Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O pior exemplo de jornalismo de curral

É do conhecimento de boa parte dos leitores e leitoras de periódicos que o jornalismo brasileiro beira o ridículo por cometer erros tão crassos que nos fazem duvidar da existência de manuais de redação que zelam pela ética e pela imparcialidade no meio. Porém, como estão ‘à vista’ do grande público, os maiores jornais do país procuram manter um nível de decência, não ‘tomando partido’ diretamente por um determinado candidato ou partido político e tentando demonstrar sua pseudo-imparcialidade em editoriais rebuscados, confusos – e por vezes contraditórios – ou em matérias nas quais a manchete conclama denúncia e o texto ameniza, mostrando que ‘não é bem por aí, como diz no título’. Ridículo.

Embora nada aconteça, esses periódicos sofrem críticas diretas via leitores, via ombudsman, ou mesmo via artigos neste Observatório, o que faz com que cubram um pouco da sujeira que carregam consigo. Neles incluo Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo, O Globo e afins, jornais que deveriam manter e ditar padrões de comportamento a seus congêneres e que acabam ajudando a avacalhar o cenário jornalístico nacional.

Engana-se, porém, quem pensa que este é o maior mal do jornalismo impresso no Brasil; jornalismo que não se reflete, não se aprimora e tampouco questiona a sociedade em que se situa. Longe dos olhos dos grandes centros e muito próximo de 90% dos leitores, os jornais e periódicos regionais constituem o pior exemplo do jornalismo de curral praticado na nação sob a máscara medíocre da ‘liberdade de imprensa’.

Forças ‘superiores’

Sustentados em grande parte por anúncios ou editais da administração local, esses veículos transformam o jornalismo em um espetáculo propagandístico digno dos mais altos prêmios em Cannes. Apoiados em textos que omitem informação, ou ainda carregados de adjetivos, esses ‘panfletos’ são os ‘formadores de opinião’ da grande massa da população nacional.

Esses folders (folder é melhor expressão para qualificar os jornais regionais) detêm grande parte de sua credibilidade por estarem situados em suas cidades há muito tempo ou por serem os pioneiros em seus mercados. Trazendo notícias locais, satisfazem o desejo da população de se ‘ver’ na mídia. A imensa maioria de pessoas que é atingida por estes jornais acaba, assim, ‘confiando’ no que é dito por não possuir meios de averiguar a verdade nos fatos – o que também ocorre nos grandes veículos, embora em escala menor, pois as notícias destes são pautas de outras mídias. Assim, os veículos regionais, que quase sempre são a única fonte de informação em suas cidades, acabam ganhando um grande público que comercializa descaradamente e sem o mínimo de escrúpulo.

Além de abusar da mentira e da omissão, há jornais regionais cujos diretores de redação são assessores de imprensa da prefeitura ou da Câmara dos Vereadores; jornais cujos donos são ex-prefeitos ou candidatos a cargos eletivos, tanto no Legislativo como no Executivo; há aqueles que pertencem a grandes redes de comunicação com braços em diferentes estados e controlados por forças ‘superiores’. Fora dos grandes centros, há jornais que têm ainda o despudor de negociar com a situação e com a oposição, favorecendo claramente quem lhe traga maiores benefícios futuros. Vergonhoso.

Vermes políticos

Isto só acontece porque o meio jornalístico ainda se encontra nos primórdios da civilização, exigindo imunidade quando deveria lutar pela crítica. Não há, na legislação brasileira, nada que possa reprimir um jornal por publicar matéria mentirosa sobre determinada pessoa ou instituição. Nem mesmo o direito à resposta, assegurado por lei, que não tem obrigação de ter a mesma importância em espaço, tamanho e público (afinal, é bem diferente chamar alguém de burro no domingo e depois ‘desmentir’ na segunda-feira). O máximo que se pode fazer é processar o jornal, mas ainda procuro alguém que tenha sido difamando pela imprensa e tenha novamente conquistado o carisma e respeito que tinha anteriormente.

Debater é o primeiro princípio da democracia – do qual os jornais fogem sob a hipocrisia da ‘liberdade’ – e por isso é mais do que urgente que os grandes veículos de imprensa e mesmo este Observatório comecem a discutir meios de regular o jornalismo e puni-lo por seus erros e faltas. Isto não significa censura, nem mesmo limitação, mas cobrança por mais qualidade e transparência, que são os atributos mais criticados junto à imprensa, cujo dever social é informar, vasculhar e denunciar as mazelas do poder e dos acontecimentos visando ao esclarecimento da população – e não o de ser palco para comícios.

Enquanto os porcos continuarem comendo satisfatoriamente em seus currais sem serem açoitados ou condenados à feijoada, os vermes políticos continuarão apoiados em todo o estrume que esta imprensa produz e veicula.

Pensei ‘amenizar’ as palavras deste artigo, mas escutei um dono e editor-chefe de um destes jornais dizer as seguintes palavras: ‘Somos um jornal com linha editorial, ético e preocupado com a informação, mas também somos uma empresa e, sendo assim, se o cara pagar, vai sair.’ Quem paga, sai no jornal.

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Coordenador de Comunicação, Jundiaí, SP