No dia 16 de junho, registrei em meu blog:
A TV Globo bate, a revista Época bate, o jornal O Globo bate, a CBN bate. Ou seja, as Organizações Globo parecem ter sido contrariadas por alguma decisão de Renan Calheiros, o presidente do Senado Federal. Sempre tiveram uma relação profícua, mas agora a coisa desandou. Não, não estou dizendo que Renan seja um santo. Nem mesmo estou dizendo que suas relações com lobistas devem ser esquecidas. Minha questão é de outra ordem: por que só agora isso veio à tona? Ou alguém acha que só agora foram descobertas as relações de Renan com Mônica e desses com o lobista? Teria alguma coisa a ver com o período de renovações de concessões de radiodifusão? Pergunta-se aos caríssimos leitores: qual será o pomo da discórdia?
No dia seguinte, a coluna ‘Toda Mídia’, da Folha de S. Paulo, registrou meu comentário. Neste final de semana, chega às bancas a revista Veja com Renan Calheiros na capa, sentado sobre uma laranja de onde saem uma cédula de 100 dólares e outra de 100 reais. Sobre seu ombro, um microfone. Título: ‘Mais laranjas de Renan – Como o senador se tornou o dono oculto de duas rádios em Alagoas. Ele pagou 1,3 milhão em dinheiro vivo’.
Lá dentro, na página 63: ‘A sociedade secreta de Renan Calheiros e João Lyra era ambiciosa. Usando a influência política que tinha no governo federal, Renan planejou montar uma rede de emissoras espalhadas por Alagoas a partir das outorgas de concessões públicas que suas relações conseguiriam garimpar em Brasília.’ Uma das empresas, segundo Veja, seria a Rádio Correio, cujo logotipo aparece, numa foto da reportagem, colado no logotipo da CBN, que pertence às Organizações Globo – fato solenemente omitido pela reportagem.
O oligopólio das TVs e rádio
Não creio na revista Veja, assim como não acredito que a relação de Renan Calheiros com grupos de comunicação só agora tenha se tornado novidade para o reportariado de Brasília. Até porque, como vem denunciando sistematicamente o professor Venício Lima, há dezenas (ou centenas) de políticos em situação similar [ver, neste Observatório, ‘Concessionários de radiodifusão no Congresso Nacional: ilegalidade e impedimento‘, ‘Rádios comunitárias – O coronelismo eletrônico de novo tipo (1999-2004)‘ e outras remissões abaixo]. Mas eis que, depois de bater durante meses no senador Renan Calheiros, a Veja – com o imediato apoio do Jornal Nacional deste sábado – resolve esclarecer que o incômodo são as empresas de comunicação. Sim, sim… Empresas de comunicação costumam ser usadas para vencer eleições, pressionar governos e influenciar em quase tudo nessa vida, desde negociatas contra o patrimônio público até a sexualidade das virgens.
Uma consulta à página da CBN revela que o grupo possui quatro emissoras próprias (Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Brasília) e 22 afiliadas, sendo que em Maceió a CBN opera a concessão do Sistema Costa Dourada de Radiodifusão Ltda., na freqüência 104,5 FM. Entretanto, a página da Anatel aponta a existência de apenas cinco emissoras comerciais de rádio FM em Maceió (Alagoas Rádio e Televisão, Rádio Clube de Alagoas, Rádio Cultura de Arapiraca, Rádio Jornal de Hoje e TV Pajucara) – nenhuma delas, portanto, a afiliada indicada pela CBN em sua página. À exceção da Alagoas Rádio e Televisão, acusada pelo Ministério Público de pertencer a políticos e cuja licença expira no ano que vem, todas as outras encontram-se com suas outorgas vencidas, segundo a Anatel.
Tudo muito nebuloso, como já sabemos, nesse mundo das concessões públicas de radiodifusão. Mas, pelo menos, uma coisa ficou clara: o medo da dupla Veja–Globo é mesmo ter um presidente do Congresso em que eles não confiam envolvido numa disputa pelo controle de empresas de comunicação. Isso porque no próximo dia 5 de outubro serão avaliadas, no Congresso Nacional, as renovações das concessões públicas do oligopólio que controla a televisão e o rádio no Brasil. Estão com tanto medo, mas tanto medo, que até se arriscaram a mostrar como acontecem as negociatas entre políticos e empresas de comunicação, um assunto tabu para a dupla, mesmo porque seus interesses nesse tipo de esquema não são poucos.
Por tudo isso, precisamos nos organizar para pressionar nossos representantes em Brasília, desde telefonemas e mensagens eletrônicas até manifestações de rua. E não podemos perder a chance, porque essa renovação é mais demorada que o cometa Halley: acontece uma vez a cada 15 anos.
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Jornalista, editor do FazendoMedia