Se você aprendeu a amar os dicionários, não se assuste com o título acima. Não é o fim; há de ser apenas a espera de um novo amanhecer. Se com alguns cliques é possível, gratuitamente, encontrar significados e uma infinidade de informações sobre palavras na internet, ficou, também, cada vez menor a disposição do consumidor em investir até R$ 300 em um dicionário consagrado. Até recentemente presença garantida nas estantes dos lares brasileiros de classe média, os dicionários estão perdendo seu lugar.
Embora não divulguem seus números, as editoras dos três principais dicionários brasileiros – Aurélio, Houaiss e Michaelis – admitem estagnação nas vendas nos últimos três anos, depois de um pico em 2009, quando do início da vigência do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Os dados mais recentes do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), divulgados em 2012, apontam uma redução de 7,7% no total de leitores no país entre 2007 e 2011 e queda de 46,7% do porcentual de interessados no gênero dicionários e enciclopédias.
“Percebemos gradativa redução na procura por dicionários impressos e maior demanda por conteúdos digitais”, observa Roberto Feith, diretor-geral da Objetiva, editora dos dicionários Houaiss. Mesmo com versões disponíveis em CD e DVD, o aproveitamento do conteúdo da publicação em aplicativos para celulares e tablets é visto com cautela. “Ainda não encontramos um modelo de negócios apropriado.”
A estratégia da Britânica
Para Breno Lermer, superintendente da Melhoramentos, editora dos dicionários Michaelis, o horizonte do mercado eletrônico permanece nebuloso: “Há uma cultura de preços baixos nas versões digitais sob o falso argumento de que não existe o produto físico. Mas o custo de preparo de um dicionário é o mesmo, seja em papel, seja em formato digital.”
Por enquanto, a maior demanda por exemplares impressos de Houaiss, Aurélio e Michaelis continua concentrada em escolas e no segmento estudantil. E, ainda que um mesmo dicionário possa ser utilizado durante todo período de aprendizado escolar (e mesmo depois), a transição para as ferramentas digitais nas instituições de ensino ainda vai demorar a acontecer, porque envolve investimentos em equipamentos e esforços de integração com os métodos tradicionais. O que resta às editoras daqui para a frente? “Estamos em busca de saídas. É difícil de imaginar a moçada consultando nossa maior edição, que pesa quase 4 quilos”, lamenta Lermer, da Melhoramentos. Com negócios em outros sete países, a editora vem investindo na sessão e no aluguel do seu banco de dados da língua portuguesa para empresas e portais da internet. O licenciamento de conteúdo para empresas estrangeiras também está em estudo na Objetiva.
O mais provável é que, para se manter no mercado, os editores de dicionários adotem a estratégia da tradicional Enciclopédia Britânica, que em março de 2012, depois de 244 anos de sucesso, decidiu pôr fim à edição em papel. Na ocasião, a companhia anunciou a concentração nos conteúdos digitais, o que inclui softwares e livros digitais para escolas, aplicativos para celulares e tablets, além de material atualizado diariamente no site e disponível para assinantes.
A formação dos futuros leitores
Diferentemente das editoras de dicionários brasileiros, que começaram a investir em edições digitais há menos de dez anos, a Enciclopédia Britânica foi pioneira no lançamento de exemplares em CD-ROM, em 1989. Também foi a primeira a editar conteúdo na internet em 1994 e produtos específicos para celulares em 2000. Ou seja, quando as vendas despencaram de 120 mil conjuntos vendidos em 1990 para 8,5 mil em 2010, as iniciativas que depois permitiram o fim da edição impressa já tinham sido tomadas.
No Brasil, cerca de 45% dos leitores entrevistados pelo SNEL em 2011 desconheciam a existência de livros digitais e, entre os que já conheciam, 82% nunca tinham lido um e-book. Sinal de que há longo caminho a ser percorrido pelas editoras brasileiras, não apenas no desenvolvimento de conteúdos mais atrativos, mas na própria formação dos futuros leitores. (Colaborou Danielle Villela)
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Celso Ming é colunista do Estado de S.Paulo