Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Críticas à programação são precipitadas, diz Belluzo

Menos de um mês após sua estréia, a TV Brasil já começa a receber suas primeiras críticas, evidenciando como será difícil o desafio de consolidar a nova emissora pública e afastar definitivamente os receios que a cercam. Com orçamento limitado e programação ainda baseada quase exclusivamente na grade herdada da extinta TVE, a direção da TV Brasil se esforça para produzir a única novidade até o momento, o telejornal Repórter Brasil, com uma estrutura estabelecida apenas nas cidades de Brasília e Rio de Janeiro. Dirigentes e membros do Conselho Curador da emissora, no entanto, acham precipitada qualquer avaliação e acreditam que a TV está no caminho certo.


Em artigo recente publicado no site Comunique-se, o jornalista e professor da UERJ Antônio Brasil afirma, sem meias palavras, que ‘após um mês no ar, já é possível dizer que a TV Brasil é muito, muito ruim!’, que o público ‘ignora solenemente a sua dispendiosa existência’ e compara o seu jornalismo à antiquada – verdade seja dita – linguagem da Voz do Brasil. Críticas semelhantes ainda são escassas, mas já deixam em alerta os responsáveis pela nova TV pública. Na EBC – Empresa Brasil de Comunicação, mantenedora da TV Brasil, a execução do projeto é avaliada como dentro do planejado, mas a espera pela aprovação da Medida Provisória 398/07 – que estabelece os marcos da empresa e aprova seu orçamento – preocupa, pois a emissora conta apenas com a verba governamental.


‘A TV Brasil está começando devagar e esperamos que sua qualificação técnica ocorra progressivamente. Nesse sentido, acho que está indo razoavelmente bem. Qual TV comercial tem uma fiscalização tão cuidadosa?’, afirma o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, presidente do Conselho Curador da EBC. ‘Concordo que ainda falta muito para chegar ao nível de qualidade desejado, mas é preciso ter calma, não dá para ser a BBC ainda. O importante agora é compreender que seu caráter é público, não estatal e nem privado’, diz Belluzzo.


Nelson Hoineff, jornalista e diretor do Instituto de Estudos de Televisão, concorda que uma avaliação mais severa da TV Brasil é precipitada, pois ela estreou com poucas novidades em relação à programação que a TVE já exibia. ‘A criação de uma rede pública é muito importante e deve ser louvada. A questão é que ela ainda está num processo de formatação’, afirma, acreditando no potencial da TV pública. ‘Acho que é possível fazer uma TV independente e de qualidade.’


Telejornal


Segundo Antônio Brasil, do Comunique-se, o Repórter Brasil tem se mostrado ‘um telejornal de boas notícias sobre um país que não existe. Um jornalismo de elogios com mais cara de Voz do Brasil é impossível’. Uma hipótese para o excesso de matérias abordando as ações do governo, ou mesmo a recorrente participação de seus membros no telejornal, seria o fato de que a emissora conta quase que exclusivamente com a estrutura oriunda da Radiobrás, mas opta por um modelo hard news, supostamente inspirado nas emissoras comerciais.


O presidente do Conselho Curador da EBC não referenda a posição do jornalista e diz que ‘não há nada a se comentar sobre isso, porque não há nada de concreto. Ter independência é obrigação de qualquer emissora. Assim mesmo, as emissoras comerciais defendem interesses privados e não se cria uma polêmica sobre isso’.


Já Helena Chagas, diretora de jornalismo da TV Brasil e integrante do comitê de programação, refuta a idéia de que o telejornal tenha um tom demasiadamente institucionalista e que se assemelhe a Voz do Brasil, e garante que, apesar das questões técnicas e do pouco tempo no ar, o telejornal tem se expandido de maneira consistente. ‘O Repórter Brasil já está sendo transmitido em 18 estados brasileiros, e a recepção das TVs estaduais tem sido muito boa. Queremos fazer um jornal verdadeiramente nacional, as praças locais estão contribuindo bastante, apesar das dificuldades técnicas’, afirma a jornalista.


Em relação ao formato do telejornal, Helena Chagas defende o modelo adotado e acredita que ele se aproxima cada vez mais do cidadão. ‘Acho que estamos conseguindo fazer um telejornal para o cidadão, incorporando entrevistas e debates de forma plural e fazendo uma coisa equilibrada. Governo e oposição estiveram presentes’, afirma.


Chagas, contudo, admite que a TV Brasil ainda não tem condições de operar de maneira eficiente fora de Brasília e Rio de Janeiro, mas afirma que os investimentos estão sendo feitos no sentido de superar as dificuldades técnicas. ‘Em São Paulo, por exemplo, nosso alcance é mínimo, mas já encomendamos um novo transmissor analógico mais potente, além do digital. Em outros lugares chegamos por cabo. Não sabemos ainda qual o nosso real alcance, mas existem investimentos’, conta.


Moção


Em sua segunda reunião, o Conselho Curador da TV Brasil, além de referendar seu regimento interno, aprovou uma moção onde pede ‘pluralidade de versões em toda a programação’. A advertência foi motivada pelo programa VerTV, programa de debates apresentado pelo professor da USP Laurindo Leal Filho, onde supostamente não teria havido diversidade de opiniões a respeito da não-renovação da concessão da emissora venezuelana RCTV.


Originalmente, o programa foi transmitido pela TV Câmara, em junho de 2007. No entanto, o conselheiro João Paulo Cavalcanti Filho apresentou a questão e foi seguido pelos colegas. ‘Houve um debate no mesmo sentido. O Cavalcanti propôs que a direção da emissora tentasse evitar programas com qualquer tipo de enviesamento’, disse Belluzzo. Para a Folha de S.Paulo, o conselheiro Cavalcanti Filho afirmou: ‘Nenhuma crítica ao programa, que era bem-feito, agradável de ver e o apresentador era competente. Só aproveitei para falar do futuro. Disse que os entrevistados se pronunciaram uniformemente sobre a não-renovação da concessão’.


Belluzzo conta que as recomendações feitas pelo Conselho só podem ser feitas posteriormente, para que não se confundam com qualquer tipo de censura. ‘É preciso que haja liberdade, mas dentro de certos parâmetros.’


O professor Laurindo Leal Filho, apesar de o programa ter sido gravado e transmitido originalmente em junho do ano passado em outra emissora, não critica a moção proposta por Cavalcanti. ‘Acho que essa é a função do Conselho, que é exercer seu papel de intermediário entre a sociedade e a TV Brasil. Com relação ao programa, temos tentado atribuir a maior diversidade possível, mas com a preocupação de discutir os temas por ângulos diferentes que os das TVs comerciais e isso pode gerar algum descontentamento. Recebi a notícia com muita tranqüilidade. Inclusive porque houve várias manifestações de apoio pelo alto nível do programa’, diz Leal Filho.

******

Do Observatório do Direito à Comunicação