A realização do I Fórum Nacional de TVs Públicas representou um avanço ao reconhecer a necessária existência de um campo público de televisão – radiodifusão – no país. Durante a sua preparação, iniciada há nove meses, o Fórum promoveu e viabilizou, de forma inédita, discussões, grupos de trabalho, relatórios e documentos pensados por especialistas do setor, representantes da sociedade civil organizada, empresas e governo. Entretanto, se o processo foi rico na participação, o produto final dos quatro dias de debates em Brasília (8 a 11 de maio) não correspondeu à altura nos encaminhamentos necessários para dar forma a uma nova TV realmente pública.
Para o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o encontro deixou a desejar – considerando o esforço desenvolvido e a amplitude dos debates preliminares ao I Fórum Nacional de TVs Públicas, as energias empenhadas na conceituação e estruturação do que seria a TV pública brasileira ‘que queremos’.
Na avaliação do coordenador-geral do FNDC, jornalista Celso Schröder, problemas como a presença excessiva de representantes do Estado nas mesas que trataram dos vários temas, a virtual desatenção ao debate conceitual envolvendo as definições de ‘público’ e de ‘estatal’, além da falta de uma proposta sobre o que seria um novo modelo de serviços (possível no ambiente digital onde essa TV será implantada) fragilizaram o processo que vinha sendo construído, podendo comprometer a estrutura da nova televisão.
O que ficou proposto no Fórum, na interpretação do coordenador-geral do FNDC, é uma rede de conteúdo, um ‘acordo protocolar’ de distribuição de conteúdo, e não um sistema público, como prevê a Constituição. ‘Embora encontremos na Carta de Brasília a recomendação de que seja adotada uma estrutura horizontalizada para essa TV Pública, ela permanece vertical ao sinalizar com uma difusão centralizada na Radiobrás e na TVE do Rio’, avalia. Schröder considera que as expectativas demonstradas quanto às tecnologias para a nova TV pública reduzem a dimensão da rede ao não prepararem um novo modelo de serviços.
Euforia e cautela
O FNDC defende a implantação de uma infra-estrutura pública e única para essa TV. Pública, no sentido do acesso e do controle. ‘O Estado brasileiro tem recursos para promover a universalização das tecnologias de informação e da comunicação por meio de uma rede pública e única’, afirma Schröder. Conforme explica, a rede se caracterizaria como ‘pública’ na medida em que o acesso à mesma seria universal e seu controle teria participação pública. E sua característica de rede ‘única’ adviria da racionalidade econômica que ela permitiria, viabilizando a livre circulação de conteúdos.
‘Mas – observa Schröder – a comunicação pública não pode mais ser compreendida apenas como o ato de tornar públicos conteúdos relevantes. Ela representa a base tecnológica e política de um grande diálogo nacional entre o Estado, o cidadão e a cidadania.’
Berenice Mendes, cineasta, membro da direção-executiva do FNDC, ressalta que a manifestação do presidente Lula, no encerramento do Fórum (leia aqui), atesta a vontade política do governo em reconhecer e construir uma rede pública de televisão. Porém, considera que o evento não aprofundou os debates sobre como será estruturada dessa rede. ‘O trabalho será muito grande no que se refere à estrutura e fontes de financiamento. Falta dimensionar o que representa assumir o conceito de horizontalidade nessa construção. Por isso, apesar da euforia, precisamos de cautela durante esse processo’, ressalvou Berenice, lembrando que a comunicação pública precisa ter como pano de fundo a constituição da cultura nacional através da promoção e difusão da diversidade brasileira. Nesse sentido, uma rede pública deve ter em sua estrutura operacional e programação elementos que garantam a configuração de redes horizontalizadas em diversas instâncias.
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Da Redação do FNDC