A incerteza é o cotidiano do jornalismo. Sua sina e seu horizonte. Apurar, reduzir a nebulosidade, sem jamais atingir a pureza. Impossível pureza numa tarefa em que pressões de todos os tipos (materiais, psicológicas, econômicas…) empurram os profissionais a cumprirem religiosamente, custe o que custar, todos os dias, o primeiro mandamento: em branco não sai!
A impureza do branco, lembrando o título de um livro de Carlos Drummond de Andrade, não pode restringir-se a afirmar o que todos já sabem, ou pensam saber. Além das constatações, uma boa reportagem trará interpretações e hipóteses sobre a realidade, provocará reflexão. A realidade, sempre recortada, só existe, no mundo humano, mediante a relação com o sujeito que investiga, sente, pensa e escreve.
Jornalismo, atividade inexata, o que não significa admitir confusões e mentiras. A notícia nasce da pesquisa, da busca pessoal. A ideologia da objetividade esconde a pior das subjetividades, a que finge não ser subjetividade. O jornalista precisa descobrir como lidar com o que lidam todos os que aprenderam a lavar as suas mãos em água suja: pontos de vista, suspeitas, contradições, verdades pela metade, versões, impressões…
Diálogo com o real
A objetividade inclui o sujeito que conhece (e os instrumentos com que conhece, a internet, por exemplo). Não é preciso rasgar as vestes, escândalo diante dos vieses. Basta trabalhar com método e consciência. O livro de Luiz Costa indica formas e caminhos de investigação, com base numa atitude por vezes irônica (saudavelmente irônica). Se não houvesse vieses também não haveria o que noticiar.
Uma epistemologia da notícia. Conjugar os vestígios de verdade encontrados (essa é a etimologia de “investigação”) com a ótica de quem investiga e os encontra. A busca é válida se, além das evidências, dos fatos concretos, das declarações confiáveis ou menos confiáveis, quem buscou sabe o que fazer com tudo o que colheu. Mentir com dados verdadeiros é, mais do que falta de ética, falta de lucidez.
Livro para os estudantes de comunicação, para quem iniciou-se agora na carreira, e para quem gosta de refletir sobre os experimentos e procedimentos neste laboratório da produção de notícias.
Se eu pudesse resumir: investigação na imprensa é abominar a improvisação, e desaprovar o autoritarismo de quem se fechou para o diálogo com o real. O real – “coisa” que só existe quando o jornalista sabe que é também um escritor.
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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br