Enquanto o Departamento de Justiça disputa com as grandes editoras e a Apple, eu quero fazer uma simples declaração que provavelmente vai contra o que a maioria dos leitores acredita: fazer livros eletrônicos, ou e-books, é mais difícil do que parece.
Como agente literário, fui vítima das mesmas falsas conclusões que, eu acho, a maioria dos leitores, de que os e-books são produzidos facilmente a partir dos livros de papel. Mas isso não é exatamente verdade. Para os livros mais antigos, as editoras não eram proprietárias do arquivo da composição tipográfica (o tipógrafo, sim), e esses arquivos geralmente não eram mantidos para sempre. Por isso as editoras muitas vezes têm de pegar fisicamente um velho livro, mandar escaneá-lo e depois converter, usando reconhecimento óptico de caracteres (OCR na sigla em inglês), o que não é nada perfeito. Por isso as editoras – pelo menos as boas – mandam o arquivo resultante para ser revisado profissionalmente em busca de erros de escaneamento. E em um mundo perfeito eles também pedem que o autor o revise.
Depois há a questão dos direitos. Para livros mais antigos, a editora pode não ter o direito de usar a arte da capa em um e-book. É claro que estes teriam de ser livros muito mais antigos, pois a maioria das editoras começou a pedir os direitos de exibição muito tempo antes da existência do Kindle. Esses direitos de exibição geralmente são interpretados como uma permissão para que as editoras exibam a capa online ou na tela de um leitor de e-books. Mas se a editora não tiver esses direitos deve adquiri-los ou criar uma nova capa. E novas capas custam dinheiro.
Depois há a questão dos originais. Os originais são livros publicados pela primeira vez em forma de livro eletrônico, e não reedições de livros publicados anteriormente. E aqui o argumento de que os e-books deveriam ser mais baratos e fáceis de produzir que os livros de papel realmente falha. Produzir um livro eletrônico de qualidade custa o mesmo tempo e o mesmo dinheiro que produzir um livro de papel de qualidade. Sim, você economiza alguma coisa em papel, impressão e encadernação. E economiza em armazenamento e remessa. Mas incorre em outros custos. Primeiro vamos examinar os pontos em comum.
Tantos os livros de papel como os eletrônicos exigem um enorme investimento em tempo e esforço do autor. Não há diferença nisso. Ambos exigem trabalho editorial para desenvolvê-lo. Alguém tem de lembrar ao autor que ele está escrevendo para um público, e não apenas para si mesmo. Ambos exigem edição de texto e revisão. Ambos exigem a arte da capa e design. E ambos exigem um esforço de publicidade e marketing. Em todas essas áreas não há absolutamente diferença entre um e-book original e um livro impresso original. E, quando publicado por uma editora tradicional, esse processo custa milhares de dólares, tudo antes que um só exemplar seja vendido.
Mas os e-books vêm com suas próprias despesas em software e infraestrutura ou hospedagem. O software da Adobe usado para criar e-books não é grátis. Na verdade, uma cópia do InDesign custa US$ 700. Acrescente Photoshop e outros softwares necessários para criar e editar arquivos de livros eletrônicos, e você facilmente gastará milhares só em software.
Depois, é claro, é preciso hospedar os e-books em algum lugar para que possam ser vendidos. As grandes editoras podem comprar servidores e mantê-los (mais dezenas de milhares de dólares), mas muitas editoras e pequenas editoras em particular usam hospedagem terceirizada, com experiência em comércio eletrônico, e pagam taxas de quatro ou cinco dígitos e depois uma porcentagem de cada e-book vendido (20% a 25% não é raro) via hospedeiro. Isso não inclui a Amazon ou Barnes & Noble ou outros vendedores; é apenas para vendas diretas pela editora, usando um serviço de hospedagem terceirizado.
Por isso, quando as pessoas falam que os e-books deveriam ser baratos em comparação com os livros de papel, porque há tantas economias de custo, tenho de balançar a cabeça e discordar.
Sangue e lágrimas
Recentemente, tornei-me um editor quando minha empresa, a “Author Coach LLC”, Começou a publicar e-books de títulos fora de catálogo (também temos alguns originais em produção), com o nome de “Endpapers Press”. Como uma pequena editora, sou visto principalmente na categoria de “autopublicação” pela Amazon, B&N, etc, já que não tenho centenas de títulos. A Amazon fica com pouco mais de 30% de cada livro, porque também cobra uma “taxa de entrega” além da porcentagem que ganha. A B&N fica com cerca de 35%. A Google ficou com 48% do meu último relatório.
A vasta maioria das editoras está pagando 25% do valor líquido recebido como royalty para os autores. O que isso quer dizer é que se você, leitor, compra um e-book da Amazon por US$ 6,99, a editora recebe cerca de 4,89 e diz que o autor recebe 1,22. Vamos comparar com os livros impressos. Os royalties padrão dos impressos são na verdade baseados no preço de lista. Sobre um livro brochura de US$ 6,99, o autor receberá entre 4% e 8% do preço de lista, dependendo da taxa negociada quando o contrato foi feito. Isso são US$ 0,28 na extremidade inferior e US$ 0,56 na superior. Então os autores estão lucrando com os e-books, mas o e-book de uma brochura de US$ 6,99 provavelmente custará 4,99, pois as editoras reconhecem que os leitores esperam que os e-books sejam mais baratos. Mas elas não reconhecem o verdadeiro negócio que estão fazendo, eu acho. Porque o custo de papel, impressão e encadernação de uma brochura é inferior a US$ 1, mas a editora está tirando US$ 2 dos e-books. Por 4,99, o autor ganha cerca de US$ 0,87 por livro. Ainda é melhor do que ele ganha no livro impresso, mas também ainda é uma soma muito pequena comparada com a que a editora e até a Amazon ganham. A Amazon ganha cerca de US$ 1,50 naquele e-book de 4,99. A editora ganha cerca de US$ 2,62. Então quem está ficando rico aqui? Ninguém, na verdade. E os leitores estão pagando demais pelos e-books? Não.
No entanto, os leitores foram levados a acreditar que os e-books deveriam custar menos do que custam? E muito menos que os livros impressos? Sim.
Há duas forças em ação aqui. De um lado está a venda de e-books pela Amazon por preços menores do que pagava às editoras pelos e-books. Isso foi um clássico “preço chamariz” para ajudar a criar um mercado para o Kindle. As editoras reagiram adotando o modelo agência, que exigia que a Amazon honrasse os preços declarados pelas editoras. Mas os leitores já tinham em suas cabeças que o e-book de um livro de capa dura de US$ 25 deveria custar 9,99. Com a introdução do modelo agência, aquele e-book poderia agora custar metade ou dois terços do preço do livro capa dura. Ainda um desconto significativo, mas também maior que US$ 9,99. E isto frustra alguns leitores e claramente levou o Departamento de Justiça a pensar que tinha de fazer algo!
Outra força em ação é o mercado de autopublicação. “CreateSpace” e “KDP” da Amazon, assim como os programas “Lightning Source da Ingram e PubIt!” da Barnes & Noble’s, todos permitem que os autores publiquem pessoalmente por um custo razoável. E embora haja diretrizes sobre preços, a Amazon, por exemplo, paga o máximo de royalties aos autores que colocam seus preços na faixa de US$ 2,99 a 9,99 e exige que o preço do e-book seja 20% menor que o preço da edição impressa mais barata. Isto levou muitos autores que publicavam pessoalmente pela primeira vez a apreçar seus livros em US$ 2,99 ou 3,99, na esperança de atrair mais leitores. Na verdade, eu diria que estão saindo muito mais livros novos nessa faixa do que na de US$ 14,99 a 18,99, em que podem estar os e-books de muitas novas capas duras.
Então, aonde tudo isso nos leva? Bem, para começar, pareceria que os argumentos de que o apreçamento de agência resultou em preços mais altos dos e-books carecem de substância. Certamente, os e-books de algumas editoras hoje podem ter preços mais altos, mas não os e-books em geral. E assim como as editoras sempre tiveram promoções para livros impressos há muitas oportunidades de conseguir e-books por preços mais baixos ou de graça. E, afinal, toda essa discussão levou pelo menos uma editora – a Tor Books – a abrir uma livraria online “DRM-free” (que significa livre de Gerenciamento de Direitos Digitais), por isso o e-book não estará preso a qualquer plataforma de leitura específica. Se você tiver um iPad e um iPhone, leia o livro nos dois. Se tiver um Nook e um Sony Reader, leia o livro nos dois. Muitos leitores querem a opção. Alguns argumentam que o DRM-free levará a mais pirataria e as editoras terão de aumentar os preços para policiar a web de maneira mais agressiva para evitar os piratas, mas outros dirão que os livros já são bastante baratos, e que pirateá-los eletronicamente não valeria realmente a pena. Só o tempo dirá.
Enquanto isso, na próxima vez que você pegar seu leitor de e-books, tenha em mente que só porque o livro não pesa 2 quilos não significa que o autor não suou sangue e chorou lágrimas de verdade escrevendo aquele livro, que um editor não ficou acordado até tarde criando notas para melhorar o livro e que editores e revisores e outros funcionários da produção não se esforçaram igualmente naquele e-book como fariam em um livro impresso. E cada um desses indivíduos merece ganhar a vida por seu trabalho. Então, compre e-books, pague um preço justo e divirta-se!
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Andrew Zack, President and Literary Agent, The Zack Company, Inc., Publisher, Endpapers Press