Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Costa Rica: Sob o termômetro eleitoral latino-americano

(Foto: PIXNIO)

Em 6 de fevereiro de 2022, os costarriquenhos votaram para eleger o seu próximo presidente e os seus deputados. Uma democracia tranquila, acostumada a ver dois grandes partidos lutando um contra o outro a cada eleição, vivenciou uma alta taxa de abstenção e uma mudança real nos resultados. Quais são as razões para esta mudança? 

Em 6 de fevereiro de 2022, três milhões e quinhentos mil costarriquenhos foram convidados a eleger um Presidente da República e cinquenta e sete deputados. No final do dia, não havia nada particularmente perturbador a comunicar. Os 6.767 postos de votação foram abertos e fechados no horário estabelecido por lei. A Costa Rica, segundo uma fórmula dessas de guia turístico transformada em ditado político popular, não é a “Suíça da América Latina”? E mais, uma Suíça democrática, misturada com uma Suíça “verde”?

Os lugares-comuns têm sempre um fundo de verdade. Entretanto, desta vez, muitos fatores perturbaram essa sua imagem idílica “verde”. A Costa Rica ainda é a Suíça tropical tão alardeada em brochuras para os amantes de borboletas e beija-flores das latitudes Norte?

O currículo democrático da Costa Rica é exemplar, atípico na América Latina. Há muito tempo a Costa Rica respeita ao pé da letra o calendário de votação. Ela vive ao ritmo de uma social-democracia de inspiração escandinava. O sistema de proteção social e o fundo nacional de apoio aos pequenos produtores de café são uma prova disso. Como um país pacifista, a Costa Rica aboliu as suas forças armadas. Durante anos, um partido reformista, o PLN (Partido da Libertação Nacional) competiu pelo poder com um partido democrata cristão rival, o PUSC (Partido da Unidade Social Cristã).

De um mandato a outro, as coisas seguiram o padrão previsível de uma democracia tranquila. Mas em 6 de fevereiro de 2022, a cortina eleitoral se abriu e mostrou uma cena incomum. Muitos eleitores evitaram as urnas. A taxa de abstinência subiu expressivamente. Era de 34,3% em 2018 e atingiu 40% em 6 de fevereiro de 2022. Além dos dois candidatos, representando os partidos tradicionais, havia outros 23 com uma ampla gama de perfis partidários e religiosos. Haverá um segundo turno de votação em 3 de abril, já que os votos foram divididos entre os 25 candidatos. Este segundo turno irá opor José María Figueres Olsen, representando o PLN, e Rodrigo Alberto Chaves Robles, um ex-funcionário do Banco Mundial, cujo partido era anteriormente confidencial. O PPSD (Partido do Progresso Social Democrata), seu partido, fundado em 2018, não tinha um deputado. O presidente eleito em 3 de abril não terá maioria parlamentar, seja ele PLN ou PPSD. O PLN obteve 18 cadeiras em 57 e o PPSD, 9. Finalmente, como um fator dissonante adicional, os candidatos do PAC (Partido da Ação Cidadã), partido que deixará a presidência da República assim como a liderança no Congresso, foram todos, sem exceção, vencidos. Os candidatos pelo PAC obtiveram menos de 1% dos votos válidos.

Quem poderia ter arranhado o disco eleitoral que parecia estar rodando em ordem? Como podemos entender esta saída da rota de um sistema político aparentemente saudável? Um olhar sobre o contexto econômico e social desta eleição talvez possa fornecer algumas explicações. Ele tem perpetuado suas virtudes sociais e suas capacidades produtivas? Ou também entrou em uma fase de rendimentos decrescentes? Esta segunda hipótese impôs suas asperidades e restrições. O ar econômico já amortecido pela situação internacional foi brutalmente resfriado pela pandemia de Covid-19. No final de janeiro, o país de 5 milhões de habitantes estava registrando mais de 7.000 pessoas infectadas por dia. O turismo, que havia se tornado um setor chave, entrou em colapso. Os fluxos de entrada de dinheiro diminuíram em 60% em 2020, e com eles o crescimento, que caiu 4,5% em 2020. Esta situação desfavorável causou um choque social. No final de 2021, mais de 23% dos costarriquenhos viviam abaixo da linha de pobreza. A taxa de desemprego absoluto era de 14,4%. Em tal clima, é difícil não ver as razões subjacentes ao colapso do sistema político e eleitoral. Uma pesquisa realizada pela Universidade da Costa Rica no final de 2021 mostrou que a população considerava o desemprego (32,8% dos entrevistados) e o custo de vida (19,6%) como as principais preocupações. [2]

Em 6 de fevereiro de 2022, a situação é clara. A Costa Rica votou como a maioria dos outros países latino-americanos que foram às urnas nos últimos meses. De uma eleição para a outra, despedem-se os candidatos e eleitos tradicionais. O mesmo aconteceu na Argentina (duas vezes e cada uma delas atingiu partidos opostos), na Bolívia, Chile, Equador, Honduras, México, Peru, República Dominicana, El Salvador e Uruguai. Tudo isso sugere que o mesmo pode acontecer dentro de alguns meses na Colômbia e no Brasil. A Costa Rica, como seus vizinhos mais ou menos próximos da América Latina, tem sido duramente atingida, econômica e socialmente. Os eleitores costarriquenhos, como os argentinos e tantos outros estão reagindo da mesma forma, votando contra os titulares e os partidos que pareciam ser os mais bem colocados.

A América Latina, como lemos aqui e ali, entrou, de fato, em um novo ciclo, o do degagismo[2].

Notas 

 [1] Pesquisa do CIEP (Centro de Pesquisa e Estudos Políticos) da Universidade da Costa Rica, publicada em 1º de setembro de 2021.

[2] Neologismo francês que significa ‘expulsão’, ‘saída forçada’, que no contexto eleitoral explica a rejeição nas urnas da classe política tradicional.

Texto publicado originalmente em francês, em 14 de fevereiro de 2022, na seção ‘Actualités, Amérique Latine’ do site Nouveaux Espaces Latinos, Paris/França, com o título original: “Costa Rica: sur le thermomètre électoral latino-américain”. Tradução de Jeniffer Aparecida Pereira da Silva e Luzmara Curcino.

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Jean-Jacques Kourliandsky – É diretor do Observatório da América Latina junto ao IRIS – Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas, com sede em Paris, e responsável pela cobertura e análise conjuntural geopolítica da América Latina e Caribe. É formado em Ciências Políticas pelo Instituto de Estudos Políticos de Bordeaux e Doutor em História Contemporânea pela Universidade de Bordeaux III. Atua como observador internacional junto às fundações Friedrich Ebert e Jean-Jaurès. É autor, entre outros, do livro “Amérique Latine: Insubordinations émergentes” (2014), e colabora frequentemente com o Observatório da Imprensa, em parceria com LIRE – Laboratório de Estudos da Leitura e com o LABOR – Laboratório de Estudos do Discurso, ambos com sede na UFSCar-Universidade Federal de São Carlos.