Depois de O caso Pimenta Neves – Uma reportagem, de Luiz Octavio de Lima, lançado em março passado, está prestes a ganhar mais uma obra a história de Antonio Pimenta Neves, ex-diretor de Redação do Estadão, assassino confesso de sua ex-namorada Sandra Gomide, em agosto de 2000. À queima-roupa – O caso Pimenta Neves (LeYa), do editor da revista Alfa Vicente Vilardaga, busca desmontar o cenário de glamour construído em torno da imprensa brasileira e mostra como um diretor de Redação tornou-se um homem megalomaníaco e violento sem ter sido freado por seus superiores. O autor, que trabalhou com os dois protagonistas do caso na época da Gazeta Mercantil, e entrevistou Pimenta para o livro em 2009, define sua obra como um “thriller corporativo”, por questionar a falta de governança do Grupo Estado e da extinta Gazeta Mercantil, que teriam permitido atitudes pouco convencionais do jornalista.
“Por que decisões irracionais de Pimenta nunca foram questionadas? Até que ponto as redações ficaram à mercê dos desmandos de homens perturbados psicologicamente? Profissionais com excelentes currículos estão acima de qualquer suspeita? Por que não foi aceito o pedido de demissão feito por ele no Estadão, quando dava sinais visíveis de perturbação mental, 22 dias antes de cometer o assassinato? Por que não se combatia o nepotismo nas redações?”, são alguns dos questionamentos que o autor faz no livro.
Em entrevista a J&Cia, Vilardaga adianta alguns detalhes da obra, que deverá chegar ao mercado em julho:
Sua obra sai quase na mesma época em que outro livro sobre o caso é lançado. Qual principal diferença de abordagem de seu trabalho?
Vicente Vilardaga – Procurei traçar uma narrativa sobre a história ambientada nas redações, que vai de 1995, na Gazeta Mercantil, até 2000. O que interessou para mim foram os acontecimentos ligados à vida profissional e não pessoal dos envolvidos.
Como você aborda o papel das empresas por onde ele passou nesses anos em que atuou ao lado da Sandra?
V.V. – As redações da Gazeta Mercantil e do Estadão foram muito permissivas com o Pimenta Neves, tanto que autorizaram que ele desse promoções sucessivas para a Sandra. Em empresas que têm governança corporativa isso é impossível. A Gazeta faliu e entre os motivos de sua quebra foi não ter uma política de RH decente. Infelizmente, as empresas jornalísticas apresentam uma série de contrassensos, vigiando casos de nepotismo no serviço público mas sem estabelecer limites dentro de sua própria casa.
Você acha que esse tipo de história, sem necessariamente ter o mesmo fim, pode se repetir nos dias de hoje?
V.V. – Acredito que o caso do Pimenta representa o colapso do modelo de funcionamento das redações. Não por acaso ele era discípulo do Cláudio Abramo, que apesar de bastante organizado e competente, muitas vezes tinha métodos no trato com as pessoas que não eram tão convencionais. Acho que esse caso significa o fim de um ciclo e que as coisas têm melhorado nos últimos anos, mas ainda considero que a governança nas empresas de comunicação não é tão boa quanto em outros setores.
Você não estava no Estadão na época do assassinato. Esse fato dificultou de alguma forma no acesso às informações para produzir o livro?
V.V. – Não. Eu entrevistei cerca de 50 pessoas que trabalharam lá e fui juntando os pedaços. O fato de a notícia ter sido amplamente coberta pela imprensa ajudou e eu também já fazia um acompanhamento à distância do que vinha acontecendo, porque eventualmente conversava com a Sandra.
Como foi a entrevista com o Pimenta Neves?
V.V. – Se não me engano, ele não falava com nenhum jornalista desde 2005 e decidiu me atender em abril de 2009. Marcamos uma conversa para falar não do assassinato em si, mas do ambiente da imprensa e de suas experiências como diretor da Gazeta e do Estadão, e os acontecimentos políticos que culminaram com a volta dele ao Brasil. Claro que no meio da entrevista a conversa evoluiu para o caso da Sandra e suas decisões, explicando seus motivos para as promoções dela. Ele respondeu a tudo que perguntei. Claro que algumas informações contrastavam com as de outras pessoas e até com o meu próprio ponto de vista sobre o ocorrido, por também ter sido uma testemunha do acontecimento. Publiquei trechos dessa entrevista na segunda edição da revista Alfa, em outubro de 2010, três meses antes de ele ser preso novamente.