Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Crítica diária

31/05/07

A primeira página tem uma única chamada para Dinheiro: ‘Fundos de pensão poderão investir com mais risco’. A capa do caderno, espaço dedicado à notícia mais relevante do dia anterior, trata de outro assunto: ‘Governo vê perda de R$ 40 bi com cartéis’.

O leitor não sabe o que a Folha considerou mais importante ontem no setor: a novidade sobre os fundos ou a projeção oficial sobre o prejuízo causado por cartéis que atuam em licitações públicas.

Yoko Ono

A primeira página tem chamada no alto, a Ilustrada concede centímetros generosos, com duas fotos, para o factóide de Yoko Ono, que comeu cachorro.

A artista já teve momentos melhores e performances mais dignas de nota. A Folha pareceu dar atenção exagerada a um evento pouco importante e fabricado para a mídia.

100%

Pela segunda vez em poucos dias, nenhuma mensagem de ‘leitor comum’ é publicada no Painel do Leitor. As cartas hoje são assinadas, em ordem, por ‘prefeito’, ‘assessora de imprensa’, ‘diretor’, ‘chefe da assessoria de comunicação’ e ‘assessora de imprensa’. Todos os missivistas têm direito à manifestação, e o jornal deve publicar suas declarações. Mas em outro espaço.

Notícia escondida

A Folha publicou em uma só coluna, bem curta, no pé de página, o texto ‘Envolvidos são investigados pela Receita Federal’ (pág. A13).

A mesma informação valeu a manchete do ‘Estado’.

Notícia ignorada

Em outro pé de página, desta vez em duas colunas, o jornal noticia que ‘Em reunião, Lacerda oficializa afastamento de delegados da PF’ (pág. A13). O texto tem baixa temperatura jornalística.

A concorrência vê a Polícia Federal em meio a confrontos, ignorados pela Folha. O ‘Estado’, em alto de página: ‘Atrás dos holofotes, guerra na PF’. O ‘Globo’: ‘Afastamento de diretor provoca racha na PF’. Ambos os diários com chamadas na primeira página.

Na reunião da PF, de acordo com a Folha, os delegados ‘Zulmar e Nunes negaram as acusações’. Segundo o ‘Globo’, houve ‘troca de insultos’.

Cartéis e jornalismo crítico

Há contradição entre o texto ‘Governo vê perda de R$ 40 bi com cartéis’ (pág. B1) e a legenda da fotografia que o acompanha: a secretária de Direito Econômico é chamada de ‘Marina’ Tavares e ‘Mariana’ Tavares. Qual o certo?

É o de menos. Parece haver um problema na reportagem, a falta de ceticismo. O jornal divulga a versão oficial como se o governo contasse, de fato, com recursos humanos e materiais para enfrentar os cartéis que atuam em licitações públicas.

Não detalha a fórmula para o governo calcular o prejuízo. Contenta-se em transmitir a projeção. E, se o governo pode projetar as perdas, por que não as combate mais efetivamente?

O papel do jornal não é transmitir acriticamente as versões do poder (seja ele qual for), mas o de contextualizá-las e, se for o caso, questioná-las.

Notícia ao longe

A Folha reconheceu importância na decisão de Ronaldinho e Kaká se ausentarem da próxima Copa América. Além de noticiar com destaque, levou à sua primeira página, em edições diferentes, as opiniões de dois colunistas sobre o episódio.

Pois ontem a seleção se reuniu em Londres, para um amistoso amanhã, no novo estádio de Wembley. A Confederação Brasileira de Futebol expôs na internet uma carta de Kaká que o jogador considerava reservada. O técnico Dunga demonstrou nervosismo.

Nesse ambiente carregado, descrito com detalhes pelo ‘Globo’ e, especialmente, pelo ‘Estado’, a Folha não tinha repórter.

Em um espaço mínimo, que ignora o confronto de dois dos principais jogadores do planeta com a CBF, o jornal reduziu o noticiário a uma coluna em pé de página. Com declaração colhida do UOL.

O texto se limita a citar a absurda afirmação de Dunga, para quem o nível de dificuldade da Copa América seria maior que o da Copa do Mundo. O jornal deveria esclarecer o leitor, mostrando o abismo de nível técnico.

Desconheço os motivos que impediram a Folha de enviar um repórter a Londres. Entre a prova de Fórmula 1 de Mônaco no domingo passado, acertadamente coberta com enviada especial, e o clássico internacional de amanhã, o evento futebolístico tem muito maior apelo jornalístico.

Resposta ao ombudsman

Recebi a mensagem abaixo do correspondente em Caracas, Fabiano Maisonnave.

Gostaria que o ombudsman explicasse por que achou relevante criticar a falta de aspas de estudantes chavistas, no texto sobre as manifestações contra o fechamento da RCTV, mas não comentou que o texto principal, com as declarações de Chávez e de um deputado governista, não trouxe entrevistas com porta-vozes da oposição.

As manifestações contra Chávez promovidas por estudantes universitários de instituições públicas e privadas são a grande novidade política do país nesta recente crise, como contextualizou um analista no texto criticado pelo ombudsman e está sendo registrado em outros meios de comunicação. Estudantes chavistas e antichavistas têm pesos políticos diferentes no momento, assim como as declarações de Chávez e as da esvaziada oposição tradicional. Fazer uma cobertura simétrica e cartesiana, como parece sugerir o ombudsman no caso das manifestações estudantis, não é, a meu ver, a melhor fórmula para buscar o equilíbrio. Mais eficaz é priorizar os atores relevantes.

Sobre se as manifestações estão crescendo ou não no país, é uma pergunta pertinente, mas difícil de ser respondida neste momento pela falta de informação de imprensa ou oficial confiável, tanto do governo chavista quanto das prefeituras de oposição que registram protestos. O que tenho segurança em dizer é que elas prosseguem e são significativas. Não sei como o ‘Estadão’ conseguiu essa avaliação, mas os três maiores jornais do país, ‘Ultimas Noticias’ (chavista ‘light’), ‘El Universal’ e o ‘El Nacional’ (duros críticos do governo), todos com uma rede de correspondentes pelo país, não foram capazes de fazer isso nas edições de hoje (quarta). O mesmo ocorreu com as agências de notícias.

Sobre os argumentos do governo Chávez para encerrar a concessão da RCTV, realmente faltaram na contextualização de hoje, mas têm sido repetidos com bastante freqüência ao longo da cobertura do assunto, que acumula cinco meses e tem saído quase diariamente há cerca de uma semana. Por exemplo, na entrevista com Lil Rodríguez, a presidente do novo canal estatal, Tves, publicada no domingo.

Comentário do ombudsman

Agradeço a resposta e a comento.

Estamos de acordo, portanto, sobre dois pontos da crítica diária de ontem: saber se as manifestações estão crescendo ou não é ‘uma pergunta pertinente’, como reconhece o correspondente; e que ‘realmente faltaram na contextualização’ (também palavras suas) informações sobre os motivos alegados pelo governo para fechar (ou não renovar a concessão) da RCTV.

Não considero, porém, que uma informação fundamental, mesmo citada em outras edições, possa ser dispensada. Quem leu a Folha na quarta-feira talvez não a tenha lido no domingo. Mesmo se leu, pode ter esquecido. Cabe ao jornal, cotidianamente, relembrar os fatos mais relevantes.

‘Cobertura cartesiana e simétrica’? Quem a sugeriu?

Minha opinião é de que, se havia ontem estudantes nas ruas contra e pró-Chávez, o jornal deveria ouvir as duas partes. Um político não substitui a figura do ‘estudante’, simbolicamente menos partidária (mas não necessariamente).

Sobre o pedido do correspondente (‘Gostaria que o ombudsman explicasse […]’): as críticas duras do presidente da Comissão Européia a Chávez contribuíram para o equilíbrio da página dedicada à Venezuela. Não havia por que necessariamente haver ‘outro lado’ do governo venezuelano sobre as afirmações de Durão Barroso _Chávez se pronunciou no abre (a reportagem principal).

Mas há um aspecto que merecia estar no jornal e não estava: a Folha noticiou os ataques de Chávez à Globovisión, mas não procurou a emissora em busca de sua versão. De fato, uma falha jornalística.

30/05/07

Uma das funções essenciais de um jornal é hierarquizar as notícias para o leitor.

Hoje, o segundo título de maior destaque da primeira página afirma: ‘Renan reconhece que não pode provar pagamentos’. No pé da chamada se conta que o PSOL protocolou representação contra Calheiros e que dois senadores pediram o afastamento do presidente da Casa.

Já em Brasil a chamada da primeira é relegada ao pé da pág. A4. Aqui, o destaque (‘Senadores pressionam Renan e caso vai ao Conselho de Ética’) é para informação que está no fim da chamada da capa.

Afinal, para a Folha, qual foi a notícia mais relevante de ontem no Caso Renan? A opção da primeira página ou a da editoria Brasil?

Título versus texto

É insustentável o título da primeira página ‘Mangabeira Unger move ação contra fundos estatais’.

O que a chamada afirma, corretamente, é que a ação é contra a Brasil Telecom. É evidente que se deve informar que fundos de pensão estatais estão entre os principais acionistas da empresa. Mas uma coisa é uma ação contra a empresa, outra contra os fundos.

O jornal deveria corrigir.

A propósito da revelação da Folha (pág. B2), faltou lembrar que Mangabeira afirmou que adiaria a posse no governo para cuidar de afazeres acadêmicos. Como se vê, havia mais um motivo.

Greves, opinião e informação

A Folha vai melhor como espaço plural de opinião sobre a mobilização nas universidades estaduais paulistas do que no noticiário. É interessante o artigo do secretário Aloysio Nunes Ferreira em Tendências/Debates. O pé biográfico ficaria mais rico se contasse que ele foi dirigente estudantil na USP nos anos 1960.

Ao sustentar que não há novidades de peso nos decretos do governo Serra, o secretário se refere a ‘jornalistas que não se deram ao trabalho de conferir o que iam escrever’. O que a Folha tem a dizer aos seus leitores? Aloysio está certo? Ou há mudança de qualidade nos novos decretos, em comparação com os de anos anteriores?

O jornal fará muito bem se oferecer o mesmo espaço para quem discorda do secretário, como tem feito.

Coincidência: no mesmo dia em que Aloysio escreve artigo na Folha, o ‘Globo’ publica pingue-pongue com ele.

Leitora versus jornal

Em carta publicada no Painel do Leitor, a estudante Julia Alves afirma que não é invasora da reitoria da USP. No domingo, ela apareceu em foto de primeira página, acompanhando a chamada ‘Quem são os invasores da reitoria da USP’.

A repórter responde dizendo que a estudante foi apresentada como ‘participante do movimento’. Não reconhece erro do jornal.

Ora, se a primeira página sugeriu que a aluna de economia era invasora da reitoria, e ela nega, por que insistir?

A Folha deveria corrigir a informação implícita na chamada dominical.

Na contramão

A principal reportagem da Folha sobre a Operação Navalha e o Caso Renan vai na contramão do que se lê em outros jornais (‘Senadores pressionam Renan e caso vai ao Conselho de Ética’). O jornal prefere destacar a representação do PSOL (que, salvo engano da memória traiçoeira, tem apenas um senador) e as palavras de outros dois senadores.

O ‘Globo’ aponta um acordão. A Folha não tem a informação do jornal carioca, sobre um almoço de ‘cardeais’ do Senado que resolveram bancar Renan Calheiros.

O jornal diz que, ‘apesar disso, o clima geral entre os senadores ainda era de apoio a Renan’. Por que secundarizar tal informação?

Até agora, o mais evidente não é que (três) ‘senadores pressionam Renan’, mas que o sustentam. Se vão conseguir, é outra questão.

Defesa omitida

O senador Almeida Lima discursou ontem negando ter recebido presente da empreiteira Gautama. Embora a reportagem da Folha não dissesse que os presentes tinham sido entregues, o jornal tinha o dever de publicar hoje a versão do parlamentar, apresentada publicamente. Surpreende que não o tenha feito.

O senador enviou mensagem ao ombudsman na manhã de ontem. O protesto sobre a inclusão do seu nome foi encaminhado cedo à Redação. Por que não houve registro da sua versão?

A Folha introduziu e consagrou no jornalismo brasileiro o direito ao ‘outro lado’. Deveria reafirmá-lo a cada dia.

Para entender o caso

São muito bons o texto e os quadros da pág. A6, ‘Governo e Congresso sujeitam Orçamento ao jogo do poder’. Informam, ensinam, esclarecem. Boa inspiração para o jornal.

Aposentado punido

Pode ser falha minha, mas não consegui entender um aspecto fundamental da reportagem ‘Ministra do STJ afasta número 2 da PF’, que fundamenta a manchete do jornal: a determinação atinge um delegado que é aposentado. Ele exerce a função de secretário de Segurança da Bahia. O afastamento é de suas ‘funções públicas’. Isso implica deixar a secretaria? Se implica, por que não afirmar explicitamente?

Disputa na PF

Há poucas semanas esta crítica diária chamou a atenção para a disputa na Polícia Federal em torno da sucessão de Paulo Lacerda. Hoje, a coluna ‘Toda Mídia’ cita texto do jornalista Bob Fernandes sobre o tema, no Terra.

A Folha deveria investigar o que se passa.

A grande pauteira

Seguem as transcrições de gravações feitas pela Polícia Federal. As interceptações revelam um painel interessante sobre as relações entre o público e o privado. No atacado, porém, o jornal publica muitas transcrições que não provam nada, como hoje (‘Empresário elogia acusado de ser mensaleiro’). Ao ler o título, é razoável pensar: e daí?

Conta pela metade

A Folha informa que o governo do Maranhão gastou R$ 342,5 mil para publicar anúncios em jornais.

O ‘Globo’ diz que o total é de R$ 637,5 mil, incluindo jornais e emissoras de TV.

Por que a Folha não considerou mídia eletrônica na sua conta?

Foto perdida

O ministro Franklin Martins não é citado na boa reportagem ‘Lula decide gastar R$ 350 mi por ano com televisão pública’ (pág. A8). Por que, então, uma foto sua acompanha o texto? O leitor não é obrigado a saber.

O texto fala em um ‘auxiliar presidencial’ como fonte em off. A escolha da fotografia pode levar leitores a relacionar a fonte oculta à imagem ao lado.

Venezuela

A reportagem ‘Chávez ameaça TV e ataca estudantes’ (pág. A9) não informa quais foram as alegações do governo da Venezuela para não renovar a concessão da RCTV, atitude que provoca onda de protestos.

Para ter idéia da evolução do cenário político no país, é preciso saber se as manifestações anti-Chávez estão crescendo em número de participantes ou não. O ‘Estado’ diz que sim. Na Folha, não encontrei resposta.

O jornal fez bem em ir à rua ouvir os manifestantes. Não vi, contudo, entrevista com os estudantes pró-Chávez que desfilaram ontem, só com os oposicionistas.

Foi correto destacar o silêncio de Lula sobre a não renovação da licença da RCTV. Faltou, no entanto, lembrar os casos em que o presidente se sentiu à vontade para falar da política interna de vários países.

Merece mais atenção o texto ao qual o PT aderiu, comparando a RCTV à TV Globo. Há sugestão de imitar no Brasil o gesto anti-democrático do presidente venezuelano?

Ciclotimia

É difícil entender que importância jornalística a Folha reconhece na cobertura da mobilização nas universidades paulistas. A edição de hoje, depois de um dia em que as manifestações se expandiram por todo o Estado, ocupa apenas uma coluna, em parte inferior de página.

Sugestão de leitura

A quem interessar, o ‘La Nación’ traz hoje um texto do jornalista argentino Tomás Eloy Martínez sobre os 40 anos de ‘Cem Anos de Solidão’.

Está, com acesso livre, em www.lanacion.com.ar

Em tempo

O cartum ‘Brasília Freak Show’, de Angeli, valeu a edição de ontem. Mostra o ‘homem probo’ apresentado em um ‘circo de aberrações’.

29/05/07

Renan Calheiros qualificou de ‘destruição do Estado de direito’ a cobertura jornalística que o senador diz considerar invasão à sua privacidade. Calheiros se refere às reportagens sobre a intermediação feita por um lobista de empreiteira para o pagamento de pensão.

A Folha deveria se pronunciar sobre as acusações do presidente do Senado. O jornal está correto, como o jornalismo em geral, em noticiar o caso, revelado pela revista ‘Veja’.

Não há interesse público na vida afetiva do senador e de outros políticos. Há, porém, sobre a origem do dinheiro usado pelo presidente do Congresso para pagar pensão à mãe da filha que teve fora do casamento (ou seria pensão à filha?; o jornal não deixa claro).

A Folha deve seguir tão atenta às indagações que se mantêm no episódio não esclarecido como à preocupação de não expor a criança de menos de três anos de idade a holofotes dispensáveis, não recomendáveis e, às vezes, vetados por lei.

Navalha – Qual mulher?

O quadro ‘Perguntas sem respostas’, na primeira página, indaga: ‘Por que ele mesmo [Calheiros] não dava o dinheiro à mulher em vez de recorrer ao lobista da Mendes Júnior?’.

A jornalista Mônica Veloso, que o jornal tenha informado, não foi nem é a mulher do senador. Ela poderia ser chamada de qualquer modo, menos de ‘mulher’ (talvez o mais elegante fosse ‘mãe da filha’).

O mesmo quadro grafa ‘criançal’ no lugar de ‘criança’.

Chamada frustrante

De fato, às vezes algumas fotografias devem mesmo se impor na primeira página, mesmo que não haja maior importância do assunto (elas são escolhidas pelo aspecto estético ou inusitado). O que ocorreu hoje, contudo, é um exagero.

Texto-legenda de foto aberta em quatro colunas (‘Frente a frente’) mostra manifestação em uma cidade alemã. Chama para a pág. B7.

Em tal página, onde o leitor esperava encontrar informações que justificassem o destaque na primeira página, o jornal publica… novo texto-legenda, com as mesmas afirmações do TL da primeira.

A foto da capa, registre-se, não tem nada de especial.

Navalha – Velhos tempos

Não sei se seria o caso de publicá-la como a principal foto da edição, no alto da primeira página, como fez o ‘Estado’, mas é uma pena que os leitores da Folha não tenham visto a imagem de Renan Calheiros abraçando seu antigo aliado Fernando Collor de Mello.

Navalha – Painel cortado

A primeira e mais destacada mensagem do Painel do Leitor é a mensagem de assessor de imprensa do prefeito de Uberaba. Deveria estar em Brasil, com declarações entre aspas (e não como carta). No PL, usurpa um espaço que deveria ser dos leitores.

Erramos – Demora excessiva

No dia 11 de maio, o ombudsman encaminhou à Redação a mensagem de um leitor apontando erro em texto da véspera, ‘CET vai monitorar trânsito no entorno do estádio do Morumbi’. Em 14 de maio, enviei observação de outro leitor, sobre erro em reportagem do mesmo dia, ‘Cartel tinha anuidade e atuação global’.

As duas correções só foram publicadas hoje.

Não basta corrigir, é preciso ser mais rápido. O leitor não merece esperar tanto para receber a informação correta.

Navalha – Quórum

A reportagem ‘‘Todos os recursos foram meus’, diz senador’ (pág. A4) fala de ‘um plenário lotado em plena segunda-feira’, mas não informa se tamanha audiência é comum. Dá a entender que não, mas o leitor não é obrigado a saber. O jornal deveria ser mais claro.

Navalha – verba pública

A Folha publica na pág. A5 nota oficial do governo do Maranhão, devidamente identificada como ‘informe publicitário’. A nota merece atenção jornalística.

É legal e legítimo que o governador do Estado empregue dinheiro público para bancar nota que trata de defesa de pessoa física?

Como governador, Jackson Lago não poderia convocar entrevistas e usar outras formas de divulgação que não onerassem o Estado?

Quanto custou a nota publicada na Folha e no ‘Globo’? Saiu em outras publicações?

E em relação ao mérito da sua versão? O que o jornal tem a dizer aos leitores? O governador está certo ou apresenta contradições?

Navalha – Manual

Diz o ‘Manual da Redação’ (Publi*Folha*, 2001) no verbete ‘Regionalismo’ (págs. 96 e 97): ‘Evite palavras e expressões que tenham significado restrito a uma região ou que possam ter significados diversos em diferentes regiões do país’. Um exemplo de ‘regionalismo paulista’ elencado pelo ‘Manual’ é a palavra ‘holerite’, que deve ser substituída por ‘contracheque’.

Não é o que ocorre hoje na legenda de fac-símile na pág. A6, na qual se emprega ‘holerite’.

Navalha – Impedido?

A reportagem ‘Governistas falam em caso encerrado; oposição é cautelosa’ (pág. A6) informa que o corregedor do Senado, Romeu Tuma, afirmou: ‘Senti que ele [Calheiros] tem documentos que comprovam que falou a verdade’.

Tal declaração não pode resultar no impedimento de Tuma, firmando opinião antes de analisar o caso? O que outros senadores têm a dizer? Depois de tantas manifestações na semana passada sobre supostos ‘abusos’ da Polícia Federal, eles consideram natural o corregedor antecipar a posição antes de conhecer os documentos?

Navalha – PF, a pauteira

É bom que a Folha tenha informações exclusivas, como hoje (‘PF tem conversa de Renan com investigado por fraude’, pág. A8).

O problema é que, até agora, o jornal tem se limitado quase somente a disputar a primazia na divulgação das investigações da Polícia Federal (as reportagens sobre o suposto esquema na Prefeitura de Mauá são boa exceção).

Seria importante a Folha avançar, investindo em apuração autônoma. A ‘Veja’ deu um furo retumbante, sobre Renan Calheiros. O ‘Globo’ está em Alagoas investigando o patrimônio do senador.

Navalha – Diz-que-diz

Hoje obra de colecionadores, o ‘Manual da Redação’ de 1987 (leio a segunda edição, revista e ampliada) afirmava no verbete ‘Telefone’ (pág. 123): ‘Um trabalho jornalístico que puder ser bem realizado por telefone prescinde do contato pessoal entre o jornalista e a fonte de informação’.

Anti-jornalística e avessa à boa metodologia da reportagem, a orientação não sobreviveu nas edições seguintes. É claro que tudo que puder ser apurado em loco assim deve ser. O telefone apenas substitui mal a condição ideal de testemunha ocular.

O texto ‘Primo acusa senador de fazer manobra para ficar com fazendas’ (pág. A8) parece uma típica peça da reportagem por telefone. Reúne declarações, sem esclarecer quais as informações e versões corretas.

Em vez de buscar documentos e investigar as fazendas, o jornal se contenta com o declaratório. Ainda é tempo de viajar a Alagoas.

Navalha – Foto errada

O que faz a fotografia da ministra Dilma Rousseff acompanhando a reportagem ‘PF tem conversa de Renan com investigado por fraude’ (pág. A8)? Está certo que a ministra é citada, mas parece impróprio publicar sua imagem nesse espaço.

Navalha – Cifras contraditórias

O quadro ‘Atuação da Gautama’ (págs. A8 e A9) afirma que, ‘segundo a PF, o então ministro Silas Rondeau teria recebido R$ 100 mil […]’.

Já o texto ‘STJ intima governadores do Maranhão e de Alagoas’ (pág. A10) informa que ‘Rondeau saiu do ministério envolvido na investigação da PF pelo recebimento de R$ 10 mil em propina’.

Qual a informação correta: R$ 10 mil ou R$ 100 mil? Se uma está certa, a outra está errada.

Navalha – Lista contraditória

O mesmo quadro citado acima diz que ‘a PF tem lista de congressistas elaborada a partir de papéis apreendidos na Gautama, mas que ainda não foi revelada’.

Na pág. A10 se lê o texto intitulado ‘Lista de brindes da Gautama tem 225 nomes’.

Seria a tal ‘lista de congressistas’ ‘ainda não revelada’?

Em caso positivo, o quadro erra duas vezes ao falar em lista ‘ainda não revelada’. A revista ‘Carta Capital’ trouxe reportagem sobre o documento.

Navalha – No rastro das revistas

A Folha traz na pág. A9 o texto ‘Depois da Navalha, PF volta a investigar licitações na Bahia’. O assunto (a Operação Octopus) foi capa da revista ‘Isto é’.

A revelação sobre o ‘Caso Renan’ foi capa da Veja.

Na pág. A10, o texto ‘Lista de brindes da Gautama tem 225 nomes’ aborda furo de capa da revista ‘Carta Capital’.

O jornal faz bem em não esconder informações dos leitores, mas seria melhor que também produzisse mais furos próprios.

Navalha – A lista

Não entendi por que o jornal não ouviu o ‘outro lado’ com os políticos que supostamente seriam presenteados por brindes da empreiteira Gautama. É uma falha grave.

Também não entendi a ausência do nome de jornalistas que constariam da lista. A ‘Carta Capital’ publica o de dois. A Folha não os identificou? Ou não considera que eles sejam objeto de interesse jornalístico?

Navalha – Sem decisão

Ao contrário do que diz o título ‘Vice-presidente do STF decide manter preso dono da Gautama’ (pág. A6 da edição de ontem, segunda), o ministro Gilmar Mendes não havia tomado nenhuma decisão. Como informou a reportagem, o vice do Supremo ‘resolveu adiar a decisão sobre o habeas corpus para libertar o empresário Zuleido Veras’.

Uma coisa é não se pronunciar sobre habeas corpus, outra é decidir manter preso.

‘Previdência de Serra’

A aprovação pela Assembléia de SP do ‘principal projeto da reforma previdenciária do Estado’ não mereceu nem alto de página. A informação merecia não só mais destaque interno, como chamada na primeira página.

O que muda? O texto não explica, embora cite a ‘implantação de um gestor único de previdência’ (‘Previdência de Serra é aprovada; projetos devem reduzir benefícios’, pág. A11).

Se o placar foi de 62 a favor da proposta do governo a 26, quem votou contra? A reportagem só diz que ‘o PT informou que votará com o governo’, referência a dois projetos complementares. É preciso buscar outras coberturas para entender o embate de ontem.

Parece estranho tratar deputados originários da Polícia Militar como ‘militares’. Eles são ‘policiais militares’. ‘Militares’ são os integrantes das Forças Armadas.

O leitor não foi informado sobre os argumentos a favor e contra o projeto aprovado ontem.

Papel sobrando

Título de Dinheiro (pág. B7): ‘Na Itália, Dilma vai discutir trem-bala para ligar SP a Rio’.

Título de Cotidiano (pág. C7): ‘União anuncia edital para trem-bala de SP ao Rio’.

Os textos tratam do mesmo assunto e repetem informações.

Juridiquês

O leitor da Folha segue a receber informações com terminologia jurídica que ele não é obrigado a conhecer.

Um exemplo é o texto ‘Pai que esqueceu bebê em carro é denunciado por homicídio’ (pág. C6).

O que é ‘homicídio culposo’. É sem intenção? Por que não explicar?

O que é ‘suspensão condicional do processo’? É o contrário de ‘suspensão incondicional’?

O texto publica trechos da acusação e afirma não ter encontrado o pai. O pai não tem advogado? Quem o defende no processo? A Folha procurou o representante do acusado? Se procurou e não encontrou, deveria ter informado. Ouvir ‘especialista’ em defesa não basta.

Acabou a greve?

A cobertura sobre a mobilização nas universidades estaduais paulistas não informa se ainda há greve de parte dos estudantes, funcionários e professores. Hoje, parece que o confronto se resume à ocupação da reitoria da USP e da vice-diretoria da Unesp em Franca.

Se há greve, quantos estão parados? Qual o total de membros das três categorias? Os estudantes não têm 17 reivindicações? Só uma foi discutida ontem com o secretário da Justiça?

A reportagem afirma que mil estudantes se reuniram em assembléia. Quem disse? O repórter contou? Ou o número é dos organizadores? Se for, é preciso relatar.

A propósito, quantos alunos a USP têm? Mil representam uma fração pequena ou grande do total?

Se ‘os alunos afirmaram que os decretos do governador José Serra (PSDB) contêm outras inconstitucionalidades’, quais são elas?

Os leitores da Folha receberam informações insuficientes para saber como estava a situação ontem na USP, na Unicamp e na Unesp.

Numeralha

Não há por que duvidar de que haja estudantes demais para espaço de menos em prédio que ‘abriga os departamentos de Geografia e História da USP’.

Mas é difícil aceitar tal passagem: ‘Alunos ainda relatam que têm de ficar espremidos nas salas. São apenas 22 classes para acomodar 2.300 alunos, média de 104 alunos por sala’.

A reportagem aceita passivamente tal raciocínio.

Para ele ser verdadeiro, todos os alunos deveriam estar lá ao mesmo tempo, todas as aulas deveriam ocorrer simultaneamente, os professores precisariam se dividir entre turmas (no caso dos que dão aulas para mais de uma).

Ou seja: a média é uma invenção aritmética com propósito político. O jornal não deveria se submeter a ela.

Sugestão: acompanhar a aula para 120 alunos, relatada por um professor. É possível que exista. Tal absurdo a concentração de tanta gente merece ser exposto pela Folha.

Greve federal

O jornal não informa (‘Servidores das federais iniciam paralisação’, pág. C8) a dimensão da greve.

Nem a avaliação dos grevistas sobre a adesão, nem a do governo, nem apuração própria.

Dobradinha

A Folha acertou ontem em destacar, na cobertura do GP de Mônaco da Fórmula 1, a controvérsia sobre a possível intervenção da Mc Laren na colocação de seus dois pilotos. As suítes da concorrência hoje mostram a correção do jornal, que secundarizou o declaratório dos pilotos.

Campus – Data errada

A cronologia ‘Entenda o caso’ (pág. C2 da edição de sábado) parece ter um erro: não faz sentido a data 1º de janeiro como o dia em que ‘reitores reclamam e Serra tira Pinotti da presidência do Cruesp’. Se as outras datas da cronologia estiverem certas, o mais provável é que, em vez de 1º de janeiro, o correto seja 1º de março.

Agenda

Participo hoje a partir das 16h do seminário ‘O jornalismo investigativo e a história recente do país’. A promoção é do CPDOC, no auditório da FGV no centro do Rio.’