Um amigo me deu um grande presente: uma assinatura do The New York Review of Books. Segundo o amigo, a gentileza quase nada lhe custou: como fez uma assinatura para ele mesmo, a outra foi praticamente cortesia. Não me falou em números, como bom cavalheiro. Mas vendo o boleto de subscrição, verifiquei que essa assinatura anual especial saiu por 96 dólares. Na renovação, cairá para US$ 76. Mas uma assinatura regular custa US$ 69; dois anos (com 40 edições), US$ 129.
No Brasil, o ano, com 20 edições, custará aproximadamente R$ 150. O Liberal, em promoção, oferece sua assinatura anual por um valor quatro vezes maior, com direito a uma sanduicheira ou uma torradeira (para compensar a falta de coisa melhor no próprio jornal?). Para fazer uma comparação mais exata, é bom não esquecer o poder de compra do americano médio comparativamente ao brasileiro. A diferença fica ainda mais brutal.
A primeira edição da assinatura que recebi foi a do Natal, a um preço de capa (US$ 4,95) menor do que a edição ordinária (US$ 5,50). Por quê? Porque havia muito mais páginas (104, quase o dobro da edição regular) e muito mais publicidade, especialmente de editoras universitárias, que publicam belos anúncios e editam livros maravilhosos (é impossível, ao encerrar a leitura do jornal, não preencher logo alguns cupons e pedir meia dúzia dos livros propagandeados). Só o roteiro das editoras já vale o que se gasta para comprar o quinzenário, que circula há 52 anos.
O que faz a diferença
Mas não há nada, no Brasil, aproximado do NYRB. Seus colaboradores estão entre a nata da intelectualidade dos Estados Unidos e do mundo. Todos são remunerados, mas escreveriam de graça. Ser convidado a colaborar com o jornal/revista é uma honra. O critério seleção de quem vai entrar em suas páginas é rigoroso. A edição natalina contou com contribuições da romancista Margaret Atwood (muito traduzida no Brasil), do professor de jornalismo Mark Danner, do historiador Orlando Figes (autor de uma fenomenal história da revolução russa), da escritora Alison Lurie, do economista Jeffrey Sachs e por aí afora (os números seguintes trariam J. M. Coetzee, Paul Krugman, Janet Malcolm, Joyce Carol Oates, Jason Epstein). Ah, sim: e há as ilustrações de David Levine, a marca da NYRB, que valem por um milhão de palavras.
É gente de peso. Não pegam a encomenda como novatos, que beliscam aqui e ali alguma pipoca informativa para escrever suas resenhas cheias de ar, como aqueles pastéis da nossa infância, apetitosos e nem um pouco nutritivos. Quando o articulista pega pesado e o resenhado tem brio, segue-se uma polêmica que instrui a todos, inclusive a aprender como polemizar com um grau de conhecimento inacessível aos que simplesmente improvisam, como costuma acontecer no jornalismo cultural brasileiro. Geralmente os resenhadores analisam mais de um livro, que comentam num contexto mais amplo. Dão ao leitor uma visão alguns degraus acima de quem não dispõe de tal perspectiva. Certos artigos valem por um curso completo sobre o tema. Isso é alta cultura. Onde podemos obtê-la em publicações periódicas?
Por isso, o New York vale seu peso em ouro. Porque faz realmente a diferença. Quando se concluí sua leitura, mesmo incompleta, tem-se a sensação de prazer e realização. Renova-se a vontade de continuar a apostar no saber humano.
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Jornalista, editor do Jornal Pessoal (Belém, PA)