Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O que esperar do 1º Fórum Nacional

Realiza-se esta semana, de 8 a 11 de maio, em Brasília, o 1º Fórum Nacional de TVs Públicas. Oito meses se passaram desde que o ministro da Cultura falou sobre o assunto pela primeira vez. De lá até hoje, muita água rolou por debaixo da ponte: o presidente Lula foi reeleito, o ministro da Cultura continuou no cargo, há um novo ministro da Secretaria de Comunicação Social e o ministro das Comunicações, que também continuou no cargo, entrou na questão atropelando o trabalho que vinha sendo feito e anunciando uma TV do Executivo. O mais importante, todavia, foi a manifestação pública do próprio presidente da República, que explicitou o seu desejo e empenho em implantar no país, no curto prazo, uma rede pública de televisão.

São muitos os interesses em jogo, obviamente. Há disputas dentro do governo pela condução política do processo; há disputas entre as associações do campo público para definir o modelo de rede; e, claro, há o interesse dos radiodifusores privados em limitar o alcance do projeto de forma a garantir os espaços já conquistados na televisão brasileira.

Dentro desse contexto, o que se pode esperar do 1º Fórum Nacional de TVs Públicas?

A tarefa principal do Fórum será, naturalmente, oferecer ao ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social – encarregado pelo presidente da República de conduzir o processo – diretrizes para implantação da rede de TV Pública, conciliando não só os interesses da Radiobrás e da TVE Brasil, mas também das TVs educativas, universitárias , legislativas e comunitárias já existentes e em funcionamento. E essa já não será uma tarefa fácil. Algumas das atuais estruturas estatais carregam vícios administrativos de décadas e não será fácil transformá-las em contemporâneas do nosso tempo.

Mas há um conjunto de outras expectativas criadas em torno da realização do Fórum que não creio seja possível evitar. Menciono algumas, não necessariamente as consensuais ou as mais importantes.

Principais diferenciais

Em primeiro lugar, espera-se que o Fórum se transforme e se multiplique como instrumento de mobilização da sociedade civil. O debate não deve ficar reduzido apenas a setores do governo, às TVs e às entidades do campo público. Há de se promover uma ampla discussão na sociedade.

Em segundo lugar, essa ampla discussão não pode se limitar apenas à TV pública. É necessário que se discuta a comunicação pública como um todo: a televisão pública, o rádio público e, inclusive, a mídia impressa pública.

A âncora legal na qual se sustenta a discussão de um sistema público de rádio e televisão é o artigo 223 da Constituição, que fala da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal de radiodifusão.

No entanto, por mais espinhoso e controverso que seja o tema, será que não estaria na hora de se discutir seriamente se é bom para o fortalecimento da democracia brasileira, da pluralidade e da diversidade de opiniões, a criação de uma mídia alternativa pública à mídia impressa privada? Será que a co-existência de uma mídia pública ao lado de uma mídia privada não atenderia melhor ao interesse público? Fazer esse debate é um grande desafio.

O Fórum, na verdade, deve ser o primeiro passo para a realização de uma ampla Conferência Nacional de Comunicação, a exemplo do que já aconteceu em outros setores de políticas públicas como a saúde e a educação.

E em terceiro lugar, considerando que a participação e o controle popular é um dos principais diferenciais que distinguem os sistemas públicos de comunicação dos sistemas comerciais privados, será indispensável que o Fórum avance na discussão das formas de garantir a participação popular na comunicação pública.

Avanço importante

Há de se definir formas de participação popular desde a gestão administrativa até a definição do conteúdo. Essa discussão passará inclusive pela necessidade de se criarem centrais públicas para produção de conteúdo e o incentivo a essa produção através de fundos de fomento com recursos estatais e privados. E passará também pela criação e implantação dos conselhos locais e regionais de comunicação, a exemplo de algumas tentativas que já feitas em uns poucos municípios brasileiros.

Há uma enorme gama de temas que precisam ser debatidos, equacionados e encaminhados na perspectiva de criação de um sistema público de comunicação. A realização do I Fórum Nacional de TVs Públicas marca um importante avanço nessa direção. Mas, certamente, esse é apenas o começo de uma longa e difícil jornada.

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Pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (NEMP) da Universidade de Brasília e autor, entre outros, de Mídia: crise política e poder no Brasil (Editora Fundação Perseu Abramo, 2006)