Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A lengalenga apocalíptica
do fim da imprensa escrita

A melhor homenagem que se pode prestar a Octavio Frias de Oliveira, neste momento, é começar a discutir o futuro do jornalismo impresso em nosso país.


A contribuição de Frias foi decisiva em 1975, quando a imprensa estava paralisada pela censura e pela autocensura. Ao encampar a tese de Cláudio Abramo de que a distensão política só ocorreria quando os interlocutores perdessem o medo e começassem a falar, deu um passo decisivo em direção da valorização da opinião, do conteúdo e da substância jornalísticas.


Trinta e dois anos depois evidencia-se novamente a necessidade de pegar carona na conjuntura com uma visão mais afirmativa: chegou a hora de discutir o jornalismo impresso sem se importar com o que vai ocorrer nos próximos 32 anos.


Essa lengalenga apocalíptica do fim da imprensa e sua transferência imediata para a virtualidade da internet revela um desconhecimento dos desdobramentos e acomodações do processo histórico. Convém àqueles que não estão interessados em desenvolver os fundamentos originais do jornalismo – mantidos com muita vitalidade e criatividade nas mais importantes publicações do mundo. O jornalismo impresso não foi afetado pelas diferenças idiomáticas e culturais, seus traços essenciais podem ser identificados nos quatro cantos do mundo, testados diariamente nas mais dramáticas circunstâncias.


Os defensores do corte abrupto são na verdade defensores do fim da história, agentes da política de terra arrasada e do voluntarismo tipo ‘depois de mim, o dilúvio’.


Matriz de inovação


O jornalismo impresso não acabou, está aí, vivo, estruturado e com uma capacidade inesgotável de produzir inovações. Suas desvantagens – quando comparado com a internet (ou à TV pela internet) – são ao mesmo tempo excelentes oportunidades para o exercício do ‘jornalismo transcendental’ mencionado por Bernard-Henry Levy.


A internet, por enquanto, é um sistema de comunicação, formidável arsenal de recursos tecnológicos de busca, transmissão e armazenagem de dados. Não conseguiu produzir um modelo narrativo diferenciado. É uma forma de participação à procura de uma gramática.


Significa que o jornalismo ponto com ainda não existe. Por enquanto, é uma réplica virtual e, de certa forma, improvisada do jornalismo standard, cujos paradigmas vêm sendo consolidados ao longo de 400 anos de trepidações e mudanças.


Algumas gerações de profissionais ainda precisarão percorrer os velhos caminhos do jornalismo tradicional, organizado e orgânico. Algumas gerações de leitores ainda necessitarão do periodismo, aquele breve intervalo entre edições capaz de permitir a sedimentação dos fatos e a compreensão exata dos acontecimentos.


O jornalismo impresso é uma matriz de inovações, ponte entre fases históricas. Ignorar suas enormes possibilidades é um salto no escuro. E um enorme desperdício.