Realizada no ano de 2012, a XIV Jornada Multidisciplinar do Departamento de Ciências Humanas da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Unesp – Universidade Estadual Paulista elegeu o tema ‘Mídia e Cidadania’, a fim de estimular o debate em torno da temática, que se coloca essencial para pensar o fortalecimento da comunicação como instrumento para enfrentar os desafios sociais, políticos e econômicos do Brasil contemporâneo. Com uma programação rica e plural, o evento se posicionou como fonte singular de conhecimento sobre o tema, de maneira a oferecer um importante meio de aperfeiçoamento da formação em nível de graduação e pós-graduação em comunicação.
Este livro reúne artigos de palestrantes e conferencistas do evento, além de produções de docentes do Departamento de Ciências Humanas ligadas a seu tema. O objetivo é contribuir para a consolidação de estudos e pesquisas centrados em um prisma interdisciplinar que se mostra, cada vez mais, como fundamental para a compreensão dos impasses postos pela comunicação midiática ao desenvolvimento social e ao aprofundamento democrático.
Apesar de possuírem uma temática em comum, os trabalhos aqui apresentados se caracterizam por uma diversidade de conteúdos e enfoques, que significam variados enfrentamentos de problemas contemporâneos.
Em texto intitulado “Emoção, retórica e histórias pessoais na esfera pública”, Rousiley Maia, doutora em ciência política pela University of Nottingham (Inglaterra) e docente do Departamento de Comunicação Social da UFMG, explora perspectivas teóricas sobre o fenômeno da deliberação democrática, a fim de abranger o papel que a emoção e formas alternativas de comunicação exercem sobre ele, além do discurso racional. Maia sustenta que a retórica, as narrativas e as histórias de vida podem ampliar a deliberação na sociedade midiática.
Francisco Sierra Caballero, doutor em ciências da informação pela Universidad Complutense de Madrid (Espanha) e docente da Universidade de Sevilha, em seu artigo “Cidadania, comunicação e ciberdemocracia”, examina as conexões entre o conceito de capital social e os debates sobre a Sociedade Europeia da Informação, analisando, em particular, antecedentes teóricos e consequências sociais de recentes movimentos sociais em defesa do aprofundamento democrático na Espanha que obtiveram projeção ampliada através de dispositivos digitais de produção de sentido e comunicação.
Responsabilidade social
Com o título “Políticas de mídia e cidadania”, o artigo de Venício Lima, doutor em comunicação pela University of Illinois e docente aposentado da UnB, resume as questões de sua conferência de abertura da XIV Jornada Multidisciplinar, abrangendo: o que são políticas públicas de mídia? O que se entende por cidadania? O que impede o avanço do debate sobre regulação? O que justifica a existência de políticas públicas para o setor? Por que conselhos estaduais de comunicação social não são criados? Qual critério geral deve presidir a formulação e a avaliação das políticas públicas de mídia?
Fernando Oliveira Paulino, doutor em comunicação pela UnB e docente da mesma universidade, e Pedro Gomes, bacharel em comunicação pela UnB, no artigo “Lei e direito à comunicação: padrões normativos e judiciais no Brasil”, avaliam como o Estado brasileiro tem observado o direito à comunicação, principalmente na esfera dos Poderes Legislativo e Judiciário. O texto está ancorado em pesquisa bibliográfica e análise de artigos da Constituição e decisões do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria.
Em “Marco constitucional e regulação da comunicação social no Brasil”, Jefferson Goulart, doutor em ciência política pela USP e docente da Unesp, e Pedro Buriti, mestrando do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Faac/Unesp, analisam concepções sobre o alcance da participação do Estado e seu poder regulatório no campo da comunicação, com foco sobre o debate conceitual em torno da problemática do interesse público e a Constituição Federal de 1988, em exercício analítico baseado em bibliografia teórica e comparativa.
Tatiana Stroppa, mestre em direito constitucional pela Instituição Toledo de Ensino e docente do Centro Universitário de Bauru (ITE), da Faculdade Iteana de Botucatu e das Faculdades Integradas de Jaú, em “O direito à informação e o papel do Estado”, examina como o conjunto de direitos subjacentes à liberdade de expressão são relacionados com frequência à inação do Estado. Segundo sua perspectiva, a consagração de direitos abrangidos por essa liberdade na Constituição Federal de 1988 impõe a atuação positiva do Estado.
No artigo intitulado “Eventos como estratégias de comunicação em movimentos sociais: mobilização e visibilidade nas lutas da cidadania, Murilo Cesar Soares, doutor em ciências da comunicação pela USP e livre-docente da Unesp, e Elaine Cristina Gomes de Moraes, docente das Faculdades Integradas de Bauru analisam o papel da realização de eventos como estratégia de comunicação por movimentos sociais para reivindicar e pressionar o poder público em busca de direitos da cidadania.
O potencial da esfera pública é o tema do artigo “O blog jornalístico como espaço de debate público e construção da cidadania”, de Maximiliano Martin Vicente, doutor em história pela USP e livre-docente da Unesp, e Juliana Colussi Ribeiro, doutoranda em jornalismo pela Universidad Complutense de Madrid. Em questão, estão resultados de pesquisa empírica sobre espaços de comentários como oportunidade para realização de um debate público fragmentado, com audiência segmentada.
José Carlos Marques, doutor em ciências da comunicação pela USP e docente da Unesp, no artigo “O Mundial de Futebol de 2014 e a transparência: algumas abordagens sobre o sítio oficial do governo federal brasileiro – o Portal da Copa”, parte da hipótese de que questões de sustentabilidade e transparência, como viabilidade econômica do negócio, respeito ao meio ambiente e responsabilidade social, apesar de referidas no Portal da Copa, não foram devidamente tratadas na organização do evento esportivo, revelando um descolamento entre o discurso das autoridades e as ações realizadas.
Qualidade investigativa
O ponto de partida do artigo de “Pessoalidade e cidadania em animais: o problema das outras mentes”, de Jonas Gonçalves Coelho, doutor em filosofia pela USP e livre-docente da Unesp, é a ampla presença contemporânea dos animais no cenário tecido pelas mídias, que refletiria uma mudança de comportamento da sociedade em relação a uma parte desses seres vivos. A concessão de direitos aos animais e algum grau de cidadania sinalizaria uma mudança de concepção mais essencial, que passa pela atribuição do que chamamos de ‘mente’ aos animais.
Em “Cidadania e imprensa em São Paulo do início do século XX”, Célio José Losnak, doutor em história social pela USP e docente da Unesp, revisa a produção bibliográfica existente sobre a cena urbana no período em relação à atuação da imprensa paulista no processo de construção da nação e da inserção das classes populares na sociedade. Sua ênfase se dá sobre o jornal “O Bauru”, publicado entre 1906 e 1924, que reunia de maneira emblemática e contraditória perspectivas diferenciadas sobre cidadania, repercutiam conceitos e opiniões.
Danilo Rothberg, doutor em sociologia pela Unesp e docente da mesma universidade, em “Jornalismo, educação profissional e diretrizes curriculares”, indica direções para a pesquisa de perfis profissionais no Brasil e reflete sobre os diferenciais da formação específica em um mercado desregulamentado, como contribuição à reformulação curricular dos cursos de jornalismo. Currículo flexível, especialização e um particular entrosamento entre teoria e prática são medidas propostas para o aperfeiçoamento da preparação de profissionais.
“A comunicação social como mecanismo de efetivação dos direitos humanos e do exercício da cidadania por meio de propagandas sociais radiofônicas”, de Carlo José Napolitano, doutor em sociologia pela Unesp, e Lucilene dos Santos Gonzales, doutora em letras pela Unesp, ambos docentes da mesma universidade, é um relato de experiência do projeto de extensão universitária intitulado “Minuto Cidadania”, que tem como objetivo difundir informações sobre direitos humanos através de peças de propaganda veiculadas diariamente pela Rádio Unesp FM.
Os textos foram agrupados, segundo seus enfoques, em cinco partes, intituladas: Novos enfoques teóricos (I); Políticas e regulação de mídia (II); Aproximações empíricas (III); Cidadania e temas emergentes (IV); e Relato de extensão (V).
O conjunto desses textos, cada um a partir de sua perspectiva teórica e com seu objeto próprio, focaliza com rigor acadêmico e qualidade investigativa diferentes aspectos das relações entre a cidadania e os meios de comunicação no Brasil. Estamos convencidos, por isso mesmo, de que eles trazem uma contribuição significativa para esse importante debate.
Boa leitura. [Bauru, SP, novembro de 2012. Os organizadores.]
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