Há quem diga que ele não deve ser levado a sério: é aquele político que, quando ministro, resolveu obrigar velhinhos de mais de 80 anos a ficar nas filas do INSS apenas porque achou que deveria recadastrá-los. Acabou sendo chutado do Ministério – e chutado por um amigo e aliado, o presidente Lula.
Acontece que este político, Ricardo Berzoini, precisa ser levado a sério, especialmente quando defende o mal. É presidente nacional do PT, um dos maiores partidos do país, e tem apoio entre alguns correligionários, manifestado pelo líder do PT na Câmara Federal, deputado Luiz Sérgio.
Qual a proposta atual de Berzoini? ‘Mecanismos para discutir o poder dos meios de comunicação no processo eleitoral’. Ou, em português mais claro, censura à imprensa – embora temporária. Mas, considerando-se que no Brasil há eleições de dois em dois anos, o temporário quase se confunde com o definitivo.
Diz o deputado Berzoini que, na eleição de 2006, ‘vários meios de comunicação abriram mão do bom jornalismo’ e ‘fizeram campanha declarada para a oposição’. É verdade; mas também é verdade que vários meios de comunicação fizeram campanha declarada para a situação. Uns pelos outros, a situação ganhou.
Berzoini se diz um homem de esquerda. Deveria, portanto, conhecer Rosa Luxemburgo, famosa revolucionária alemã, para quem ‘liberdade é a liberdade dos outros’. Se liquidar a liberdade de seus adversários, Berzoini talvez consiga recadastrar velhinhos sem qualquer oposição. Mas, mais cedo ou mais tarde, ficará sem a sua liberdade também.
A outra serpente
A propósito, há coisas acontecendo que demonstram hostilidade à imprensa. Há dias, em Belém, a Polícia Federal deteve por seis horas uma equipe da Rede Record, por ‘desacato à autoridade’ (ou melhor, ‘desacato à otoridade’). O policial, além de prender os três integrantes da equipe – dois deles jornalistas – quebrou a câmera e se recusou a mostrar a identificação, que só foi conhecida na delegacia. Atitude isolada de um policial arbitrário? Não: o delegado de plantão os manteve incomunicáveis e enviou outros policiais ao local, para evitar que outras equipes o filmassem. Alguém foi punido? Até este momento, não.
A marca indelével
As operações Hurricane e Têmis provocam de novo um tema que, a cada dia, é mais urgente discutir: até que ponto é legítimo, para os jornalistas, divulgar informações que marcarão de forma permanente seus protagonistas, sem ter a certeza de que efetivamente estão envolvidos em algum tipo de irregularidade?
O fato é que, terminada a agitação inicial, iniciado o mergulho na documentação que levou às investigações e prisões, aparece o nome de muita gente que talvez não tenha nada com os fatos; que tenha sido citada por lobistas, à revelia, como fórmula de proclamar uma influência que de fato não teriam.
É coisa simples: o lobista, buscando ampliar sua base de clientes, diz que vai ligar para um ministro, amigo de infância, a quem chama pelo apelido; ou para um juiz, um grande advogado, um empresário poderoso. Talvez até o conheça, talvez até seja seu amigo – o que não significa poder aliciá-lo para uma operação criminosa. No entanto, o nome foi citado, o telefonema foi gravado, e o nome da pessoa é publicado pela imprensa. Como livrar-se da mancha na biografia?
Cabe-nos, aos jornalistas, debater este tema: como publicar as informações relevantes e importantes sem espirrar lama em quem não a merece, e isso no calor da hora, exigindo decisões instantâneas? Não é simples. Este colunista não acredita que haja uma solução fácil. Mas alguma coisa precisa ser feita, e logo.
Os processos – Franklin Martins
A discussão é interessante: no processo do agora ministro Franklin Martins contra o colunista Diogo Mainardi, a sentença foi publicada no dia 17 de abril. No dia 16, na Folha Online, Kennedy Alencar publicou uma bela súmula da sentença, dando inclusive, com exatidão, a indenização que Mainardi teria de pagar.
Há uma tentativa de crucificar Kennedy Alencar pela história. Nada mais errado: ele obteve a informação, teve confiança em sua fonte e publicou a história, o que é exatamente o que deve ser feito. Se há alguma dúvida, não é com ele: é com quem obteve a sentença antes mesmo de assinada.
Os processos – Arnaldo Jabor
O deputado Arlindo Chinaglia, do PT paulista, presidente da Câmara dos Deputados, se sentiu ofendido com os comentários do colunista Arnaldo Jabor sobre os gastos de parlamentares com a verba indenizatória. Quer processar Jabor. Tudo OK: está na lei. Mas vamos combinar uma coisa: por mais ofensivo que o comentário do colunista da Globo tenha sido, mais ofensivo ainda foi o fato que lhe deu o mote. Não dá para engolir gastos de 11,2 milhões de reais em gasolina em dois meses. São quase 5 milhões de litros. Também deve estar em alguma lei que não se pode debochar em prestação de contas.
Pan, pan
Os Jogos Pan-americanos do Rio já multiplicaram o orçamento por quatro ou cinco vezes. E a imprensa esqueceu o Pan de São Paulo, realizado em 1963 e coordenado, se o colunista não se engana, pelo empresário de comunicações Paulo Machado de Carvalho (que também comandou a Seleção brasileira de futebol no bicampeonato mundial de 1958 e 1962). Saiu baratinho, baratinho. E funcionou direito.
As vantagens e vantagens
Dois jornalistas de excelente memória escrevem para corrigir este colunista. Henrique Veltman diz que a abolição das ilusórias vantagens atribuídas aos jornalistas (meia passagem de avião, isenção de Imposto de Renda, isenção da Sisa – o imposto de transmissão na compra da casa própria –, entrada de graça nos cinemas) se deve ao governo Jânio Quadros, não ao do marechal Castello Branco. Regina Helena de Paiva Ramos, ótima jornalista, famosa como crítica de teatro, vai mais longe: a abolição dessas ‘vantagens’ decorreu de um movimento liderado pelo Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, à época presidido por Ewaldo Dantas Ferreira, um dos melhores repórteres que já houve no país. Regina Helena conta como o sindicato se colocou contra esse tipo de mordomia inútil:
‘Do nosso lado estavam o Hermínio Sacchetta e o Aristides Lobo, brigando como feras contra os 50% no preço das passagens – quem ganhava os 50% eram os jornais, já que jornalista só viajava a serviço – contra isenção de imposto na compra da casa própria (existia isso!), contra entrada de graça nos cinemas, contra a isenção de imposto de renda. E também contra os jabaculês pagos pela Câmara Municipal, pela Assembléia Legislativa e até pela CMTC (a estatal que cuidava dos ônibus em São Paulo). Tinha um monte de jornalistas na folha de pagamento da CMTC. Teve jornalista – não vou falar os nomes, até porque esqueci a metade deles (idade é fogo!) – que até chorou se desculpando por estar na lista da CMTC. E outros xingavam a gente por estarmos querendo acabar com as mordomias. Foi divertido.
‘De qualquer forma, as regras do jogo mudaram no Brasil por iniciativa do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo’.
Homenagem
Ewaldo Dantas Ferreira, Regina Helena de Paiva Ramos, Henrique Veltman, Hermínio Sacchetta, Aristides Lobo – só de poder citar estes nomes o colunista se sente homenageado.
Novo homem
Está num grande jornal, numa reportagem detalhada sobre as leis de diversos países a respeito da interrupção da gravidez: em determinado país, é lícito o aborto praticado até o 12º mês da gestação.
Este colunista é do tempo em que ninguém ficava grávida por 12 meses seguidos. E a interrupção da gestação, no nono mês, chamava-se ‘parto’.
Noça eztrela
A moça mal saiu do Big Brother, acaba de entrar na lista dos famosos, e veja só a frase que lhe atribuem num grande jornal – com a grafia, naturalmente, escolhida pelo repórter:
‘A ex-BBB Íris Stefanelli, 27 anos, estaria indignada com suposto convite para estrelar um filme pornô. ‘Paço fome, mas não faço isso’.’
E eu com isso?
Um feriado comprido, excelente, mas não podemos ficar por fora das informações que nos são prestadas, online, instantaneamente, recém-saídas do forno, por nossos veículos de comunicação – especialmente o mais rápido, a internet. Não poderíamos aproveitar intensamente o feriado sem saber que:
1.
‘Britney Spears vai à aula de dança com a barriga definida de fora’2.
‘Pamela Anderson admite que precisa fazer exercícios’3.
‘Adriane Galisteu se exercita com amigo no Leblon’E nem pense em coisa boa, não: o título não tem qualquer malícia. Adriane e o amigo apenas corriam juntos, no meio da rua.
4.
‘Paris Hilton cai na farra com ex-marido de Britney’O grande título
O melhor título da semana é ultragrosso – tanto que esta coluna não vai reproduzi-lo. Mas resume, em três palavras, uma vírgula e um ponto de exclamação, a opinião do jornal Hora H, de Nova Iguaçu, RJ, sobre uma senhora surpreendida ao levar para uma prisão dois celulares, duas baterias, dois anéis, carregador, fone de ouvido e chip – tudo muito bem escondido, digamos, internamente.
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados