BusinessWeek vale um dólar? O que Alan M. Webber, fundador da revista Fast Company, queria saber não é se vale pagar um dólar por BusinessWeek na banca, mas se toda a operação de editar essa revista de negócios, que tem uma circulação de quase 900 mil exemplares nos Estados Unidos e um portal com milhões de visitantes, seria cara por um dólar. Observadores acham que seria um preço alto.
A revista, lançada em 1929, nas vésperas do crash da bolsa de Nova York, foi influente e extremamente rentável. O autor destas linhas, seu correspondente em São Paulo no início dos anos 1970, lembra que a primeira edição em que colaborou tinha mais de 200 páginas, quase metade de anúncios, e no fim dos anos 1990, uma diretora da revista lhe disse em Nova York que estavam recusando publicidade por falta de condições físicas para acomodá-la. Na virada desta década, a situação piorou drasticamente e foi agravada pela atual crise. Em 1999, publicou 5 mil páginas de publicidade; em 2008, apenas 1,9 mil e nos primeiros quatro meses deste ano perdeu 38% em relação ao ano passado.
A receita de publicidade do portal na internet aumentou de US$ 900 mil em 2006 para US$ 20,5 milhões em 2008, mas foi insuficiente para compensar a queda de anúncios na versão impressa, de US$ 110 milhões em 2006 para os US$ 60 milhões estimados para este ano.
Receita insuficiente
Em 2008, BusinessWeek perdeu US$ 43 milhões e para este ano a previsão é de um prejuízo de US$ 41 milhões. Cansada de perder dinheiro, a empresa editora, a McGraw-Hill, colocou a revista à venda. Segundo o Financial Times, o preço seria de um dólar, o mesmo pago no ano passado pela TV Guide, que já foi a revista semanal de maior circulação nos Estados Unidos, pela qual, nos anos 1980, Rupert Murdoch pagou US$ 3 bilhões. Sem uma oferta satisfatória, a revista não seria mais impressa; continuaria apenas a versão digital.
Foram feitas várias propostas. A maioria, de empresas financeiras; uma delas é a que adquiriu a TV Guide por um dólar. Com vários interessados, é pouco provável que a revista seja vendida por esse preço, mas não é de se esperar oferta muito generosa. O comprador, além de ficar com uma revista altamente deficitária, deverá herdar uma dívida de US$ 31,9 milhões.
No meio jornalístico, a Bloomberg, especializada em informação financeira por meios eletrônicos, é considerada o comprador ideal. Seja quem for o vencedor do leilão, parece inevitável um novo corte de despesas, o quarto em dois anos. A revista tem 421 empregados, número pouco compatível com uma receita em declínio.
A questão crucial é o foco editorial a ser dado à revista na nova fase. Segundo The New York Times, com o objetivo de torná-la relevante na era da internet, foi feita uma mudança radical no início deste ano. BusinessWeek decidiu concentrar-se nos assuntos importantes para o executivo em seu emprego, eliminando temas como esportes, estilo de vida e política. Também perderam importância as matérias investigativas. Alan Webber afirma que a comunidade de negócios não perdeu o apetite por análises bem informadas e perspicazes nem por opiniões bem pensadas. The Economist e o Financial Times seriam provas de que um meio impresso bem orientado atrai audiência. Mas para saber qual será o foco editorial da BusinessWeek será necessário esperar alguns dias. A McGraw-Hill recebeu propostas até 15 de setembro. Ainda não divulgou os resultados.
Os problemas da BusinessWeek são comuns às outras duas grandes revistas americanas de negócios, Forbes e Fortune. Durante muito tempo, as três foram prósperas e influentes, pareciam inexpugnáveis e eram olhadas com admiração e inveja. BusinessWeek já encabeçou o ranking das revistas com maior número de páginas de publicidade dos Estados Unidos, Forbes foi a segunda e Fortune, a terceira. Mas ficaram vulneráveis. Segundo The Wall Street Journal, seu modelo de negócios deixou de ser economicamente viável. As três vêm perdendo circulação e dinheiro.
Para sobreviver, precisariam reduzir drasticamente seu escopo e operações. Como no caso das revistas semanais de informação, vendem assinaturas por preços irrealisticamente baixos, para atrair um leitor relutante, o que as faz depender de maneira excessiva de uma publicidade que encolhe. A receita das operações online é insuficiente para compensar essa queda. As alternativas abertas às empresas editoras são vender as revistas ou encolher o tamanho das operações – e das redações.
Perda total
Fortune, do grupo Time Warner, vende 825 mil cópias por quinzena. Publicou no primeiro trimestre 38% menos páginas de anúncios que em 2008 e menos da metade em algumas edições recentes. Seu sítio na internet, que divide com a CNN, tem 4,9 milhões de visitantes e 61 milhões de páginas vistas. Mas sua receita não compensa a queda da edição impressa. Para este ano são previstas perdas de US$ 7 milhões a US$ 8 milhões. Segundo o Wall Street Journal, para reduzir custos, a revista teria que voltar a ser mensal, como no passado, fazer demissões em massa ou reduzir a circulação.
Forbes, também quinzenal, foi acusada pela Fortune de dar tratamento editorial favorável a grandes anunciantes. Tem uma circulação de 886 mil exemplares. No ano passado, perdeu 17% do volume de anúncios e 18% no começo deste ano. Ainda assim, aparentemente, é das três revistas a que se encontra em melhor situação para enfrentar o futuro. A edição impressa é deficitária, mas já fez profundos cortes, demitindo umas 70 pessoas. Além disso, a versão digital, com 5,6 milhões de visitantes e 66 milhões de páginas vistas, atraiu receita estimada entre US$ 60 milhões e US$ 70 milhões. Por esse motivo, poderia passar a circular mensalmente, ou reduzir o número de assinantes, uma vez que depende menos da versão impressa do que suas concorrentes. Mas dificilmente poderá continuar como está.
Essas três publicações de negócios não foram as únicas a enfrentar problemas. Há dois anos, a editora Condé Nast, que também publica Vogue e Vanity Fair, lançou nesse mercado a revista mensal Portfolio. A expectativa e os investimentos foram grandes. Fechou neste ano, depois de perder dezenas de milhões de dólares. Um destino que BusinessWeek, Forbes e Fortune tentam evitar.
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Muda aqui, muda ali, e nada parece bastar contra as forças digitais
As revistas semanais de informação americanas estão perdendo dinheiro e também o rumo. As três mais importantes, Time, Newsweek e US News & World Report, enfrentam uma profunda crise de identidade e se questionam continuamente sobre seu papel num mundo digital.
Esse gênero de revistas surgiu com o lançamento de Time em 1923, quando o rádio estava começando, não existia televisão, os jornais tinham circulação local e as revistas de alcance nacional davam a seus leitores uma forte dieta de ficção e conselhos para o lar, além de chegar ao leitor com semanas ou meses de atraso. Time se tornou a primeira revista a dar uma visão resumida dos acontecimentos da semana, condensando as informações publicadas pelos jornais, especialmente The New York Times. Não tinha repórteres, apenas pesquisadores que recortavam os jornais e redatores que tentavam fazer resumos das notícias num estilo atraente, instigante e bem escrito, com retratos vivos das pessoas mencionadas, que foi conhecido como ‘Timestyle’.
Nada de matérias longas ou reportagens, só notícias e matérias curtas, que, além de dar os fatos, contavam histórias. Era, no início, uma revista pequena, com pouco mais de 20 páginas editoriais, para ser lida rapidamente por uma classe média em expansão, que absorvia sem esforço uma informação já digerida e com a opinião embutida. Time criou, assim, um novo tipo de publicação, a newsmagazine, revista de notícias. Foi um êxito extraordinário e teve imitadores tanto nos Estados Unidos como no exterior. Depois da II Guerra Mundial, a maioria dos países lançou sua própria Time; para as colônias que se tornavam independentes no Terceiro Mundo era um ponto de honra ter uma linha aérea e uma revista semanal de informação, provas visíveis da identidade nacional.
Foco alterado
As revistas semanais de informação foram mudando. Eram cada vez menos um resumo das notícias da semana e ficaram mais preocupadas em publicar informação própria, análises, reportagens e colunas assinadas. A concorrência dos jornais diários, que tentaram imitá-las, da televisão e o surgimento da internet, com uma extraordinária oferta de informação, quase toda grátis, está ameaçando a própria existência desse gênero de publicação. A circulação e a receita de publicidade estão desabando aceleradamente. Sua influência está em declínio e seu futuro em dúvida.
O modelo de negócios por elas adotado, que se baseia em conseguir uma alta circulação com preços de assinatura muito baixos para oferecê-la aos assinantes, chegou a níveis absurdos. Há ofertas para receber as revistas durante um ano por apenas US$ 20 ou US$ 30. O custo de manter de maneira artificial uma circulação elevada com preços baixos, no momento em que a receita de publicidade desaba, está sufocando as revistas, que, alarmadas, começaram a rever esse modelo. Uma alternativa em estudo é cortar a circulação de maneira drástica, deixando de vender assinaturas a qualquer preço. Outra, diminuir a periodicidade, deixando de ser semanais.
Newsweek, que chegou a ter uma circulação de 3,5 milhões de exemplares, fechou o primeiro semestre deste ano com 2,65 milhões. É uma revista deficitária. Está dando os primeiros passos de uma mudança radical. Seu objetivo é uma circulação de apenas 1,5 milhão de exemplares dirigidos a um tipo de leitor médio mais exigente, mais culto e de alto poder aquisitivo; ter ‘uma base menor de leitores muito interessados e receber mais dinheiro deles’, segundo uma diretora da revista. Pretende elevar o preço da assinatura até US$ 75 em 2011 – ainda assim, bem abaixo dos US$ 129 atuais de The Economist. É uma estratégia que reduziria os elevados custos de promoção, impressão e distribuição. O foco editorial também muda, para torná-la mais analítica, com menos ‘estilo de vida’ e mais temas sérios. Ou, como disse seu editor, Jon Meacham, com menos notícias e mais narrativa e ensaios bem argumentados. Em resumo, como diz The New York Times, Newsweek se prepara para competir não com Time, sua eterna rival, mas com The Economist. Com o novo modelo, espera deixar de perder dinheiro em 2011.
Preços maiores
US News & World Report é mais drástica em suas mudanças. Sempre a menor das três, já chegou a vender cerca de 2,5 milhões de cópias; de janeiro a junho deste ano, foram apenas 1,33 milhão. Vem perdendo dinheiro. No começo do ano passado, anunciou que diminuiria a periodicidade e passaria a circular quinzenalmente; meses depois, acelerou a mudança e decidiu que seria mensal. A redação se concentrará em fazer uma revista de serviços sobre saúde, educação, finanças pessoais, rankings e com ‘notícias que você pode usar’, não mais de informação geral.
Time, ainda rentável, é a que está em melhor situação e a que menos muda, mas ainda está à procura da fórmula adequada. De um pico de vendas, em seus melhores dias, de quase 5 milhões de cópias, fechou o último semestre com 3,37 milhões. Uma parte dessa redução é voluntária, pois está diminuindo o esforço de vendas das assinaturas, assim como vem cortando sistematicamente o tamanho da redação. Há vários anos altera seu foco editorial, mas as contínuas mudanças já realizadas – a última das quais a deixaram com a cara mais parecida com The Economist – indicam que ainda não encontrou um modelo satisfatório. Insiste, porém, em continuar sendo uma revista semanal de informação. Poderá ser a única dos Estados Unidos.
Curiosamente, como contraponto ao declínio das revistas tradicionais de informação, está emergindo nos Estados Unidos uma nova publicação semanal, com grande aceitação no mercado. O nome é The Week, homônimo de uma revista inglesa com o mesmo dono e o mesmo modelo. Como a Time dos primeiros tempos, The Week se limita a condensar, com um estilo próprio e muito personalizado, as melhores matérias de jornais e revistas do mundo inteiro – pelo uso das quais nada paga. Tem uma redação de apenas 15 pessoas, um décimo das outras revistas semanais. O resultado é espetacular, com as assinaturas crescendo e a publicidade em aumento. Nos Estados Unidos, vende mais de meio milhão de cópias, por preços mais elevados do que as três revistas estabelecidas e, em lugar de encolher, como as outras, tem planos de expansão.
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Jornalista, autor do livro Os Principais Jornais do Mundo; está preparando um trabalho sobre os jornais brasileiros