e melhorava sua participação no mercado publicitário.


No final dos anos 60, Frias chegou a organizar o embrião de uma rede nacional de televisão, congregando à TV Excelsior de São Paulo, líder de audiência cujo controle adquiriu em 1967, mais três emissoras no Rio de Janeiro, em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul. Por insistência de Caldeira, porém, os dois sócios abandonaram a empreitada em 1969.


Mais ágil e inovador do que o concorrente tradicional, a Folha ganhava espaço junto às camadas médias que ascenderam com o ‘milagre econômico’, fixando-se como publicação de grande presença entre jovens e mulheres.


Ao mesmo tempo, dedicava-se com desenvoltura crescentea áreas do jornalismo até então pouco exploradas, como o noticiário econômico, esportivo, educacional e de serviços.


Em 1968, em companhia de Carlos Caldeira, Frias assumiu a Fundação Cásper Líbero, na época em sérias dificuldades financeiras. O equilíbrio econômico foi alcançado, a TV Gazeta, inaugurada. Ambos se retiraram tão logo a situação se normalizou.


A partir do final de 1973, o jornal passou a adotar uma atitude política mais independente e afirmativa, em vez da ‘neutralidade’ acrítica do intervalo 1968-1973.


A Folha apoiou a idéia da abertura política e se colocou a serviço da redemocratização, abriu suas páginas para todas as tendências de opinião e incrementou o teor crítico de suas edições.


Frias acreditava firmemente na filosofia de uma publicação isenta e pluralista, capaz de oferecer o mais amplo leque de visões sobre os fatos. Encontrou um colaborador habilitado em Cláudio Abramo, responsável pela área editorial entre 1965 e 1973, sucedido por Ruy Lopes (1973), e Boris Casoy (1974), reconduzido a essa função em 1975, onde permaneceu até 1977, quando Casoy, em meio à crise provocada por uma tentativa de golpe militar contra o presidente Ernesto Geisel, foi convidado por Frias a retornar ao cargo.


Abramo reformulou o jornal e fez a primeira (1976) de uma série de reformas gráficas que se sucederiam.


Reuniu colunistas como Janio de Freitas, Paulo Francis, Tarso de Castro, Glauber Rocha, Flavio Rangel, Alberto Dines, Mino Carta, Osvaldo Peralva, Luiz Alberto Bahia e Fernando Henrique Cardoso.


A Folha se transformava num dos principais focos de debate público do país. Ao contrário de algumas expectativas, essa linha editorial foi preservada e desenvolvida durante o período em que Casoy foi editor-responsável.


Em 1983-84, a Folha foi o baluarte, na imprensa, do movimento Diretas-Já, a favor de eleições populares para a Presidência da República. Apoiou o Plano Cruzado, em 1986, e fez campanhas contra o fisiologismo político durante o governo José Sarney, manifestando-se contrária à prorrogação do mandato presidencial.


O jornal manteve-se em posição crítica durante a ascensão e o apogeu de Fernando Collor. Embora apoiasse suas propostas de liberalização econômica, foi a primeira publicação a recomendar o impeachment do chefe do governo, que acabou caindo em 1992.


Em 1986, tornou-se o jornal de maior circulação em todo o país, liderança que mantém desde então. Em 1995, um ano depois de ultrapassar a marca de 1 milhão de exemplares aosdomingos, a Folha inaugurou seu novo parque gráfico, considerado o maior e tecnologicamente mais atualizado na América Latina, um projeto orçado em U$S 120 milhões.


Em 1991, Frias e Caldeira decidiram dissolver a sociedade que mantinham, cabendo ao primeiro a empresa de comunicações e ao segundo os demais negócios e imóveis em comum.


A partir de meados da década de 80, Octavio Frias de Oliveira começou a transferir a operação executiva para seus filhos Luís e Otavio, respectivamente nas funções de presidente e diretor editorial do Grupo Folha.


Até poucos meses atrás, o publisher participava do dia-a-dia do jornal, seja acompanhando os números da empresa, seja definindo a linha dos editoriais, seja criticando reportagens ou recomendando pautas jornalísticas.


Embora tenha sempre afirmado não ser jornalista, mas empresário, trouxe furos de reportagem, como a notícia de que o estado de saúde de Tancredo Neves era muito mais grave do que afirmavam, em março de 1985, médicos e autoridades do novo governo.


Consolidado o seu papel na imprensa brasileira, o Grupo Folha passou a investir em novas tecnologias. Em 1996, lançou o Universo Online (UOL), principal provedor de conteúdo e de acesso à internet do país. Líder absoluto na categoria de notícias da rede brasileira, o UOL é hoje uma empresa de capital aberto, na qual o Grupo Folha tem 41,9% das ações, o grupo de telefonia Portugal Telecom tem 29% e o restante está em poder do público.


Atualmente, a Folha é o centro de uma série de atividades na esfera da indústria das comunicações, abrangendo outros jornais -o ‘Agora São Paulo’, campeão de vendas em bancas no Estado de São Paulo, o ‘Valor Econômico’, lançado em 2000 em associação com as Organizações Globo, e o ‘Alô Negócios’, o maior jornal de Curitiba em número de classificados.


Fazem parte também do grupo: o Datafolha, instituto de pesquisas de opinião, a Publifolha, editora de livros, o Banco de Dados da Folha, a Folhapress, agência de notícias, a Plural, maior indústria gráfica de impressão offset do país, a São Paulo Distribuição e Logística, em parceria com o Grupo Estado, e a Transfolha.


Na construção de todas essas empresas, Frias mostrou seus traços mais marcantes: inteligência prática e intuitiva, o tino comercial, a informalidade no trato, a curiosidade pelos empreendimentos produtivos. De hábitos simples, quase espartanos, ele era agnóstico em religião, liberal em política e economia e, até alguns anos atrás, praticante de esportes.


Nos últimos anos, recebeu uma série de homenagens. No79º aniversário da Folha, em fevereiro de 2000, a Câmara dos Deputados, em seção solene, homenageou o Grupo Folha e seu publisher. Em 2002, a Fiam (Faculdades Integradas Alcântara Machado) inaugurou a cátedra Octavio Frias de Oliveira, com programação de seminários mensais. Frias recebeu da entidade o título de professor honoris causa em fevereiro.


Em dezembro, a Fundação Professor Edevaldo Alves da Silva, do Centro Universitário Alcântara Machado, em São Paulo, lançou o livro ‘Octavio Frias de Oliveira: 40 Anos de Liderança no Grupo Folha’, reunindo textos de jornalistas que trabalharam ou trabalham na empresa.


Em 3 de maio do ano passado, o publisher da Folha recebeu o prêmio Personalidade da Comunicação 2006, concedido pelo 9º Congresso Brasileiro de Jornalismo Empresarial, Assessoria de Imprensa e Relações Públicas.


Em agosto, foi lançado no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, o livro ‘A Trajetória de Octavio Frias de Oliveira’, escrito pelo jornalista Engel Paschoal e editado pela Mega Brasil. A Publifolha relançou o livro em março deste ano (328 págs.). A obra traça um perfil do empresário e traz depoimentos de diversas personalidades do mundo político, empresarial e jornalístico.


No dia 4 de setembro passado, o então governador Cláudio Lembo condecorou Frias com a Ordem do Ipiranga, a mais elevada honraria do Estado de São Paulo.


De franqueza desconcertante, mas avesso a entrevistas, surpreendeu ao dar uma declaração em 2003 comentando o estado de endividamento da mídia no país. Estava em discussão a possibilidade de o BNDES conceder empréstimos ao setor. Disse Frias: ‘O que interessa ao governo é a mídia de joelhos. Não uma mídia morta. Uma mídia independente não interessa a governo nenhum’.’


 


Gilberto Dimenstein


Professor doutor Frias


‘AINDA não eram 8h, eu estava sozinho na Redação da Sucursal da Folha em Brasília, o telefone tocou e a secretária, com voz esbaforida, alertou-me de uma invasão: um indivíduo desconhecido resolveu entrar sem se apresentar.


‘Você acha que eu devo chamar alguém para expulsá-lo?’, perguntou. Antes que eu pudesse responder, o intruso estava bem à minha frente. Era o senhor Frias, que tinha um encontro matinal com alguma autoridade e, sem aviso, passou antes na Redação. A secretária não fazia a menor idéia de que ela tinha falhado (sorte dela) em tentar barrar a entrada do dono em seu próprio jornal.


A secretária não tinha culpa. Ele era avesso a publicidade, quase nunca sua foto era publicada. Não se considerava personagem nem notícia. Muita gente na Folha não passaria pelo teste; no elevador, via como muitos funcionários não sabiam quem era aquele senhor.


Desde que vim para São Paulo e me instalei no nono andar, onde o Frias tinha sua sala, pude conhecê-lo de perto. Nunca entendi direito se ele não tinha a noção exata do tamanho da sua obra empresarial.


Ou, se tinha, não a considerava importante. Nunca tinha conhecido um indivíduo tão poderoso e, ao mesmo tempo, tão desprovido de vaidade. Garanto que eu teria flagrado a falsa humildade tantas foram as conversas informais durante tanto tempo em salas fechadas, sem testemunhas.


Suspeito que a escassez de vaidade se devia a uma abundância de curiosidade. Nos seus 90 anos, Frias parecia um menino quando lhe contavam uma novidade. Era chamado a acompanhá-lo em visitas que recebia, muitas delas vinham tratar de assuntos técnicos e, confesso, chatíssimos. De repente, ele engatava na conversa, seus olhos brilhavam, fazia perguntas e mais perguntas. Era o prazer do novo, só isso. Essa curiosidade compulsiva talvez lhe dissesse que viver é uma aventura infinita na sua capacidade de produzir surpresas, o que o faria sentir, nesse jogo, apenas um fragmento, no qual a glória é perecível.


Frias não gostava que o chamassem de doutor. Por isso, era sempre ‘seu’ Frias. Mas, por causa de sua curiosidade combinada com uma aguda intuição, sabíamos de seu faro de grande repórter, autor de furos anônimos. Ou de sua capacidade de perceber, à frente, tendências. Impossível não aprender com ele e não encará-lo como um professor doutor.’


Janio de Freitas


O grande legado do jornalista


‘QUEM suponha conhecer o legado de Octavio Frias de Oliveira está iludido. Sua contribuição ao jornalismo brasileiro, derrubando barreiras delimitadoras da liberdade de pensamento e da independência de opinião na imprensa, ainda está por ser mensurada, mas já é bastante conhecida. Não é o que se passa com os alcances da inovação para além da imprensa. Caso, entre outros, das origens da democracia que vivemos.


O esgotamento do regime militar deveu-se a um movimento de opinião que lhe bloqueou as alternativas de sobrevida. O acolhimento pela Folha das insatisfações que despontavam no empresariado influente, cresciam ainda mais no professorado, na intelectualidade, nos artistas, e brotavam mesmo entre políticos do ‘sistema’, foi a força motriz da arrancada com que o movimento de opinião contaminou a maior parte da imprensa e assim disseminou-se pelo país todo. Sem tal movimento, o regime não teria dificuldade maior para consumar sua continuidade, a despeito de tudo. O que implica reconhecer uma relação direta entre o núcleo difusor das opiniões pela redemocratização e a antecipação do fim do regime militar.


Parte do legado de Octavio Frias de Oliveira. Neste exemplo já histórico está a demonstração de uma grandeza pessoal incomum, envolta na combinação incomum de ausência absoluta de arrogância, finura diplomática e uma sensibilidade extraordinária para perceber e compreender os enredos e os pormenores. Falta-nos descortinar essa grandeza e seus efeitos.


Octavio Frias de Oliveira, que grande homem, que legado gigantesco.’


Clóvis Rossi


O repórter que não se achava jornalista


‘OCTAVIO Frias de Oliveira foi o empresário mais jornalista que jamais conheci, mais jornalista de verdade que muito jornalista diplomado. Era como empresário ou, às vezes, como comerciante que se autodefinia, sempre que as personalidades que visitavam a Folha -e não foram poucas, de todas as cores e de todos os calibres- o chamavam de ‘doutor’ ou o tratavam de jornalista. ‘Não sou doutor, não sou jornalista’, reagia, no jeito direto e franco de ser.


Mas era, sim, jornalista, um tremendo repórter, como fui descobrindo rapidamente nos exatos 20 anos de convivência praticamente diária e próxima, a partir do instante em que ele e seu filho, Otavio, diretor de Redação, me convidaram para escrever a chamada ‘coluna São Paulo’, da página 2 da Folha, pouco depois da morte de Cláudio Abramo, em 1987.


Antes, conheci uma outra faceta que me conquistou de imediato. Comecei na Folha em 1980, no exato momento em que a extrema-direita cometia atentados a bomba contra bancas de jornal, escritórios de oposicionistas e até a Ordem dos Advogados do Brasil, no Rio de Janeiro.


Escrevi, apenas semanas depois de contratado, um texto em que dizia que, se se quisesse chegar aos autores, bastava bater às portas do DOI-Codi, o coração do sistema repressivo montado no regime militar (no ano seguinte, o atentado frustrado ao Riocentro provou que a informação era corretíssima).


Na noite em que o texto foi publicado, ‘seu’ Frias telefonou para minha casa, me oferecendo refúgio em sua granja de São José dos Campos. Contou que a reportagem provocara muito ruído e que talvez fosse prudente asilar-me por uns dias. Preferi ficar em casa, mas me surpreendeu um patrão, tido como duro e inflexível, dar-se ao trabalho de tentar proteger um funcionário que ele nem sequer conhecia pessoalmente e que havia acabado de começar na empresa que ele comandava.


Proteção que continuou ao longo do tempo. Sei, por terceiras pessoas, jamais por ele, que houve várias queixas a meu respeito por parte de autoridades (algumas até amigos pessoais dele). Jamais me transmitiu uma só que fosse.


Durante a ditadura Pinochet, por exemplo, sei que funcionários diplomáticos chilenos mais de uma vez estiveram na Folha para reclamar. A única vez em que ele se manifestou sobre os constantes textos que fazia sobre o Chile foi para dizer que estivera no país e não vira exatamente o que eu estava relatando. Mas, acrescentou, ‘você é livre para escrever o que viu’.


E continuei escrevendo o que estava vendo.


Muitos anos depois, Fernando Henrique Cardoso, já ex-presidente, contou que desistira de reclamar do jornal para o seu ‘publisher’, embora fosse muito amigo dele: ‘Com o Frias, não adianta reclamar’.


Já o repórter Frias revelou-se, inicialmente, num ‘furo’ célebre, o de descobrir que o mal que levara o presidente Tancredo Neves ao hospital, na véspera da posse, era um leiomioma (um tumor, portanto) e não uma diverculite, como foi anunciado oficialmente.


Alguns dos repórteres da própria Folha que acompanhavam o caso em Brasília acharam que era imprudência o jornal sair com a manchete anunciando o leiomioma. Era ‘furo’, não era imprudência.


Em outro momento, o repórter Frias passou pela minha salinha no nono andar do prédio da Folha e comentou: ‘Fulano me disse que um diretor do Banco Central está caindo. Vamos apurar’.


Não vou contar quem era o ‘fulano’ porque é, ainda hoje, figurão importante na República. Como era raro que ‘seu’ Frias me contasse a fonte de uma informação sigilosa ou de bastidor que recebia – e recebia-as por quilo-, imediatamente comentei com ele: ‘Não é um diretor, é o presidente do BC que vai cair’ (o presidente era Gustavo Franco, aquele que torrou bilhões de dólares das reservas brasileiras para defender um valor irreal para o real ante o dólar).


Passei a tarde e parte da noite telefonando para todas as pessoas que pudessem ter alguma informação. O horário de fechamento da edição nacional já havia passado, todos os demais ocupantes do nono andar já haviam ido embora, e eu não tinha nada. Até que ‘seu’ Frias saiu de sua sala, com aquela sanha de repórter de filme de antigamente, com a confirmação: ‘O Gustavo já está até limpando as gavetas. Você pode fazer o texto?’.


Fiz. Mas confesso que, como o pessoal que cobria a internação de Tancredo Neves, tinha um certo medo de que a informação fosse exagerada, prematura. Tanto que a principal decorrência da queda de Gustavo Franco – o fim do câmbio fixo – foi tratada em apenas uma linha da notícia, sem o aprofundamento.


Outro episódio envolvendo o Banco Central ocorreu no governo Sarney. Eu tinha a informação de que o Brasil transferira suas reservas para um lugar seguro. Era a evidência óbvia de que o país entraria em moratória, e por isso precisava pôr as reservas longe do alcance de eventuais tentativas de confisco.


Estava escrevendo o texto quando ‘seu’ Frias me chamou a um almoço no nono andar (que ainda não era meu habitat) para expor o que eu sabia aos economistas da casa, muitos deles então membros do Conselho Editorial. Expus. Houve uma chuva de dúvidas e resistências, menos aos fatos expostos e mais à lógica da moratória. Eu não estava interessado na lógica da moratória, mas nos fatos.


Logo descobri que ‘seu’ Frias também queria fatos. Desci para continuar escrevendo, já meio desanimado, imaginando que o texto não sairia. Nem meia hora depois, ele me ligou: ‘Conferi com fulano a tua informação. Pode ir em frente’. (Desta vez, não me disse quem era o ‘fulano’.)


Depois, de tanto em tanto, ligava de novo, para passar novas informações. Tantas informações que o texto ficou enorme, contrariando aliás o gosto dele por textos mais curtos.


O gosto pela informação combinava com o zelo pelo texto dos editoriais, que corrigia, com os editorialistas, linha por linha, vírgula por vírgula. Sempre que embatucava com alguma frase que achava pouco clara, usava um bordão: ‘Será que sua excelência vai entender?’. (‘Sua excelência’ era a maneira de referir-se ao leitor.)


Já as outras ‘excelências’ -os presidentes da República-, conheceu-as todas, de Getúlio Vargas em diante. Sem, no entanto, achar-se ele próprio ‘doutor’ ou ‘personalidade’. Seu jeito de ser era tão despojado que permitiu uma cena muito engraçada quando Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à Presidência em 1989, almoçou na Folha.


Terminado o almoço, longo, com direito à incomum repetição do cafezinho, estávamos todos começando a levantar das cadeiras quando Lula passou o braço em torno dos ombros de ‘seu’ Frias e disse: ‘Frias, você ainda vai se orgulhar desse petezinho’, como se estivesse abraçando um entusiasmado militante-fundador do PT.


Não sei quem fará mais falta agora, se o repórter Frias ou se o ‘publisher’ capaz de deixar à vontade os presidentes e também ficar à vontade com eles, sem, no entanto, transmitir suas queixas aos jornalistas.’


 


MÍDIA & JUSTIÇA
Caetano Lagrasta Neto


Cidadãos acima de qualquer suspeita


‘SEMPRE SERÁ difícil escrever no fragor dos acontecimentos, mas este é o dilema do jornalismo responsável: a falta, omissão ou demora no redigir notícias ou comentários indicam covardia ou envelhecimento. Do noticiário de hoje, se extrai ao menos uma certeza: membros de Poder envolvidos com o crime organizado devem ser exemplarmente punidos, especialmente aqueles submetidos ao Estado-Justiça, por ser o único ainda capaz de se opor à complacência do Estado-poder.


Após a seqüência ininterrupta de escândalos -que, felizmente, desde algum tempo, têm sido ao menos objeto de notícia e alguma apuração-, se verifica que o cerne do fenômeno continua sem ser molestado. São detidos e, logo depois, soltos, graças aos advogados excelentes e às fraturas da lei, os agentes periféricos da magistratura, da polícia, da advocacia, dos congressistas, da delinqüência organizada, as simples lavadeiras do dinheiro sujo, e assim vai.


Mas, onde os chefes ou o chefe de todos os chefes? Quer dizer então que o crime organizado são as estruturas do bingo, do jogo do bicho, do contrabando, mas nada tem a ver com o as estruturas do poder de Estado, do tráfico de entorpecentes, do cassino financeiro? É mesmo?


Será talvez porque os bicheiros e traficantes de morros e subúrbios estão isolados em seus respectivos redutos e, por sorte, acabam por patrocinar chacinas apenas entre suas gangs e jovens devedores ou informantes ou que o contrabando é o ‘seu’ Lao e o dinheiro sujo é lavado pelo ‘Barcelona’?


Se assim for, podemos dormir tranqüilos. O Estado não só vigia como pune, principalmente negros, putas, pobres, mesmo que o produto do crime se mostre reles e desde que estes agentes apodreçam nas prisões pelo furto de um xampu ou de algumas cebolas, enquanto aqueles acabam libertos, logo depois -coisas, aliás, admitidas como edificantes exemplos.


E a mídia, tem ela correspondido à sua função de informar e criticar?


Criticar é tarefa fácil se a partir do noticiário disponível, pois se este não se reveste de fundamento científico e não se apresenta razoavelmente comprovado, é suficiente para denegrir o indiciado, fazer estardalhaço e nada concluir, sempre sob o manto da ‘liberdade de imprensa’. Porém, não há como negar que investigações jornalísticas que acabaram na renúncia de Nixon ou, ante a repercussão, no impeachment de Collor, se revestiram de ampla margem de segurança e certeza. Não assim aquelas do Toninho do PT ou de Celso Daniel, que nem sequer se sabe aonde foram parar.


Releva mencionar, pela gravidade: o noticiário sobre crime organizado ou providências legislativas votadas em outros países recebem acompanhamento pífio.


Ninguém sabe o que aconteceu com a máfia italiana após as mortes de Falcone e Borsellino e das prisões de Totó Riina e Provenzano. Também não se noticiou sobre as providências para seu combate integrado. Mas já se sabe que a era Berlusconi perseguiu, com sua maioria legislativa, juízes (membros do Ministério Público) do ‘pool antimáfia’, arrancando-lhes o poder das detenções e a amplitude das investigações -sempre por pressão dos deputados e senadores, aliados aos grandes escritórios de advocacia, instrumentos evidentes dos criminosos de colarinho branco.


Assim, e sempre, na história da humanidade, aquele que é rei tem pelo menos um olho e, desde que possa viajar ou importar livros, revistas e jornais, se souber ler em outra língua, se tiver acesso à internet ou às televisões estrangeiras, acaba por impor vantagem sobre a patuléia.


Impõe-se concluir que essa espécie de ‘perseguição’, espalhafatosa e quase sempre ineficiente, interessa à criminalidade organizada e a seus asseclas menos gabaritados e mais expostos, porque os ‘cabeças’ continuarão sem ser identificados, a navegar em iates, desfrutando uma riqueza impossível de ser atingida pelo trabalho, rindo do fisco, do Congresso, da Polícia, da magistratura e de acolitados pelo Estado.


Ao cabo, será que os anos de ditadura não puseram e mantêm outras classes sociais ou funções acima do bem e do mal? A perseguição integrada deve estar atenta a todos os graus e ramos da atividade de um Estado moribundo, sejam eles civis, militares ou eclesiásticos. Nessa tragédia, há que indagar sobre a participação de sociedades e de igrejas -ao recordar a presença do Banco Ambrosiano, da maçonaria e da Opus Dei nas conjuras da máfia italiana dos anos 70/80.


O combate ao crime organizado no mundo sempre será trabalho para profissionais, e não obra de amadores, ainda que bem-intencionados.


CAETANO LAGRASTA NETO, 63, é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.’


 


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


Espanha vs. México


‘Foi destaque desde anteontem nas páginas iniciais do espanhol ‘El País’ e dos financeiros ‘Il Sole 24 Ore’, este italiano, ‘Financial Times’ e ‘Wall Street Journal’ -além de ‘New York Times’ e outros, desde ontem. A aquisição da Telecom Italia pela Telefônica e sócios foi descrita pelo jornal espanhol como uma ‘derrota de sua grande rival latino-americana, a mexicana América Móvil, controlada por Carlos Slim’, pois agora a empresa espanhola ‘reforça sua posição no Brasil, uma das grandes vantagens da operação’. ‘24 Ore’, ‘FT’ e ‘NYT’ também sublinharam a derrota de Slim e o impacto na América Latina.


E o ‘WSJ’ se concentrou na ‘sinergia’ a ser alcançada pela união ítalo-espanhola ‘especialmente no Brasil’, onde ‘a Telefônica encara dura concorrência da rival América Móvil num mercado-chave’.


AOS BRICS


A Dell, em disputa pela liderança em computadores no mundo com a HP, anunciou sábado -e virou submanchete no WSJ.com- que não vai se restringir mais às vendas diretas, no esforço para retomar o primeiro lugar. E que, ‘para se aproximar dos consumidores em mercados de maior crescimento, vai abrir uma fábrica no Brasil em maio e uma na Índia em julho’. Um memorando do presidente da Dell deu os Brics como a prioridade, agora.


AMANHÃ


Diz o ‘NYT’, citando ‘várias pessoas que conhecem os planos da empresa’, que o Joost, a ambiciosa ‘rede’ de TV on-line dos criadores do Skype, estréia amanhã para o mundo. Nas últimas semanas, os acessos à versão Beta, de teste, se espalharam pelo mundo -e pelo Brasil, com a distribuição de senhas por blogs de mídia como o Blue Bus. Entre os anunciantes da emissora globalizada, segundo o jornal, Sony, Microsoft, United Airlines e Unilever.


EM CAMPANHA


‘La Nación’ e ‘Clarín’, os principais jornais argentinos, descreveram o encontro de Lula e Néstor Kirchner como ‘uma conversa a sós de horas na residência de Olivos’, mais longa do que ‘jamais tiveram’, com ‘passeio pelo jardim’, ambos ‘de roupa leve, rodeados de informalidade e conversas sobre futebol e política’. O resultado foi que ‘afinaram sua sintonia’ e até iniciaram ‘a segunda fase do casamento’, segundo um título. ‘Foram afetuosos’ e, para o ‘Clarín’, ‘o abraço que trocaram revela que eles deixaram para trás as divergências’. Mas é claro que Kirchner está em campanha, ele que defendeu a reeleição do brasileiro no ano passado. E Lula posou até com a mulher de Kirchner, Cristina, possível candidata à sucessão do marido.


Ao menos a ilustração (acima) do ‘Clarín’ não se deixou levar pelo jogo de cena, não caiu na conversa eleitoral.


BARATO, FÁCIL


Após ‘Economist’ e Bloomberg, o ‘NYT’ saiu com louvores ao ‘crescimento das empresas aéreas de baixo custo no Brasil’ e outros. Citou GOL, que ‘comprou a Varig, que já foi a maior’, BRA e WebJet, ouviu agentes de viagens do Rio -e deu no título que está ‘mais barato e fácil viajar na América Latina’.


MILÍCIAS E OMISSÃO


Sites de jornais como ‘Washington Post’ reproduziam ontem, com foto, a reportagem especial da Associated Press sobre os ‘esquadrões de vigilantes’, as ‘milícias’ que invadem favelas cariocas desde 2003, segundo o texto.


A agência dá destaque para a ‘simpatia’ com que elas são tratadas pelo prefeito Cesar Maia e para as ‘críticas’ que recebem do governador Sergio Cabral. E em especial, desta vez, para o fato de que ‘o presidente Lula não falou contra as milícias’, ainda.


O MAIOR MODERNISTA


O ‘Observer’ contou ontem, longamente, a história da ‘única residência na América do Norte desenhada por Oscar Niemeyer’, em Santa Monica, na Califórnia. Foi quase meio século atrás, quando ‘o maior arquiteto modernista vivo’ foi proibido de entrar nos EUA da era macartista e um produtor de Hollywood encomendou o desenho, para desafiar o veto. A casa quase foi demolida há cinco anos e acabou salva pelos novos donos ao saber de Niemeyer, ele que nunca visitou a obra.’


RC vs. PLANETA
Folha de S. Paulo


Biógrafos reclamam de censura


‘O acordo firmado na última sexta-feira entre o cantor e compositor Roberto Carlos e a editora Planeta, que prevê a interrupção definitiva da produção e comercialização da biografia não-autorizada ‘Roberto Carlos em Detalhes’, do jornalista e historiador Paulo Cesar Araújo, foi considerado uma ameaça pelo escritor e biógrafo Jorge Caldeira, autor dos livros ‘Mauá’ e ‘José Bonifácio de Andrade e Silva’.


‘Daqui a pouco, qualquer personagem poderoso vai poder proibir que se escreva sobre ele. Conheço escritores que não aceitam fazer biografias porque não querem correr o risco de levar um processo. Um risco que, no Brasil, está cada vez maior’, afirmou Caldeira.


Para o escritor, o caso abre um precedente ‘para um tipo de censura muito complicado, porque é baseado numa opinião subjetiva’. ‘Não está em questão se o que se publicou é verdade ou mentira. Só o fato de que o biografado diga que está ofendido já basta para deslanchar um processo’, diz ele.


O escritor afirmou ainda ver o ‘perigo’ de isso se estender para a mídia. ‘Pode servir para que políticos que se sintam ofendidos por denúncias não sejam atingidos, por exemplo.’


Para o advogado e colunista da Folha Walter Ceneviva, o caso é delicado. Por um lado, ele considera que é preciso reconhecer o direito de Roberto Carlos ou qualquer outra pessoa se defender de eventuais ataques mal-intencionados à sua honra. Por outro, diz ‘a liberdade de manifestação é irrestrita e o que cabe é a cobrança de uma indenização a posteriori’. Ceneviva fala que o acordo firmado tem o valor de um contrato e encerra a questão, tendo sido fechado por iniciativa das partes.


Direito maior


Decisões e acordos judiciais como este furtam o público de conhecer personagens de sua história que poderiam contribuir para a ‘formação de uma identidade nacional’, opina Roberto Feith, editor da Objetiva. ‘Não há motivo para sacrificar um direito maior, o da sociedade, por causa de um direito menor, o privado’, acredita.


O jornalista, escritor e colunista da Folha Ruy Castro, biógrafo do escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues, do atleta Garrincha e da cantora Carmen Miranda, construiu apenas uma frase sobre o caso, que, segundo ele, resume todo o seu pensamento sobre a questão: ‘Vamos torcer para que, com a editora entregando 10 mil exemplares ao Roberto Carlos, ele pegue, pelo menos, um deles para ler’.


Autor de ‘Estrela Solitária’, sobre Garrincha, Castro conviveu por mais de dez anos com um processo movido pela família do jogador de futebol, que resultou no pagamento de uma indenização pela editora Companhia das Letras a duas filhas do jogador -cada uma recebeu R$ 30 mil.


‘Não tive de entregar os exemplares restantes, mas o ‘Estrela Solitária’, sobre a vida do Garrincha, ficou 11 meses proibido de circular e de ser reimpresso’, diz Castro.


De dezembro de 1995, quando foi lançado, a novembro de 1996, lembra Castro, o livro ficou ‘fora da lei’, ou seja, ‘proibido de circular, proibido de ser vendido, proibido de ser reimpresso’. A ação só se encerrou em 2006, com um acordo feito a pedido dos herdeiros de Garrincha.


‘Se o biografado não gostou da biografia, deveria processar o biógrafo, não o livro. As pessoas têm o direito de ler a biografia e saber se concordam com ela’, afirma Castro.


Feith, da Objetiva, avalia que só caberia processo em caso de ‘erro’ ou ‘inverdade’ publicada na biografia, como acontece em outros países como nos Estados Unidos.


Para o editor, imbróglios judiciais como o caso de Roberto Carlos reduzem o interesse tanto de autores como editores em lançarem biografias, o que é ‘uma perda’ para o público. Feith frisa que só fala em tese sobre o caso, pois não leu a biografia do cantor.’


***


Procura pelo livro cresce em livrarias de SP


‘O anúncio do acordo entre a editora Planeta e Roberto Carlos quanto ao fim da venda de sua biografia não-autorizada teve repercussão na procura da obra em algumas lojas ouvidas pela Folha.


Segundo a assessoria de imprensa da livraria Cultura, até as 17h do sábado haviam sido vendidos na unidade do Conjunto Nacional, na avenida Paulista, 15 exemplares do livro, o que indica elevação do interesse de compra. Desde janeiro de 2007, cerca de 450 exemplares foram comercializados pela rede em todo o país -incluem-se aí as vendas pela internet. As obras seriam comercializadas normalmente até segunda ordem.


Na Siciliano do shopping Ibirapuera, a situação era parecida. Um vendedor, que preferiu não se identificar, disse que a procura pelo livro foi grande no sábado. Segundo ele, a Siciliano continuaria a vender a biografia até acabar seu estoque, mas que não pediria mais exemplares a editora.


Cida Saldanha, atendente da unidade Vila Madalena da Livraria da Vila, informou que ninguém da editora Planeta havia ainda aparecido, até o fechamento desta edição, para recolher exemplares, talvez por conta do feriado. ‘Sempre que sai algo sobre esse caso nos jornais aumenta um pouco a procura, as pessoas acham que vai ser a sua última chance de comprar’, afirmou. A loja havia vendido só três exemplares até o fim da tarde do sábado.


Já a Fnac Pinheiros e a La Selva do aeroporto de Guarulhos registravam procura normal, segundo os funcionários ouvidos.’


TELEVISÃO
Daniel Castro


Audiência do futebol cai 14,3% em 2007


‘A audiência do futebol está em baixa na televisão, que cada vez paga mais caro para transmiti-lo. A média de todos os jogos da Libertadores, Copa do Brasil e Campeonato Paulista exibidos pela Globo e pela Band neste ano (até o último dia 22) dá 30 pontos, cinco a menos do no mesmo período de 2006, uma queda de 14,3%.


Os maus desempenhos de Corinthians e Palmeiras no Paulista e na Copa do Brasil, o fato de os dois clubes não estarem na Libertadores e o fim das transmissões na Record explicam o resultado. Nem a volta do mata-mata ao Paulista ajudou.


A Globo não se beneficiou no Ibope com o fim da parceria com a Record. Até 23 de abril de 2006, ela transmitiu 12 jogos do Paulista, com média de 26 pontos. A Record exibiu 13 jogos, com sete pontos. No mesmo período de 2007, a Globo mostrou 16 partidas do Paulista, que deram 24 pontos. A Band também exibiu 16 jogos, com cinco pontos. Na soma das emissoras, o ibope do Paulista foi 12% menor neste ano.


A Globo transmitiu dez jogos da Libertadores até 23 de abril de 2006. Na média, deram 31 pontos. Neste ano (sem contar a última quarta), foram só quatro, com média de 26.


Em compensação, a Globo voltou a transmitir a Copa do Brasil (que não exibiu em 2006 em SP). O torneio registra 24 pontos na Globo e cinco na Band. Em 2006, eram só quatro pontos na Record.


REVISÃO 1 O grupo Bandeirantes e a Gamecorp estão discutindo a parceria na qual a segunda ocupa parte da programação do canal 21 de São Paulo, agora chamado de Play TV. A Gamecorp tem como sócio um dos filhos do presidente Lula e a operadora de telefonia Telemar.


REVISÃO 2 A Gamecorp, apesar de estar faturando bem menos do que previa, quer ampliar o espaço que ocupa na programação da Play TV. Mas há um impasse financeiro a ser superado.


SEM BAIXARIA Sem alarde, a sem baixaria TV Cultura está cada vez mais próxima do quinto lugar no ranking das emissoras de TV. Neste mês, superou a popularesca Rede TV! na média diária do Ibope em cinco ocasiões.


CLONAGEM Já que não consegue contratar os galãs da Globo, a Record investe nos irmãos deles. Depois de Thiago Gagliasso (irmão de Bruno), que está em ‘Luz do Sol’, a emissora agora aposta em Jean Fercondini (irmão de Max, o Sérgio de ‘Páginas da Vida’). Ele será um dos meninos superpoderosos de ‘Caminhos do Coração’, que substituirá ‘Vidas Opostas’.


REVIRAVOLTA A Record decidiu manter no ar o ‘24 Horas’, cujo fim anunciara para a última sexta. O programa fica no ar até esta sexta, com apresentação de Janine Borba _que depois irá para o ‘Domingo Espetacular’. Na semana que vem, o telejornal passa a ser apresentado por Patrícia Maldonado e a ter o formato do ‘Tudo a Ver’. Mas continuará se chamando ‘24 Horas’.’


QUADRINHOS
Pedro Cirne


HQ homenageia Capote persistente


‘O escritor norte-americano Truman Capote (1924-1984) foi protagonista de um filme e de uma história em quadrinhos em 2005. ‘Capote’, longa de Benett Miller que rendeu a Philip Seymour Hoffman o Oscar de melhor ator, já foi exibido nos cinemas brasileiros e lançado em DVD. Agora é a vez da HQ ‘Capote no Kansas’, de Ande Parks e Chris Samnne, ser lançada no país.


Capote é o autor de ‘Bonequinha de Luxo’ (1958) e ‘A Sangue Frio’ (1966), e o foco da HQ está na criação deste último. Como diz o Capote retratado nos quadrinhos, ‘por que um homem sensível deixaria uma cama quente e um homem quente que o ama e levaria sua melhor amiga para esse buraco esquecido por Deus?’. Esse é o fio condutor da história: a motivação do escritor.


O ‘buraco’ citado por Capote é Garden City, no Kansas (EUA), onde uma família havia sido assassinada e para onde Capote vai para acompanhar a investigação do crime.


O trabalho não é fácil: ele está em uma cidade pequena abalada por um cruel assassinato.


As pessoas não querem comentar o assunto. Capote, para eles, não passa de um estranho que aparece de uma hora para outra fazendo perguntas.


‘Capote no Kansas’ não pretende ser uma adaptação de ‘A Sangue Frio’ ou uma biografia de seu escritor. Trata-se de uma homenagem.


Ele não é retratado como ‘herói’ ou ‘vilão’, mas como uma pessoa persistente e sensível que faz entrevistas detalhadas com os amigos das vítimas, os conhecidos e os dois assassinos condenados.


O roteirista, Ande Parks, escreveu outra HQ antes desta: ‘Union State’, inédita no Brasil. A maior parte de seu trabalho nos quadrinhos não é com as palavras, mas com o nanquim. Parks freqüentemente atua como arte-finalista do desenhista Phil Hester.


O trabalho da dupla com o personagem Asa Noturna está saindo mensalmente no Brasil na revista ‘Batman’, da editora Panini.


Em sua homenagem, Parks fugiu, intencionalmente, de um texto rigorosamente histórico.


Manteve a personalidade difícil e elegante de Capote, mas acrescentou um elemento de fantasia: conversas do escritor com o fantasma da menina assassinada, Nancy Clutter.


Com isso, não quis reinventar a história ou descobrir algo que ninguém havia percebido. Ele apenas narrou a história do seu jeito, assim como Capote, que também tinha sua maneira própria de escrever.


CAPOTE NO KANSAS


Autores: Ande Parks (roteiro) e Chris Samnne (arte)


Editora: Devir


Quanto: R$ 21,90 (128 págs.)’


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O Estado de S. Paulo


Segunda-feira, 30 de abril de 2007


MEMÓRIA / OCTAVIO FRIAS DE OLIVEIRA
José Maria Mayrink


Morre Octavio Frias de Oliveira, publisher do Grupo Folha


‘Morreu ontem à tarde, aos 94 anos, Octavio Frias de Oliveira, publisher do Grupo Folha. A morte ocorreu às 15h25 em decorrência de complicações que começaram em novembro, quando sofreu uma queda em casa e precisou ser submetido a uma cirurgia para a remoção de um hematoma craniano.


Nas últimas semanas, o quadro clínico do empresário piorou. Ele teve uma insuficiência renal grave e estava inconsciente havia alguns dias. Até as 20h30, ainda não havia sido definido onde o corpo seria velado nem detalhes do enterro de Frias.


ADOLESCÊNCIA DIFÍCIL


Carioca por acidente, o jornalista Octavio Frias de Oliveira nasceu no bairro de Copacabana, na casa dos avós, em 5 de agosto de 1912, quando sua família morava em Queluz, na divisa de São Paulo com o Estado do Rio. Nessa cidade, seu pai, Luiz Torres de Oliveira, era juiz. Descendente de nobres endinheirados, os barões de Itambi e de Itaboraí, ele atravessou infância e adolescência apertadas em São Paulo.


Ainda menino, Frias precisou arrumar emprego para ajudar nas despesas, quando estudava no Colégio São Luís, na Avenida Paulista. Usava sapatos furados e andava de bonde, enquanto os colegas ricos desfilavam de carro.


Começou aí a carreira do futuro empresário que faria do trabalho uma paixão. Foi office-boy, vendedor de aparelhos de rádio, funcionário público, incorporador imobiliário, corretor de títulos, banqueiro e criador de frangos, antes de comprar a Folha de S. Paulo, uma decisão que mudou sua vida, aos 50 anos de idade.


Pagou a fatura com cheque, numa sexta-feira, 13 de agosto de 1962, avisando que o dinheiro só estaria disponível três dias depois. Era um negócio de ocasião, porque não tinha a intenção de investir na imprensa. Frias conhecia bem a Folha, pois uma pequena corretora de sua propriedade, a Transaco, havia vendido assinaturas do jornal, mas não era do ramo.


‘Não tinha nenhum gosto pela atividade’, revelou ao jornalista Engel Paschoal, autor do livro A Trajetória de Octavio Frias de Oliveira, biografia lançada em agosto, com informações dele e depoimentos de amigos e colaboradores.


‘Eu passei minha vida lendo o Estado, até chegar à Folha, mas não era um grande leitor de jornal’, acrescentou o empresário na entrevista. Fez o negócio pensando só em ganhar dinheiro e porque era amigo dos donos do jornal, José Nabantino Ramos e Clóvis Queiroga, seu cunhado, conforme relata no livro.


Frias era funcionário público da Recebedoria de Rendas da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, quando estourou a Revolução Constitucionalista, em 1932. ‘Eu não acreditava naquela revolução, achava que nós íamos perder, mas a pressão era tão grande que resolvi me alistar também, para desespero de meu pai, que não queria que eu fosse de jeito nenhum.’


Ele achava que ‘aquilo era sacanagem dos paulistas da UDN’, mas foi lutar nas trincheiras. A UDN, à qual Frias se referia, era a sigla da União Democrática Nacional, partido de oposição que só seria fundado 13 anos depois, em 1945.


GOSTO PELO ESPORTE


Contemporâneo do escultor Brecheret, do pintor Di Cavalcanti e do poeta Guilherme de Almeida, que também lutou em 1932, Frias não queria saber de vida intelectual. Gostava de praticar esportes.


Jogava futebol e tênis, torcia pelo Paulistano e depois pelo São Paulo, treinava no Palmeiras e descia a serra pelo Caminho do Mar para nadar em Santos. Andou a cavalo até os 83 anos, esquiou até os 84, mergulhou até os 89, praticou ioga e dirigiu até os 92.


Em 1947, Frias casou-se com sua primeira mulher, Zuleika Lara de Oliveira, que morreria num acidente de automóvel – ela e um irmão de Frias, oito anos depois, quando ele bateu de frente num caminhão, na Via Dutra. Voltavam de São José dos Campos, onde o empresário montou a Granja Itambi para a produção de frangos. Nunca chegou a ser um bom negócio, mas era um passatempo que adorava. Segundo sua filha Maria Cristina, ele sempre dizia que gostava mais da granja do que da Folha.


Aos 36 anos, Frias pediu demissão no emprego público para se tornar sócio do Banco Nacional Imobiliário (depois Inter-Americano), com participação de 10% do capital.


‘Entrei com a cara e a coragem. Quem entrou com o dinheiro foram os acionistas que nós arrumamos. Eu não entendia nada de banco. Mas sempre fui um homem que sabia organizar as coisas’, essa foi a explicação que Frias deu para sua aventura de banqueiro. Quando o BNI quebrou, após financiar a campanha eleitoral de Orozimbo Roxo Loureiro, sócio majoritário, Frias sofreu o baque, embora estivesse licenciado.


RECOMEÇO


Com os bens bloqueados, foi obrigado a recomeçar do nada. Dedicou-se então à Transaco, a corretora que vendera, com sucesso, assinaturas da Folha. Estendeu seus negócios ao Rio, onde vendeu também assinaturas da Tribuna da Imprensa e distribuiu material de propaganda de Carlos Lacerda na campanha para o governo do então Estado da Guanabara. ‘Inundei o Rio com placas do Carlos Lacerda, com 30% de comissão’, lembrou Frias no depoimento a Paschoal. Ele sabia ganhar dinheiro e aplicava tudo a juros.


Nos negócios imobiliários, Frias se tornou sócio de Carlos Caldeira Filho, que havia lançado um condomínio, a preço de custo, em Santos, onde foi contratado pelo BNI. Foram sócios e amigos. Um dos empreendimentos de maior sucesso da dupla foi o Edifício Copan, que o arquiteto Oscar Niemeyer projetou para a comemoração do 4º Centenário de São Paulo, em 1954. Outro bom negócio foi a construção da Estação Rodoviária, no centro da cidade. Iniciativa de Caldeira, o terminal deu lucro desde o dia da inauguração, em 1961.


Em 1955, passou a morar com Dagmar de Arruda Camargo, quando ela se separou do marido. Oficializaram a união dez anos depois, quando Dagmar já era viúva. Ela trazia uma filha do primeiro casamento, Maria Helena, e teve mais três com Frias – Otavio, Maria Cristina e Luís. Havia também Beth, a filha que ele havia adotado com Zuleika, sua primeira mulher. Criada por uma tia, Beth, que estudou e se tornou bailarina, morreu em fevereiro de 1981.


Ao comprar a Folha, o empresário que não queria saber de jornal instalou-se no quinto andar do prédio da Alameda Barão de Limeira, onde ele e Caldeira ocupavam salas vizinhas. Confiou a redação ao jornalista José Reis e dedicou toda a atenção à situação econômica e financeira da empresa.


Em 1965, comprou também os jornais Última Hora e Notícias Populares, aos quais se somavam a Folha da Tarde na capital e a Cidade de Santos, no litoral. O vespertino Folha da Tarde foi uma dor de cabeça para o empresário durante o regime militar, quando passou das mãos de uma equipe de esquerda, em 1969, para um grupo de direita, nos anos seguintes.


Depoimentos de editores que trabalharam na empresa naquela época atestam a infiltração de policiais na redação e a utilização de caminhões de transporte da Folha em missões clandestinas do DOI-Codi, órgão de repressão da ditadura.


A situação mudou a partir de 1976, quando o jornal abriu suas páginas para o debate pluralista de idéias, iniciativa que todos creditam a Frias. Em 1983, o jornal apoiou a campanha Diretas Já, que levou multidões às ruas, no ano seguinte, numa mobilização nacional pela eleição direta do presidente da República. Esse engajamento político aumentou o prestígio e a credibilidade da Folha entre os leitores.


‘FARO DE JORNALISTA’


Embora sempre fizesse questão de dizer que era empresário, Frias ‘tinha alma e faro de jornalista’, observa o repórter Ricardo Kotscho, que trabalhou diretamente com ele. ‘Por isso, costumava chamar à sua sala, independentemente da função que exerciam, profissionais de diferentes áreas da redação’, escreveu Kotscho em seu livro Do Golpe ao Planalto. Entre esses jornalistas, destaca-se o nome de Cláudio Abramo, braço direito de Frias, que gostava de discutir com ele sobre socialismo e capitalismo.


Frias sabia ganhar dinheiro, mas não era homem de luxos nem de coisas supérfluas. Costumava usar roupas velhas, sem nenhuma vaidade. ‘Dinheiro só terá sentido enquanto estiver, de alguma forma, a serviço da sociedade’, ensinava aos filhos, aos quais transferiu cedo a condução dos negócios. Isso jogou sobre eles um ‘peso um pouco massacrante’, observou Otavio Frias Filho, diretor de redação desde 1984. ‘Pus os filhos para trabalhar já há algum tempo’, disse o empresário no fim da vida, satisfeito com essa decisão.


Ao receber o prêmio Personalidade da Comunicação 2006, em maio, Frias fez um balanço positivo de sua trajetória. ‘Tive algum êxito como empresário. Consegui dar minha modesta contribuição no grande trabalho coletivo de criar riquezas, gerar empregos, fortalecer empresas e lançar produtos. Atribuo esse êxito ao trabalho perseverante e a alguma sorte’, declarou em seu discurso.


Dizia que cometeu muitos pequenos erros, mas nenhum grande, porque sempre foi muito cauteloso. Não se arrependia de nada, ‘faria tudo igualzinho’, mas não compraria a Folha, ‘porque não teria dinheiro para pagar o que ela vale hoje’.


Ao se aposentar, continuou a se interessar pelo dia-a-dia do jornal. Acompanhava de perto os editoriais, discutia alguns assuntos específicos com os filhos e participava da orientação geral, mas sem função executiva.


Repercussão


Luiz Inácio Lula da Silva


Presidente


‘O Brasil perde um dos seus mais lúcidos e destacados homens de imprensa. O doutor Frias tinha uma personalidade marcante e cativante, que unia simplicidade, dinamismo, inteligência e confiança no Brasil’


Marco Aurélio Mello


Presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do Supremo Tribunal Federal


‘Foi um defensor da informação fidedigna e com isso contribuiu muito para o fortalecimento da democracia. Deixou um belíssimo trabalho realizado e, logicamente, continuaremos colhendo os frutos desse trabalho’


Ruy Mesquita


Acionista, membro do Conselho de Administração e diretor de Opinião do Grupo Estado


‘Foi o homem que modernizou a ‘Folha de S. Paulo’. Embora não fosse jornalista, transformou a ‘Folha’ no jornal de opinião que é hoje, sempre no bom combate contra as mazelas da democracia brasileira. Mesmo sendo concorrentes , tive o privilégio de ser sempre seu amigo pessoal, independentemente de eventuais divergências entre nossos dois jornais. Tenho o maior respeito pela sua atuação na imprensa brasileira’


Tarso Genro


Ministro da Justiça


‘Foi uma grande personalidade na história política e jornalística de nosso País. Acolheu nas páginas da ‘Folha’ toda a diversidade política e ideológica do Brasil’


Renan Calheiros


Presidente do Senado


‘Em nome do Senado, lamento a morte do doutor Octavio Frias que sempre foi um homem à frente de seu tempo, um pensador que soube participar da revolução da mídia brasileira. O Brasil sentirá muito sua falta’


Roberto Civita


Presidente do Conselho da Administração e da Editora Abril


‘Sentiremos muito sua falta. Octavio Frias era um patriota, um democrata, um homem de grande visão empresarial e um dos maiores inovadores da moderna imprensa brasileira’


Gilberto Kassab


Prefeito de São Paulo


‘Octavio Frias teve um papel fundamental no fortalecimento da comunicação no Brasil. Com sua atuação, ele ajudou a retomarmos a democracia no País. Foi um grande brasileiro’’


TV NA WEB
Eric Pfanner


TV pela internet atrai anunciantes de peso


‘The New York Times – O Joost, serviço de televisão pela internet que está sendo desenvolvido pelos fundadores do Skype, já arregimentou vários anunciantes de primeira linha, entre eles United Airlines, Microsoft, Sony Electronics e Unilever, enquanto se prepara para o seu lançamento.


Essas marcas estão entre os 30 anunciantes relacionados pela Joost como ‘parceiros do lançamento’. A idéia é transmitir programação gratuita apoiada financeiramente pelos anunciantes para telas de computador usando a internet. Segundo várias pessoas a par dos planos da empresa, o Joost começará as transmissões na terça-feira.


O Joost tem atraído uma considerável atenção desde que Janus Friis e Niklas Zennstrom revelaram, no ano passado, que estavam trabalhando num projeto de vídeo pela internet. Embora o Joost tenha anunciado contratos de fornecimento de programação com a Viacom, National Geographic e outros provedores de conteúdo, ofereceu poucos detalhes sobre sua publicidade.


A lista de grandes marcas parceiras pode ajudar muito nas respostas às perguntas sobre a viabilidade comercial do Joost. Entre os primeiros anunciantes estão a Nestlé Purina, Hewlett-Packard, Intel, Motorola, as unidades Opel e Vauxhall, da General Motors, Taco Bell, Lions Gate Entertainment e o Exército dos Estados Unidos, segundo as agências de publicidade que estão trabalhando com o Joost.


VALORES


O gerente-geral de vendas e operações para a América do Norte do Joost, Nick Loria recusou-se a revelar a quantia que os anunciantes estão pagando. Pessoas familiarizadas com as negociações da empresa disseram que o custo por três meses foi de US$ 50 mil para anúncios que aparecerão somente nos EUA e US$ 100 mil para anúncios exibidos globalmente.


Enquanto algumas propagandas no Joost lembrarão os tradicionais spots de televisão de 30 segundos, outros tirarão proveito dos aspectos interativos da internet.’


INTERNET
Pedro Dória


A internet das coisas


‘Muitos dos prezados leitores hão de lembrar dos primeiros players de DVD. Eram máquinas grandes e todas custavam mais do que R$ 500. Foi num estalo de dedos que tudo mudou: achataram-se todas até uma finura só e o preço caiu pela metade. É o velho processo da tecnologia que todos conhecem intuitivamente. Bem, está acontecendo de novo. Com o WiFi, a conexão de rede sem fio.


O que acontece é aquilo que a turma do ramo chama de chipar. Um circuito que toque um DVD, por exemplo, ocupa um certo espaço e dá trabalho para fazer. Mas quando são muitas as fábricas com muitos usos para um circuito genérico que faça isso, alguns fabricantes põem no mercado chips. Circuitos integrados, impressos, que exercem a mesma função da versão grande do circuito. A diferença é que são muito menores e são feitos de milhar em milhar.


Quando o DVD foi chipado, ficou repentinamente fino e mais barato. Produção em escala. A unidade do chip custa uma besteira de nada. Quanto mais faz, mais barato.


A antena de rádio e a ‘mente’, o chip, que viabiliza a conexão por WiFi estão se popularizando. Conforme ganham escala, as pessoas começam a ter idéias a respeito de como utilizar o bicho. Para conectar notebooks e Palms à internet e à impressora, por certo. Mas para que mais? Um pesadelo das companhias telefônicas: ligar seu celular à rede para usá-lo numa conversa via internet.


Só que em um mundo em que ligar qualquer coisa a uma rede sem o uso de fios é trivialmente barato, que outros usos podem ser imaginados? As luzes de um prédio de escritórios, por exemplo. Cada ponto de luz, um nó da rede. Dá para ligar e desligar remotamente, via internet.


Neste mundo ideal onde a conexão à rede está no ar, objetos, equipamentos mais caros, podem ter rastreadores que indiquem sua posição.


Detectores de fumaça: no prédio grande, informam ao bombeiro precisamente em que ponto há mais fumaça do que devia.


E, naturalmente, esse é um mundo no qual é possível dar uma ordem via celular para que a cafeteira comece a fazer café dez minutos antes de você chegar. Aliás, cogite a possibilidade de o GPS do seu carro avisar por conta própria ao ar-condicionado que resfrie a casa a 26 graus quando você estiver para chegar. Nem um minuto antes, que cause gasto desnecessário de energia, nem um minuto depois.


É verdade, assim já parece o caminho da ficção científica. Afinal de contas, Bill Gates já falava de uma realidade dessas há mais de dez anos, quando lançou seu A Estrada do Futuro. Nicholas Negroponte, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, pai do notebook popular, ficou anos sem ser citado porque fazia promessas parecidas com essas. Todo mundo acreditou, esperou, aí nada veio.


Mas é mesmo uma nova fase da internet que está se iniciando. É o momento em que a rede não liga apenas computadores. Liga também coisas: a cafeteira, a lâmpada, o aparelho de ar-condicionado.


Talvez não aconteça ano que vem, mas não parecerá ficção daqui a dez anos.


E isso é um problema. Não bastasse a internet estar sofrendo a pressão do vídeo, que lhe carrega as entranhas com uma demanda para a qual não foi planejada, ela precisará se inflar ainda mais. Será uma rede que interligará um trilhão de nós diferentes em 15 anos. E esses nós, em sua maioria, não serão aquilo que entendemos hoje por computadores.


Esta internet que liga coisas já está sendo planejada, evidentemente. E nela, cada vez mais, segurança será um fator importante. Porque hackers não deixarão de existir, tampouco vírus. E, agora, eles não terão possibilidade de acesso apenas a suas planilhas ou às fotos da família ou daquela namorada.


Ora, vá: há riscos, mas será um mundo para lá de interessante.’


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Blog do Mino


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MEMÓRIA / OCTÁVIO FRIAS DE OLIVEIRA
Mino Carta


Octavio Frias de Oliveira


‘Conheci Octavio Frias de Oliveira em fevereiro de 1976. Acabava de sair da Veja e fui visitar Claudio Abramo, o amigo fraterno, no seu gabinete na Folha de S.Paulo. Ele me propôs mudar para lá para assumir o posto de redator-chefe, fiquei muito tocado, mas respondi que meu propósito naquele momento era aproveitar uma pausa para pensar na vida. Claudio ligou para ‘o Frias’, queria que eu o conhecesse. O Frias logo chegou, cordial, expressivo até, com aquele sorriso de ponta de lábios e olhos brilhantes atrás das lentes. Falamos da velha amizade que me ligava ao Claudio, ele sublinhou: ‘Sou expert em Claudio Abramo’. Pretendia dizer do seu perfeito conhecimento dos humores instáveis do amigo diretor de redação, e da melhor maneira de lidar com eles. Acabei por topar uma colaboração com a Folha, escrevia artigos na segunda página e, às vezes, ia até a redação no fim da noite e lá ficava horas a fio, para ajudar o Claudio no fechamento. Frias surgia em cena com freqüência, um dia me pediu para escrever um editorial depois de explicar o que desejava transmitir aos leitores. Sabia das minhas idéias, não batiam com as dele, mas jamais tentou doutrinar-me. Depois do fracasso do Jornal da República, quando finalmente saí da Istoé, por obra e graça (especialmente graça) do desentendimento com Fernando Moreira Salles, que se tornara dono da revista ao pagar a dívida do jornal, Frias me chamou para uma conversa à beira de uma garrafa de uísque. Não tomei, serviu-me vinho branco. Comentou: ‘Você não é mais um menino, seu tempo de criar revistas acabou, venha trabalhar com a gente’. Acertamos uma colaboração fixa, teria de escrever cinco artigos semanais, sobre os mais variados assuntos, aqueles que pudessem chamar a minha atenção. Escrevi sobre política, cinema, comportamento. Sempre com total independência. Quando surgiu a oportunidade de criar outra revista, a Senhor semanal, em requintado papel-bíblia, fui despedir-me, ele sorriu na ponta dos lábios e admitiu: ‘Você vê, eu estava errado’. Minha relação com ele foi sempre excelente, ao me encontrar me abraçava. Não faz muito tempo, em 2005, um jornalista da Folha escreveu a meu respeito um texto virulento em que me comparava com Odorico Paraguassu, a caricata e famigerada personagem de programas da Globo de outrora. Como escrevi em abril de 2006: ‘Octavio Frias de Oliveira, publisher da Folha, ofereceu o mesmo espaço, na mesma página, à minha defesa, que saiu pontualmente’. Por isso, acrescentava: ‘agrada-me saber que cabe a ele, conferido na noite de 3 de abril, o Prêmio de Personalidade de Comunicação de 2006’. Não é fácil, no Brasil, escrever sobre falecidos ilustres sem louvar qualidades e esquecer defeitos. Mas é assim que considero ‘o Frias’, uma autêntica personalidade de comunicação. E entre os seus pares foi, no meu entendimento, um dos mais corteses no trato e democráticos na lida com os profissionais. O problema central do jornalismo brasileiro está na concepção mais ou menos medieval do poder e na falta de leis que, de uma forma ou de outra, o limitem. Não cabia a ele, porém, resolvê-lo por conta própria. Erros certamente os cometeu, bem além daquele de prever que minha carreira de diretor de revistas estava encerrada aos 46 anos. Enxergo três, muito claros. Primeiro, a parceria com Carlos Caldeira Filho. Talvez fosse sócio recomendável em outro ramo de negócios, não se diga o mesmo em relação ao jornalismo. A ligação de Caldeira com os ditos falcões da ditadura é notória e lança uma sombra sobre a orientação da empresa e dos seus veículos no decorrer da época mais aguda da repressão, da tortura e da censura. A Folha, aliás, nunca foi censurada e só veio a ser submetida a pressões quando, em 1977, o colunista Lourenço Diaféria escreveu um texto considerado injurioso pelos militares, ao dizer que a espada do monumento eqüestre do Duque de Caxias estava oxidada. Era metáfora, e os generais, por incrível que pareça, perceberam. Em compensação, a Folha da Tarde por longuíssimo tempo foi uma espécie de boletim do DOPS e Cia. O segundo erro foi aceitar as pressões do general Hugo Abreu e tomar o partido do general Silvio Frota no atormentado enredo da sucessão presidencial do ditador de plantão Ernesto Geisel. O terceiro foi também conseqüência destas pressões, a demissão de Claudio Abramo, a 17 de setembro de 1977, 25 dias antes da queda de Frota do ministério do Exército.’


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