O número de ações indenizatórias por dano moral contra os cinco mais conhecidos grupos de comunicação (Globo, Abril, Estado, Folha e Editora Três) caiu nos últimos quatro anos. Em compensação, a faixa média das indenizações no Brasil multiplicou-se por quatro. Passou de R$ 20 mil para R$ 80 mil.
Valor Médio de Indenizações | |
Ano | Valor |
2003 | R$ 20 mil |
2007 | R$ 80 mil |
O levantamento, feito pela revista Consultor Jurídico, foi divulgado durante o 2º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, promovido pela Abraji, nos dias 18 e 19 de maio, em São Paulo.
Até o mês de abril, registravam-se 3.133 processos em um universo de 3.237 jornalistas. Os dados foram fornecidos pelos advogados da Editora Abril, Grupo Folha e Grupo Estado. Os dados do sistema Globo e da Editora Três foram pesquisados nos sites de tribunais. As duas empresas somam juntas 1.825 ações.
O levantamento apontou que as empresas jornalísticas vencem cerca de 80% das ações cíveis. Do universo global de processos, apenas 4,2% foram ajuizados na Justiça criminal.
Em pesquisa anterior, feita junto ao mesmo grupo de empresas, registrou-se a existência de 3.342 ações contra um universo de 2.783 jornalistas. Ou seja, havia 1,2 processo para cada profissional. A relação caiu para 0,9 processo por jornalista.
Números de Jornalistas X Número de Processos (Cinco Maiores Grupos de Comunicação) | ||
Ano | Jornalistas | Processos |
2003 | 2.783 | 3.342 |
2007 | 3.237 | 3.133 |
Quadro de Jornalistas (Cinco Maiores Grupos de Comunicação) | |
Ano | Número de jornalistas |
2003 | 2.783* |
2007 | 3.237** |
* Em 2003 foram contabilizados os profissionais em jornais impressos, TVs e revistas;
** Em 2007 foram considerados também os jornalistas na internet e em agências.
A se confirmar as projeções, considerado o índice de vitórias da imprensa e o valor médio das condenações, os eventuais ofendidos serão indenizados em R$ 50 milhões (627 processos multiplicados pela média de R$ 80 mil).
A primeira vez que o Consultor Jurídico fez esse levantamento, no ano de 2001, apurou-se que havia apenas 1.237 processos contra empresas e profissionais de imprensa. A apuração foi feita no mês de dezembro.
Progressão do Número de Processos (Cinco Maiores Grupos de Comunicação) | |
Ano | Número de processos |
2001 | 1.237 |
2003 | 3.342 |
2007 | 3.133 |
Números de Jornalistas Maio 2007 | |
Empresa | Números |
Abril | 780 |
Grupo Estado | 200 |
Grupo Folha | 430 |
Grupo Globo | 1.766 |
Editora Três | 61 |
Total | 3.237 |
A brusca elevação do volume de ações por dano moral contra a imprensa não é um fenômeno isolado. Pelos números do Superior Tribunal de Justiça, a reportagem apurou um crescimento de 42.700% entre o ano de 1993 e o primeiro quadrimestre de 2007 (considerando todo e qualquer tipo de ação por dano moral). Entre 2001 e 2007, o número de processos contra a imprensa cresceu 159%. Pela estatística no STJ os processos que pedem reparação por dano moral de toda ordem (não só contra a imprensa), no mesmo período, multiplicaram-se por 12.
Considerando-se que o STJ recebe cerca de 300 mil recursos por ano e a Justiça brasileira recebe algo como 30 milhões de processos novos a cada 12 meses, pode-se fazer uma projeção para estimar o número de processos por dano moral em todo o país. Ou seja: se o STJ recebe anualmente 10 mil novos processos por dano moral isto pode representar, nacionalmente, um volume de 1 milhão de ações com essa finalidade.
De onde se pode aduzir que o número de 3.133 processos existentes contra os cinco grandes grupos de comunicação é alto — já que existem no país mais cerca de cinco mil empresas jornalísticas. Mas os números enquadram-se em um contexto de mudança de comportamento do país. Um dos grupos de comunicação consultados informou que, para os cerca de 300 processos por dano moral contra a redação, há outras 1.200 ações de outra ordem contra a empresa.
Processos Autuados no STJ com os assuntos ‘Indenização — Dano Moral / Dano Material c/c Moral’ | |
Ano | Número de processos |
1993 | 28 |
1994 | 47 |
1995 | 181 |
1996 | 228 |
1997 | 440 |
1998 | 540 |
1999 | 962 |
2000 | 1.331 |
2001 | 1.748 |
2002 | 3.990 |
2003 | 4.632 |
2004 | 8.201 |
2005 | 10.008 |
Na edição nº 2010 (de 30/5/2007), a revista Veja foi obrigada a publicar a íntegra da sentença que a condenou a pagar indenização por danos morais ao delegado da Polícia Federal Paulo Gustavo de Magalhães Pinto. Motivo: Veja afirmou que o delegado estava envolvido no escândalo da gravidez da cantora mexicana Glória Trevi e que era acusado de ter autorizado ilegalmente mais de dois mil porte de armas.
A determinação foi do juiz Manoel Franklin Fonseca Carneiro, da 20ª Vara Cível do Distrito Federal. A decisão foi tomada em 2003. A Editora Abril, responsável pela publicação, recorreu e conseguiu reduzir o valor da reparação de R$ 100 mil para R$ 60 mil. Só não conseguiu reverter a determinação de publicar a íntegra da sentença condenatória com o mesmo destaque do fato noticiado pela revista em 24 de outubro de 2001.
Um fator que não tem ajudado jornais e jornalistas é o intenso noticiário versando sobre as intrincadas questões que envolvem temas judiciais e juízes. As notícias desagradáveis têm gerado fricções com a magistratura.
A revista Exame foi alvo de três ações de indenização por danos morais movidas por juízes trabalhistas por conta de uma nota publicada na seção Leis & Negócios, em 2004. A curta notícia falava de um encontro de juízes do Trabalho, promovido em Angra dos Reis, nos dias que antecederam o feriado de finados. Despretensiosa, a nota falava o óbvio. Fazia a contraposição entre uma Justiça mergulhada na morosidade e um cenário nacional cheio de feriados emendados, férias e eventos realizados em dias úteis.
Três juízes trabalhistas decidiram processar o autor da nota. As três ações foram consideradas improcedentes em primeira instância. Os juízes recorreram. O tribunal de Justiça de São Paulo já rejeitou dois dos recursos, o último há um mês. O terceiro aguarda julgamento. O argumento para a rejeição das ações foi basicamente o mesmo: a crítica se destinaria ao sistema e não aos autores, individualmente.
Em maio, o juiz Alexander dos Santos Macedo conseguiu que a Infoglobo publicasse um direito de resposta às acusações de irregularidades na época do julgamento do caso Palace 2. A resposta, que ocupou uma página de O Globo em 19 de maio, trouxe o voto do relator Motta Moraes na decisão que inocentou Macedo no Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
O cenário brasileiro, contudo, é ainda suave em comparação com decisões no exterior. No mês de abril deste ano, o jornal The Boston Herald foi condenado a pagar US$ 2 milhões a um juiz. A decisão foi tomada pela Suprema Corte de Massachusetts. O juiz processou o jornal porque o matutino o definiu como uma pessoa ‘flexível para o crime e insensível ao sofrimento de uma vítima de estupro’.
A Suprema Corte de Massachusetts afirmou que a imprensa tem o direito e o dever de examinar o setor judicial e criticar juízes e outras autoridades da corte. Mas ressalvou: ‘A imprensa, entretanto, não deve nem pode publicar informação falsa sobre ninguém, porque isso pode gerar furor público’.
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Diretor da revista Consultor Jurídico