O senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) incitou um debate ao apontar uma suposta relação promíscua entre a Rede Globo e a Polícia Federal. O Jornal da Band da quarta-feira (23/5), reiterou o discurso do parlamentar, mostrando inclusive a presença de um repórter da Globo acompanhando de forma exclusiva agentes da PF e deu voz ao ministro da Justiça Tarso Genro, que tachou de crime a passagem de informação privilegiada. O ministro afirmou que deve se investigar a situação.
À primeira vista, se a Polícia Federal prioriza determinada emissora em detrimento das demais, soa a um descalabro antidemocrático, já que os resultados das operações investigativas da PF são de interesse público e, portanto, merecem divulgação irrestrita, ampla e logo não podem servir como moeda de troca, para atender interesses particulares.
É suspeita a distribuição das imagens em primeira mão para a Globo e só depois elas serem disponibilizadas para as outras emissoras. Vem à mente o mesmo procedimento usado no jornalismo fiteiro, quando jornalistas são municiados de ‘bombas’ por suas fontes íntimas – que cultivaram ao longo dos anos para obter a tal almejada exclusividade de informação, atributo que aumenta sobremaneira o capital jornalístico, auferindo assim prestígio ímpar dentro do campo profissional.
Informar primeiro não é ilícito
Entretanto, se deixarmos uma grande interrogação tomar corpo, a pergunta que segue é: mas não é legítimo, não é peculiar do ethos jornalístico saber ‘conquistar’ fontes para que se possa chegar mais rápido às informações importantes; a competição jornalística neste sentido, de luta pela informação mais valiosa, não é salutar para a atividade?
É a promiscuidade entre fontes e jornalistas o ponto da questão, o que vale dizer que o simples fato de se obter de forma mais rápida ou exclusiva a informação não determina, irremediavelmente, que o modo pelo qual a informação foi obtida tenha sido ilícito, impróprio, indigno, aético ou imoral. Voltando ao jornalismo fiteiro, percebe-se que o vilão da história não é especificamente o recebimento dos dossiês da vida, mas montar denúncias baseadas apenas no material recebido, sem preocupações em apurá-lo mais exaustivamente para ratificar informações contundentes e refutar outras, eventualmente infundadas.
Há pouco tempo, por exemplo, quando da divulgação das imagens da montanha de dinheiro apreendida pela PF no ‘dossiêgate’, o jornal O Estado de S.Paulo foi o primeiro a exibir as fotos, que teriam sido passadas, conforme acusações da época, pelo delegado Edmilson Bruno (que se defendeu afirmando que o CD com as fotos teria sido roubado). O fato de aquele jornal ter recebido antes o material tem pouca relevância frente ao perigo que é a imprensa ser usada para beneficiamentos políticos escusos e rasteiros, ou mesmo para simples promoção pessoal de servidor público. Mora aí o fantasma que pode solapar a dignidade do ethos jornalístico, calcado na competição pela informação.
Se uma emissora, site, jornal ou rádio consegue informações mais rápido que os concorrentes, não há nada de ilícito nisso; ao contrário, faz parte do jogo democrático do qual o jornalismo é principal representante. Haverá problema, sem dúvida, se jornalistas tiverem promovendo interesses particulares em troca de informações exclusivas, ou então se estiverem pressionando de algum modo outros para tal objetivo. Os olhos devem estar atentos para o modo como informações são veiculadas pela imprensa, porque só o simples fato de informar primeiro não pode condenar a prática jornalística. Pelo contrário.
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Estudante de Jornalismo da Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA