Gritos, pessoas correndo, tiros, caos. Desde segunda-feira (28/5), manifestantes, em sua maioria estudantes, tanto das universidades quanto dos colégios, escolas e cursinhos, saíram às ruas do centro de Florianópolis para manifestação contra o aumento da tarifa de ônibus, que desde o último domingo passou para R$ 2,40, a mais alta do Brasil.
Apitos, tambores, cartazes e gritos de guerra: ‘Vem, vem!/Vem pra luta, vem!/Contra o aumento!’; ‘Ei, policial! Me proteja, não proteja o capital!’
A polícia organizada faz barreiras para evitar excessos, sobretudo no que diz respeito ao fechamento de ruas. ‘Estamos aqui para garantir a manifestação do pessoal e a segurança de todos’, diz capitão Reus, da Polícia Militar.
Os manifestantes não partilham de idéias homogêneas. Alguns querem simplesmente protestar, outros preferem fazer festa (dançando, bebendo e até uma rodinha de futebol); uns estão ali em posições políticas (como dois guris com a bandeira do PSTU sobre os ombros), e outros, ainda, desacatam policiais, seja atirando pedras ou rojões, seja com palavras ofensivas. Tem de tudo.
‘Baderneiros’, ‘arruaceiros’
O confronto mostra-se inevitável. Quando os estudantes tentam fechar uma das ruas principais para gritar suas reivindicações (a maioria acha que esse é o único modo de realmente dirigir a atenção da população para o movimento), a tropa de choque usa a força. Alguém joga um rojão e a PM devolve com balas de borracha, bombas de efeito ‘moral’ e spray de pimenta.
Quinta-feira, a manifestação, em seu auge, reuniu, segundo a PM, cerca de 3,5 mil pessoas: a maior da semana. Houve confronto e o que vimos em grande parte dos jornais e na televisão foi algo comum no jornalismo: a mudança de foco. O fato deixou de ser a manifestação para ser a confusão causada pelos estudantes. A idéia é de que eles são baderneiros, arruaceiros, bandidos. Depredaram um ônibus e um ponto de parada, mas será que é o que faz a maioria dos estudantes e dos manifestantes, ou trata-se de caso isolado? Precisa-se investigar. A generalização corre o risco de não ser verossímil.
O que importa é a superfície
No telejornal Bom Dia Brasil, logo depois de notícias do Rio de Janeiro, sobre o tiroteio entre traficantes e policiais, foi ao ar a nota coberta: ‘Em Florianópolis, o vandalismo tomou conta das ruas…’, que termina com a imagem do rojão que algum dos estudantes (ou não) arremessou contra o cerco da PM.
Mais uma vez, muda-se o foco do acontecimento. Nada foi dito sobre o motivo da reivindicação dos estudantes, sobre a tarifa mais alta do país do sistema de ônibus de Florianópolis. Naquele telejornal, nada, absolutamente nada, sobre a enfermeira que levou um tiro de borracha na perna ou sobre a estudante que, passando em frente ao cerco policial, levou, direto nos olhos, um jato de spray de pimenta, espirrados por um fardado. Ou ainda quem sofreu ferimentos por causa dos estilhaços das bombas de efeito ‘moral’.
Na matéria, feita sob o ponto de vista oficial: ‘Quatro policiais foram feridos e três manifestantes foram detidos por agressão e dano ao patrimônio público.’ Mais uma vez, os estudantes são perturbadores da ordem estabelecida. Subversivos?
Para esse tipo de jornalismo, o que mais importa é a superfície, e não um conteúdo mais aprofundado.
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Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC