Meu pai foi a primeira pessoa a quem revelei que seria escritor e a primeira que disse que eu morreria de fome. Ele viu meu primeiro livro ser publicado, mas morreu sem saber que eu ganharia com livros mais do que ele juntou a vida inteira como corretor de imóveis. Faz sete anos que ele morreu, mas o mantra ainda é repetido a qualquer um que queira viver da escrita.
É positivo se revisar esse discurso para não restar apenas a impressão de que o autor brasileiro está destinado a viver um fardo. Para isso, é preciso concordar, antes de mais nada, que escrever é uma profissão.
Outro ponto é que na literatura ainda existe o mito de que um escritor deveria ter receio do sucesso comercial.
Encontraremos autores que preferem “ser lidos”, mas “não vender muito” ou “ganhar dinheiro”. É um relato curioso. Quanto mais lido um autor for, mais livros venderá, mais dinheiro ganhará e mais tranquilidade terá para viver da escrita.
Além disso, existe o velho discurso de que a “boa literatura” e a “literatura comercial” não podem andar de mãos dadas. Esse argumento atravanca o crescimento do mercado editorial, ao contrário de outros nos quais tal raciocínio foi superado, como o de cinema e de games.
A diferença
Ter a escrita como profissão envolve disciplina e paciência. Não se vive de literatura de um dia para o outro, como em qualquer profissão. Demora-se anos e várias obras. Para cada jogador de futebol milionário existem centenas ganhando salário mínimo. Mas os holofotes costumam focar os que saíram do nada e venceram. Opta-se pelo exemplo, não pelo desestímulo.
Nas livrarias, brasileiros e estrangeiros disputam o mesmo espaço. O maior obstáculo era o preconceito com o autor nacional. Hoje temos nomes que vão de Eduardo Spohr a Leandro Narloch, de Paula Pimenta a Laurentino Gomes, de Carina Rissi a Isabela Freitas, de Carolina Munhóz a Raphael Montes. Uma geração que se comunica diretamente com seu público e seduz novos leitores. E nem é preciso citar gigantes como Paulo Coelho, Pedro Bandeira, Augusto Cury, Mauricio de Sousa e tantos outros.
Nunca se leu tanto. É pouco ainda para um país gigantesco, mas é mais do que em qualquer época. Olhe ao redor: as pessoas estão obcecadas em telas portáteis, lendo e escrevendo o tempo todo. Leitores acampam na frente de Bienais. Temos algumas das maiores bases mundiais de fãs de sagas literárias, que também se apaixonam por livros brasileiros.
Um escritor brasileiro tem o direito de dizer que não sabe como se comunicar com esse mercado. Mas não que ele ainda não existe.
Recebemos e-mails emocionados, somos parados nas ruas, chegamos às outras mídias e negociamos contratos de seis dígitos. Mas, quando tudo era um sonho, foi preciso desafiar o mantra e descobrir que viver disso é diferente de viver isso. E essa geração hoje vive isso. Por isso, a cada dia mais, ela vive disso.
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Raphael Draccon, 33, é escritor, autor de “Cemitérios de Dragões” (Rocco) e da série “Dragões de Éter” (Leya), entre outros, e vive de livros