O debate acerca da classificação indicativa do Ministério da Justiça, informando a faixa etária recomendada para recepção de dados conteúdos culturais, poderia tornar-se uma importante oportunidade para a sociedade discutir seriamente os processos midiáticos. No entanto, mais uma vez a questão não tem sido apresentada pelos meios de comunicação em toda a sua complexidade, como um tema que envolve, no mínimo, dois lados, duas concepções de mundo. A Rede Globo vem se destacando na distorção dos fatos, apresentando-os, na essência, como censura, notadamente em espaços como o Fantástico e o Programa do Jô, o que confunde o telespectador e nada esclarece.
Comparar censura e controle público da mídia (ínfimo, diga-se de passagem) é uma confusão proposital provocada pelas indústrias culturais, que, para isso, não têm poupado esforços em justapor fases históricas e motivações diferentes em uma mesma edição, comparando o momento atual, de plenitude democrática, com períodos de exceção, como o da longa ditadura militar brasileira, a qual, por sinal, teve o apoio da mídia hegemônica.
O direito da sociedade, através do Estado, analisar e classificar o que vai assistir, visando a proteger especialmente a infância, tem como mote o interesse público. Esse procedimento em muito diverge de uma censura estabelecida para a perpetuação de uma elite no poder, tendo em vista interesses privados, como ocorreu no passado recente brasileiro ou via de regra acontece nas decisões corporativas (atuais e pretéritas).
Por que autoridades e profissionais do Ministério da Justiça pouco têm sido procurados pela mídia para aprofundar o assunto? É de se ressaltar que a regra mais básica do jornalismo consiste em ouvir todas as partes, isto é, todos os lados envolvidos na história. As emissoras de televisão ocupam um grande papel na sociedade contemporânea, tanto na divulgação e apuração de problemas nacionais, quanto na educação e formação de valores sócio-culturais, constituindo a principal fonte de informação e sociabilidade para a maioria da população. Uma função de tamanho destaque social deve ser praticada com responsabilidade superior e nível de controle maior do que aquele fortemente exercido pelas famílias que dominam tais negócios.
Visão única
Quando um tema é abordado por um meio, provoca uma reflexão no telespectador, sendo aí que começa o problema central. Ao deparar com tais mensagens, o telespectador agrega apenas dados e informações de um lado da história, relacionando as informações veiculadas às suas próprias mediações, é claro, mas num jogo em que é determinante o posicionamento da emissora, que logicamente tem interesses próprios em disputa. Por isso, a necessidade de haver uma maior responsabilidade na informação noticiada, pois, embora não haja uma influência direta, certamente os elementos fornecidos pela mídia são decisivos para a formação da convicção do público, pois de outra forma este não tem acesso à realidade social.
Desta forma, é equivocada a postura das grandes emissoras, em especial a Rede Globo, pois tratam a midiatização como assunto privado, sobre o qual caberia só a seus proprietários decidir o que veicular e aos sujeitos adultos, individualmente, o que assistir. A TV dita moda e comportamento, ao mesmo tempo em que destrói valores e cria estereótipos.
O tema classificação indicativa é de tal grandeza que deveria receber um tratamento específico, uma abordagem séria em programas como Globo Repórter ou SBT Realidade. Ao contrário, tem prevalecido a desinformação. Se há censura, não é oficial, mas de muitas organizações midiáticas, que desinformam seu público ao reduzirem os fenômenos à sua própria visão, pelo menos naquilo que consideram prioritário e não abrem mão de editorializar.
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Respectivamente, professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos e doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela UFBA; e graduando em Comunicação Social – Jornalismo pela Unisinos, RS