“Os autores mortos ganham as melhores sobrecapas”, diz Peter Mendelsund com frequência.
Criador de capas chamativas para obras de gigantes literários já mortos, como Kafka, Dostoiévski, Tolstoi e Joyce, Mendelsund não gosta de trabalhar com escritores cheios de exigências, que fazem questão de uma fonte, uma cor, uma imagem ou um tema visual específicos. “O produto final fica horrível”, explicou.
Mas, no ano passado, ele, que é diretor associado de arte da editora Alfred A. Knopf, virou seu próprio pior pesadelo. Criar uma capa para seu próprio livro, “What We See When We Read” [o que vemos quando lemos], foi penoso, contou. Sua primeira tentativa foi minimalista, própria para provocar o repúdio dos leitores: uma capa preta simples com texto em letras pequenas e brancas. “Foi como quando um ator fica com medo de se apresentar sobre o palco: fiquei paralisado”, contou.
O medo de se expor publicamente não é um problema crônico de Mendelsund, 46 anos, “pianista clássico em recuperação” e desenhista gráfico autodidata. O mais frequente é ele sofrer de um excesso de ideias, sendo visto como como um dos maiores criadores de capas de livros em atividade hoje. E agora ele está fazendo sua estreia como escritor, com dois livros saindo.
Em “What We See When We Read”, Mendelsund trata do modo misterioso pelo qual o texto produz imagens mentais vívidas, mesmo quando o autor fornece poucos detalhes.
A maioria dos leitores sente que consegue descrever Anna Kariênina perfeitamente, apesar de Tolstoi nos dar poucos elementos além de olhos cinzentos, cílios espessos e cabelos castanhos cacheados. Mendelsund argumenta que ler é cocriar e que nossas impressões de personagens e lugares devem tanto a nossas próprias memórias e experiências quanto aos poderes descritivos dos autores.
O outro livro de Mendelsund é “Cover” [Capa], uma obra ilustrada contendo mais de 300 de suas sobrecapas mais marcantes e esboços rejeitados. “A maioria dos designers procura uma imagem central para sintetizar um livro, mas Peter não procura uma imagem -ele busca uma ideia”, disse James Gleick, autor dos livros de não ficção “Caos” e “The Information”.
Para a edição em capa dura do último, Mendelsund repetiu o título cerca de 60 vezes, de modo que parece um fluxo de código.
Preta e simples
Para idealizar uma capa, Mendelsund começa por fazer anotações sobre um manuscrito e sublinhar orações chaves. Ele pendura as páginas marcadas sobre seu computador.
Então cataloga suas ideias numa folha de papel coberta por 16 retângulos, em cada um dos quais coloca uma palavra, uma frase ou uma imagem minúscula. Em seguida, escolhe o conceito mais promissor e cria um esboço.
Depois de ter o rascunho pronto, ele frequentemente passa a ilustrar à mão. Finalmente, imprime um boneco da capa, a coloca sobre um livro de capa dura e a deixa em sua estante de livros por alguns dias. Se seu olhar é atraído espontaneamente para o livro alguns dias depois, ele conclui que optou pelo rumo certo.
Com frequência, ele repete esse processo dezenas de vezes. Para criar a capa de “Os Homens que Não Amavam as Mulheres”, de Stieg Larsson, teve que fazer quase 70 tentativas.
Mas nenhuma capa foi mais difícil que a de seu próprio livro “What We See When We Read”, já que a tese central é que os leitores às vezes inventam imagens que o texto não substancia. “A ideia toda [da capa] é não mostrar alguma coisa”, explicou.
Finalmente ele encontrou uma solução. “Ainda é muito minimalista, mas é uma maneira de mostrar a sensação de ser incapaz de ver alguma coisa.” Numa capa preta simples, Mendelsund colocou uma fechadura dourada pequena e reflexiva.
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Alexandra Alter, do New York Times