Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Incertezas por todo lado

Os últimos relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) só têm servido para semear insegurança e dúvida nos que acompanham o noticiário sobre as mudanças climáticas causadas pela elevação da temperatura da Terra. A continuar assim, as previsões poderão cair em descrédito, o que trará ainda mais incerteza. Não é de se descartar a possibilidade de os consultórios de psicologia passarem a ser procurados por portadores de uma nova patologia, que poderia ser batizada de ‘angústia climática’.

Por um lado, a ONU diz que combater as mudanças climáticas é ‘possível e barato’; por outro, após pressão dos EUA e China, os dois campeões da poluição mundial, alguns termos do texto final do relatório foram abrandados, prova de que a conversão de Bush à causa era ensaiada, pois a intenção de ambos os países é postergar a substituição das duas maiores fontes de emissão de carbono, o petróleo e o carvão.

As atitudes das nações em relação à indústria petrolífera não alimentam dúvidas acerca das reais intenções dos que teoricamente detêm o poder de modificar as coisas hoje em nome do amanhã. O embate entre ecologistas e governantes é complexo porque é necessário crescer, mas praticamente todas as alternativas envolvem efeitos colaterais indesejáveis, e chega-se à conclusão de que será necessário escolher entre o menor dos males, optar, como disse o presidente Lula, pela energia nuclear. Engolir um remédio tão amargo quanto os demais, enquanto soluções mais amenas não se tornam viáveis.

Substituição de hidrocarbonetos?

No Brasil, a Petrobrás planeja dobrar sua produção até 2015, e tem encomendadas, só para o próximo ano, 12 novas plataformas e – pasmem o leitor e a leitora – a previsão de produção mundial de plataformas petrolíferas até 2011 é de 120 unidades. Na China, acaba de ser descoberta uma grande reserva de petróleo, o que levou as ações da estatal Sinopec às alturas. E não é à toa que os chineses estão dando US$ 13 bilhões em créditos aos países africanos. Em Angola, que ingressou na OPEP, novos poços pipocam ao longo de sua costa, e o país já vislumbra o dia, não tão distante, em que se equiparará aos grandes do Golfo Pérsico. Enquanto jazidas entram em declínio, outras são descobertas em diferentes continentes.

Houvesse a remota possibilidade de substituição dos combustíveis fósseis por outros mais limpos – embora não absolutamente –, ninguém estaria investindo bilhões na África e em outros pontos do planeta. Uma visão mais realista é que haverá acréscimo de outras fontes, mas não substituição. Pelo menos não tão cedo quanto se apregoa. A maratona energética mundial tem competidores demais e os fornecedores de equipamentos para o plantio e colheita de cana-de-açúcar não dão conta dos pedidos. Ainda que o Brasil pudesse triplicar a sua produção atual de etanol, não seria suficiente sequer para suprir a demanda dos EUA. Haverá muitos outros produtores mundo afora, à base de cana, celulose etc., mas não convém apostar na substituição tão ampla dos combustíveis fósseis pelo álcool.

E durma-se com um barulho desses – o ruído dos ecologistas e o burburinho dos mercados de energia. De perder mesmo o sono é saber que os tais cientistas não estão contando tudo sobre o aquecimento, pois uns dizem que a coisa é mais feia do que parece, enquanto outros afiançam que não é tão difícil atacar o problema.

As metas de redução da concentração de carbono na atmosfera estão aquém do desejável para que a temperatura não suba além de 2ºC, o que já é ruim. Ora, como poderá haver decréscimo se não existe, no horizonte de médio prazo, possibilidade de substituição – grife-se o termo – significativa de hidrocarbonetos? Não é preciso dizer muito mais do que isso para se chegar à conclusão de que as nações prometem o impossível. O que sobressai é a certeza de que nenhuma delas quer abrir mão do crescimento.

No entanto, apesar da variedade de posições conflitantes sobre o tema, não convém adotar um atitude cética em relação a este jogo de caça à verdade, ou seja, isto não significa que cada um não deva continuar fazendo a sua parte.

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Administrador, São Paulo, SP