Muito se fala em favor da leitura, mas pouco tem sido feito em nosso país para despertar o amor pelos livros. Toda pesquisa internacional a respeito do assunto coloca o Brasil na retaguarda da educação, com o número per capita de leitores muito inferior ao de países de todos os continentes.
Apesar das estatísticas e do discurso oficial, nossos governantes pouco fazem para reverter o quadro. Os planos de livro e leitura são demasiadamente burocráticos e se arrastam em discussões quase sempre infrutíferas e distantes da realidade. Por sua vez, a mídia simplesmente ignora a importância da literatura infantojuvenil para o letramento de crianças e jovens. Não bastasse isso, o investimento em educação pública continua abaixo das expectativas.
Felizmente, há iniciativas particulares que visam recuperar o tempo perdido. Uma delas é o projeto Literatura Viva, do Sesi-SP, do qual acabo de participar pela segunda vez. Visitei unidades educacionais nas cidades de Hortolândia, Nova Odessa, Americana e Piracicaba e novamente testemunhei a preocupação da entidade com o ensino e o estímulo à leitura.
Além da boa recepção por parte de bibliotecários, professores e diretores, constatei mais uma vez a excelente estrutura física das escolas e o bom nível dos alunos. Durante quase duas horas, crianças e adolescentes de cada uma das quatro unidades ouviram-me falar sobre arte literária e fizeram-me perguntas pertinentes ao tema, debatendo com extrema seriedade os assuntos abordados.
Índices preocupantes
A garotada quis saber sobre minha formação de escritor, meus autores e livros prediletos, e conhecer minha opinião sobre a vida e as artes em geral. Também discutimos temas relativos ao mundo contemporâneo e às perspectivas de um futuro melhor.
Assim como no ano passado, pude me surpreender com a quantidade e a qualidade das perguntas, sobretudo no que se refere ao mercado editorial, aos desafios de viver da escrita num país com baixos níveis de leitura, dominado pelas mídias eletrônicas. Também discorri sobre os caminhos a serem percorridos por todo aquele que sonha se tornar escritor. “Primeiramente é preciso ser bom leitor”, ressaltei mais de uma vez.
Teve gente questionando o porquê das listas de livros mais vendidos no país destacarem publicações estrangeiras em detrimento de obras de autores nacionais. Falei sobre a leitura de entretenimento, o marketing das editoras e a sociedade do espetáculo, que tende a transformar em circo quase tudo o que acontece no mundo, negando espaço para genuínas manifestações culturais.
O melhor de tudo foi saber que boa parte dos presentes ao encontro se interessa de fato pelos livros, sendo assíduos frequentadores da biblioteca escolar. Mesmo não estando ali para falar diretamente sobre minha obra, fiquei feliz ao perceber que alguns já conheciam meus livros ou haviam pesquisado minha trajetória na internet. Prova disso foi a homenagem que me prestaram, com a leitura de alguns poemas de minha autoria em forma de jogral no final de cada encontro.
Penso que o exemplo do Sesi-SP deveria ser seguido por entidades de classes em todo o país. Além de mim, escritores e ilustradores de vários estados participam do projeto quase todo ano. A formação da cidadania deve ser também uma preocupação de organizações civis e particulares que desejam um melhor cenário para sua atuação. Enquanto lá fora a qualidade da educação e os índices de leitura preocupam também a iniciativa privada, muitos no Brasil ainda ficam à espera da ação de governos quase nunca comprometidos com o futuro do país.
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Jorge Fernando dos Santos é escritor