Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Política de concessões de radiodifusão
deve ser revista com urgência

Para evitar que os chavecos e chavões do chavismo contaminem o processo brasileiro é indispensável uma ação imediata de todos os interessados em preservar nossas conquistas democráticas. Isso significa, em primeiro lugar, uma avaliação minuciosa do que seja a ‘democracia deles’ (expressão utilizada pelo presidente Lula para designar o regime venezuelano na entrevista a Clóvis Rossi – Folha de S.Paulo, 8/6).


E a ‘democracia deles’, de acordo com a Lei de Responsabilidade Social em Rádio e TV da República Bolivariana da Venezuela (de 7/11/2004), prevê uma sucessão progressiva de sanções – advertências, suspensão da programação por 72 horas e em caso de reincidências, embargo do canal pelo prazo de cinco anos – antes da suspensão final da concessão.


O ato de Chávez contra a RCTV, apesar das afirmações peremptórias sobre a sua legalidade, não obedeceu à legislação do seu país: foi discricionário, autoritário e antidemocrático.


Mas este é um problema venezuelano. O nosso problema é mais simples: precisamos efetivar o espírito democrático da nossa legislação no tocante à comunicação social. Sobretudo no terreno das concessões.


Sem autoridade


No Brasil, pelo menos teoricamente, um caudilho ou um partido caudilhesco inspirado por Chávez seriam impedidos de cassar ou não renovar uma concessão para rádio ou TV. O ato emanado do Executivo teria que ser examinado pelo Congresso Nacional e aprovado por dois quintos dos legisladores em votação nominal (Constituição Federal, artigo 223, parágrafos de 1 a 5).


Antes disso, o Congresso teria que ouvir, na condição de órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Social – conforme está indicado no Artigo 224.


E aqui começam nossas aflições e vexames: não temos um Conselho de Comunicação Social. Criado com 14 anos de atraso depois de promulgada a Constituição, nosso CCS teve vida efêmera: funcionou razoavelmente de junho de 2002 a fevereiro de 2005 sob a presidência do jurista José Paulo Cavalcanti Filho, um dos mais respeitados especialistas brasileiros em matéria de legislação de mídia.


Em seguida, como não poderia ser dissolvido, por determinação de José Sarney, então presidente do Senado, o CCS foi mumificado. Entregue desde então ao ‘imortal’ Arnaldo Niskier, é hoje um arremedo do que foi, burla ostensiva ao espírito da lei que o criou – não serve ao Congresso, não serve à sociedade, não serve aos meios de comunicação e, o pior, não serve à democracia. Não tem autoridade técnica para esclarecer dúvidas, não tem credibilidade para subsidiar a tomada de decisões. Sobretudo no tocante às concessões.


Terra de ninguém


Em matéria de radiodifusão, o poder moderador do Congresso Nacional está hoje completamente desmoralizado. Quando se verifica (como o fez este Observatório da Imprensa depois de exaustivo cruzamento de dados) que grande parte dos parlamentares brasileiros é beneficiária do sistema de concessões que deveria fiscalizar, escancara-se um descomunal conflito de interesses, bandalheira de proporções federais que só uma navalhada da Polícia Federal poderia desarticular [ver ‘Para acabar com a farra das concessões a parlamentares‘ e ‘Representação do Projor à Procuradoria Geral da República‘].


O caso do juiz federal de Goiás que decidiu proibir novas concessões de TVs educativas sem licitação [ver abaixo] desvenda o grau de desinformação, dá uma idéia do apagão jurídico e institucional que torna a nossa democracia tão vulnerável e ineficaz quanto a venezuelana.


Os eventuais pretextos para chavecadas e chavismos estão nesta terra de ninguém eletrônica, implantada à margem da lei e da moralidade, no coração do Congresso Nacional.


Leia também


G-5, G-8, G-20 e G-Chávez – A.D.


Renovação e cancelamento de concessões de radiodifusão – Venício A. de Lima


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Justiça veta concessão de TV educativa sem licitação


Elvira Lobato # copyright Folha de S.Paulo, 7/6/2007


Um juiz federal de Goiás, em decisão inédita, proibiu o governo de expedir novas concessões de TVs educativas sem licitação para escolher o beneficiado e de renovar sem licitação as concessões já existentes. A União recorreu ao Tribunal Regional Federal de Brasília, suspendendo o efeito da sentença até que o recurso seja julgado.


No entendimento do juiz Jesus Crisóstomo de Almeida, da 2ª Vara Federal de Goiás, o decreto-lei 236/67, no qual o governo se baseia para não fazer licitações, é inconstitucional, e não há transparência na distribuição das concessões.


As emissoras foram duplamente surpreendidas, porque a sentença é de abril de 2006 e só agora está chegando ao conhecimento do setor. Cento e setenta fundações, universidades e órgãos da administração pública direta e indireta (entre elas a Radiobrás, a TV Cultura de São Paulo e o Canal Futura) que obtiveram concessões sem licitação foram notificadas para se defender no processo via edital publicado no ‘Diário de Justiça de Goiás’. Por isso quase nenhuma soube da ação.


A gerente geral do Canal Futura, Lúcia Araújo, diz que soube da sentença há dois meses, porque o Ministério das Comunicações suspendeu a assinatura dos contratos de concessão de TV de sete fundações ligadas da universidades que integrariam sua rede de afiliadas: ‘Ficamos perplexos’. A Fundação Padre Anchieta, que mantém a TV Cultura, diz que não sabia da existência do processo até ser informada pela Folha.


Algumas fundações pediram anulação da sentença alegando que tiveram o direito de defesa cerceado, mas há consenso nas emissoras e no governo de que é preciso mudar a legislação sobre a radiodifusão, com a redefinição dos critérios para concessão das outorgas que dê transparência à seleção.


A ação começou em 2003, quando o Ministério Público Federal pediu a anulação da outorga do canal 5, de Goiânia, à Fundação Ministério Comunidade Cristã, de evangélicos. O canal tinha sido pleiteado pela Universidade Federal Goiás e por mais três candidatos. O procurador Luciano Gomes Rolim alegou na ação que a legislação não estabelece critérios para a distribuição de concessões e que a escolha do beneficiado é decisão pessoal do ministro das Comunicações.


Em 2005, o Ministério Público Federal de Brasília entrou com uma ação civil pública, ampliando os efeitos da primeira e pedindo a proibição de novas outorgas de radiodifusão educativas e da renovação das atuais sem licitação pública.


Para a gerente geral do Canal Futura, Lúcia Araújo, é preciso um debate nacional sobre os critérios de concessão.


O presidente da Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais, Jorge Cunha Lima, diz que as TVs educativas não estão previstas na Constituição e que não há regulamentação sobre as TVs públicas e estatais: ‘Vivemos num momento sem lei’.


 


Ministro é a favor de licitação para nova concessão


Copyright Folha de S.Paulo, 7/6/2007


O ministro das Comunicações, Hélio Costa, disse à Folha que é favorável à realização de licitação pública para as novas concessões de televisão educativa, mas que é contrário à licitação para renovação das concessões já existentes. ‘Isso é brincar com direitos adquiridos’, afirmou o ministro.


Costa disse que só tem autorizado concessões novas para fundações ligadas universidades de ensino público e que a paralisação de pedidos apontada por emissoras não se deve à ação judicial de Goiás.


Segundo Costa, as concessões dadas sem licitação pública foram amparadas no decreto 236, de 1967, segundo o qual ‘a outorga de canais para televisão educativa não dependerá de publicação de edital’ e em um outro decreto, de 1963. ‘Quem tem de resolver essa questão é o Congresso’, disse.


Disse que, enquanto uma nova legislação de radiodifusão não for aprovada, o governo poderia adotar para as novas concessões de TV educativa o critério usado para aprovação de rádios comunitários. No caso, segundo ele, é publicado um edital dando prazo de 60 dias para que os interessados apresentem seus projetos, e vence a melhor proposta educativa. (E.L.)