O Observatório da Imprensa é um espaço no qual ainda se pode dizer tudo aquilo que a grande imprensa não permite. Nesse aspecto, não há por que criticá-lo. Eu mesmo tive muitos textos publicados lá. Contudo, as posições dos observadores titulares diante de condutas absolutamente imorais de grandes órgãos de imprensa, causam espécie porque colidem frontalmente com um princípio pétreo do bom jornalismo, que é o da pluralidade.
A imprensa brasileira viola esse princípio ao esconder vários fatos sobre a não-renovação da concessão da emissora venezuelana RCTV. Esconde, por exemplo, que às ruas de Caracas estão saindo manifestantes contrários e favoráveis à medida do presidente Hugo Chávez. Esconde, também, que a emissora em questão foi uma das cabeças do complô que ensejou o seqüestro do presidente constitucional da Venezuela em 2002 e o fechamento do congresso concomitantemente à tentativa frustrada de golpe de Estado. O que a imprensa diz, en passant, é que Chávez faz essa afirmação, quando existem até provas de que é verdadeira.
Ora, por mais que o observador-mor do Observatório da Imprensa, Alberto Dines, seja contra a medida de Chávez, deveria clamar por pluralidade, deveria clamar para que o debate sobre assunto na imprensa brasileira fosse amplo, e para que todas as opiniões sobre o assunto fossem passadas à sociedade a fim de que esta pudesse formar opinião livremente, sem manipulações, sem omissões e/ou distorções de fatos. Afinal, supõe-se que é para isso que alguém se propõe a observar a imprensa, isto é, para cobrar dela condutas compatíveis com o bom jornalismo, que, repito, para merecer tal designação está obrigado a adotar a pluralidade de opiniões e a reportar a integralidade dos fatos.
Imprensa com medo
O texto do observador Alberto Dines no OI [‘As reações ao fechamento da emissora‘] viola essa lei não-escrita de observação da imprensa. O assunto são ‘as reações ao fechamento da emissora’. Só aí já há uma distorção da verdade. Não houve fechamento. O uso dessa palavra embute a idéia de que o governo venezuelano, do nada, pôs fim às transmissões da RCTV, quando, na verdade, negou, de acordo com a lei, a renovação da concessão pública de que ela era detentora. E fez isso no prazo certo, quer dizer, quando venceu a concessão.
Ora, mas se é tão errado cassar a concessão de uma TV, por que é que na Venezuela, tanto quanto no Brasil, as faixas de transmissão não são doadas ou vendidas aos grupos privados em vez de serem meramente concedidas e por prazo determinado?
Há montanhas de argumentos que podem ser apresentados em prol da decisão de Hugo Chávez. Contudo, a imprensa brasileira simplesmente está negando esse debate à sociedade. Seria lícito dizer que é por que considera fortes os argumentos favoráveis à não-renovação da concessão da RCTV? Se não é, parece. O que mais explica por que a Globo, a Folha de São Paulo e todos os outros grandes órgãos de imprensa estejam impedindo que os argumentos favoráveis à medida do governo venezuelano sejam expostos? Em minha opinião, a imprensa brasileira tem medo desses argumentos.
Fica, pois, a pergunta: que espécie de observação da imprensa é essa que, além de não criticar a interdição desse tão importante debate, ainda deixa claro, por omissão, que apóia tal conduta?
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Comerciante, São Paulo; http://edu.guim.blog.uol.com.br