Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Quando duas nuvens se chocam

A colisão entre duas nuvens é uma coisa delicada – exceto, é claro, nos céus digitais da indústria tecnológica. Mas essa colisão virtual é a melhor imagem para se reter quando se tenta compreender por que a Microsoft – a maior empresa de softwares do mundo – ofereceu a formidável cifra de 44,6 bilhões de dólares pela Yahoo!, um desconfortável gigante do mundo eletrônico. À medida que a computação eletrônica se desenvolve, as fontes de poder e de dinheiro serão, cada vez mais, enormes ‘nuvens computadorizadas’, como as chamam os conhecedores, hospedadas na internet. O negócio do Yahoo! é, antes de tudo, uma tentativa de inflar a nuvem da Microsoft de forma a que ela possa, enfim, enfrentar seus mais perigoso rival, o Google.

Na realidade, a fusão – que seria a maior na indústria da internet desde a desafortunada união da AOL com a Time Warner, em 2000 – está longe de ter sido concretizada. Na hora que esta edição do Economist ia para a gráfica, o Yahoo! ainda tinha que dar uma resposta formal à oferta –e não, apenas dizer que a estava avaliando. Na verdade, consta que sua administração, que recusou propostas anteriores da Microsoft, estaria estudando alternativas à venda, inclusive as de vender algumas unidades e até a possibilidade de uma aliança com o Google. Uma outra proposta é possível, mas até agora ninguém parece querer entrar numa guerra de preços com a todo-poderosa Microsoft; sua oferta eleva os preços das ações do Yahoo! para 31 dólares cada uma, o que significa um aumento de 61% no preço do fechamento da Bolsa antes que a oferta da Microsoft fosse tornada pública. E ainda há a inevitável questão do recurso judicial anti-truste, que promete ser longa – principalmente na Europa.

Um exército de engenheiros

Caso a Microsoft consiga engolir o Yahoo!, corre o risco de passar por um sério e indigesto mal-estar pós-fusão, como ocorreu com a AOL e Time Warner. (Ainda esta semana, o novo chefão da Time Warner, Jeff Bewkes, disse que planejava tirar do ar o decrescente serviço de provedor de internet da AOL.) A Microsoft terá que combinar ou eliminar produtos e serviços coincidentes. E também existirão problemas culturais a ser superados. O Yahoo! é uma empresa de comunicação online que se orgulha de sua característica de diversão e se consolidou usando uma tecnologia open-source, enquanto a Microsoft atrai maníacos em eletrônica e ganha dinheiro com softwares pagos. Portanto, a combinação da infra-estrutura tecnológica das duas empresas pode vir a ser problemática, no sentido de aumentar o faturamento.

Uma vez que a Microsoft sabe de tudo isto, o fato de que ainda queira comprar o Yahoo! não passa de um reconhecimento de que precisa ajuda para acompanhar o Google. Embora este seja mais conhecido por seu mecanismo de busca, também é a primeira empresa a construir uma imensa nuvem de computação – um complexo de hardware, software, informação e pessoas que fornece serviços online. Nos imensos bancos de dados do Google – o equivalente, em computação, a usinas de energia elétrica – centenas de milhares de máquinas estão inteligentemente interconectadas para agir como uma única. O Google coleta uma enormidade de dados de seus usuários e da própria internet. E empregou um exército de engenheiros brilhantes que planejam novos serviços a partir desses recursos.

Publicidade online

E, acima de tudo, o Google bolou uma maneira de ganhar dinheiro a partir dessa sua nuvem. Ao fornecer seus serviços gratuitamente, a empresa cria bastante espaço para uma publicidade dirigida, principalmente na forma de pequenos textos relacionados às perguntas para as quais os usuários procuram informação. Os anunciantes só pagam se os usuários clicarem em seus anúncios. Dessa maneira, o Google criou um engenhoso ciclo. Como maior mecanismo de busca, o Google atrai mais anunciantes e pode oferecer mais anúncios relevantes. Isto, por sua vez, atrai mais usuários e anunciantes etc. etc.

Nos últimos anos, a Microsoft tentou criar uma nuvem semelhante. Vem investindo pesado em infra-estrutura e construiu centros de informação pelo mundo todo. Também vem tentando acompanhar os serviços fornecidos pelo Google, principalmente de busca na internet. Recentemente, fortaleceu sua posição em publicidade eletrônica (display advertising), um item do mercado de publicidade online menor que o dos anúncios nos mecanismos de busca, mas que se espera que cresça rapidamente. Em maio de 2007, a Microsoft comprou aQuantive, uma agência de publicidade online, depois que o Google concordou em comprar a DoubleClick, líder em publicidade eletrônica.

Apesar disso, os resultados ainda são poucos. Em termos de mecanismos de busca, por exemplo, a parcela da Microsoft no mercado mundial era de 2,9% em dezembro de 2007, segundo a comScore, uma empresa de pesquisas de mercado, enquanto a do Google era de 62,4% e a do Yahoo!, de 12,8%. Os negócios online da Microsoft ainda não são lucrativos. O que mais preocupa a direção da empresa, no entanto, é que o Google está ganhando espaço na publicidade online e pode rapidamente vir a controlar esse mercado fundamental, principalmente quando a aquisição da DoubleClick se concretizar. Apesar de um duríssimo lobby feito pela Microsoft, as agências reguladoras norte-americanas aprovaram o negócio e suas colegas européias deverão rapidamente acompanhá-las.

Ameaça às inovações

Ironicamente, a Microsoft argumenta que o Google se beneficiará da mesma vantagem que, desde há tanto tempo, vem tornando praticamente impossível a qualquer empresa competir com o sistema operacional Windows – argumento que teve um papel importante em ações antitruste bem-sucedidas contra o gigante de software. É tanto o software escrito para o sistema Windows que se torna difícil para outros sistemas operacionais entrar no mercado. Da mesma forma, se forem muitos os anunciantes que adotarem a plataforma online do Google, os concorrentes não conseguirão ‘criar um desafio competitivo confiável’, como consta de um documento interno da Microsoft.

Não conseguindo evitar que a DoubleClick caísse nas garras do Google, agora a Microsoft espera que o Yahoo! a ajude a deixar de comer poeira. Se for bem-sucedida, a fusão irá expandir a nuvem da Microsoft, embora não às proporções do Google. Os websites das duas empresas iriam atrair conjuntamente mais de 290 milhões de visitas únicas por mês nos Estados Unidos – um pouco mais que o Google, segundo a Nielsen Online, outra empresa de pesquisa de mercado. Entretanto, a Microsoft-Yahoo! teria uma parcela de apenas 18% do mercado de publicidade eletrônica (display), segundo o banco de investimentos Oppenheimer.

A fusão, no entanto, daria maior influência à Microsoft em outras áreas. Uma delas é o e-mail na internet, que, com a fusão, abocanharia 80% do mercado norte-americano. Também teria o domínio na área de mensagens instantâneas. Como o Yahoo! também oferece muitos outros serviços, como o Flickr, um site de compartilhar fotos, a Microsoft teria o controle da maior lista do mundo de usuários de internet registrados – um recurso fundamental para desenvolver novos serviços em sua nuvem.

Entretanto, o negócio também pode ser auspicioso para o Google – pelo menos, no curto prazo. É quase certo que o Google tentará atrair os melhores quadros do Yahoo!. O esforço para concretizar o negócio irá distrair a direção da Microsoft, além de levar certo tempo. O Google já lançou uma campanha para bloquear a fusão, argumentando que esta iria afetar as inovações na internet – embora nem a Microsoft, nem o Yahoo!, tenham feito grandes inovações recentemente. Na realidade, quanto mais o Google se queixar das ameaças às inovações – ao invés de simplesmente realizá-las –, mais soa como soava a Microsoft.