A Associação Nacional de Jornais, principal entidade representativa da imprensa brasileira, completa nesta semana 30 anos de existência. Entre os atos que marcam a celebração destaca-se a divulgação de doze casos de censura determinados pela Justiça desde julho do ano passado. O mais evidente deles, claro, é a proibição decretada pelo juiz federal Dácio Vieira ao jornal O Estado de S.Paulo de publicar informações sobre investigação que atinge o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado.
A maioria dos casos citados no relatório se refere a tentativas de candidatos a cargos eletivos de impedir a divulgação de fatos que consideravam prejudiciais a suas campanhas. Os jornais de terça-feira (18/8) citam o caso do Jornal Pequeno, do Maranhão, que também foi proibido de divulgar a operação policial que envolve Fernando Sarney.
A imprensa brasileira certamente está carregada de razões ao defender a liberdade de informação e denunciar a manipulação de decisões judiciais em favor de candidatos ou para proteger poderosos envolvidos em irregularidades. Trata-se de um direito fundamental do cidadão e um dos esteios do regime democrático. Mas, como tudo que envolve o noticiário tem o chamado ‘outro lado’, o leitor atento deve observar que falta, nas comemorações da ANJ, a necessária referência a eventuais abusos da própria imprensa.
Propriedade cruzada
No caso dos Sarney, que praticamente monopoliza as manchetes dos grandes jornais de circulação nacional há meses, convém lembrar que também eles possuem seus meios de comunicação. E que, com certeza, os jornais e emissoras sob controle dos Sarney praticam um jornalismo que anda na direção oposta à da tendência majoritária da imprensa nacional.
Convém também observar que, em todos os estados onde a imprensa é controlada por políticos, e onde os chamados jornais de circulação nacional não têm penetração relevante, a população fica à mercê dos coronéis da política que, coincidentemente, são também os senhores da mídia.
Ao comemorar três décadas de existência, em que alardeia sua luta por uma imprensa mais livre e mais moderna, a ANJ bem poderia anunciar o que tem feito pelos brasileiros que ainda são reféns da imprensa manipulada por grupos de interesse político e econômico por todo o país.
Poderia, por exemplo, aceitar o debate sobre a propriedade cruzada dos meios de comunicação e sobre a escandalosa concentração de concessões de rádio e televisão em mãos de parlamentares.
Observatório na TV
O programa televisivo do Observatório da Imprensa debate, na terça-feira (18/8), o episódio da chamada ‘censura togada’, que proibiu o jornal O Estado de S.Paulo de publicar qualquer notícia sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que tem como um dos acusados o empresário Fernando Sarney. A decisão do desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, vem sendo condenada por juristas, políticos, e, claro, por quase toda a imprensa.
Mas o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, já declarou que não vê implicações políticas na decisão judicial. O que isso significa? Afinal, a liberdade de imprensa é um direito absoluto?
O presidente do STF, que frequenta com muita assiduidade as páginas dos jornais, cobra do Judiciário mais rapidez no julgamento do recurso impetrado pelo Estadão contra a decisão do juiz Dácio Vieira, indicando que a lentidão da Justiça pode ser uma agravante no caso da medida cerceadora dos movimentos da imprensa.
O ministro Gilmar Mendes também aproveita para criticar o Ministério Público, afirmando que muitos promotores de Justiça e procuradores da República atuaram com motivação política, principalmente durante o governo Fernando Henrique Cardoso. O presidente do Supremo Tribunal Federal chegou a dizer que o Ministério Público deveria pedir desculpas e até indenizar o Estado por uso indevido da força de trabalho.
Num canto da reportagem que contém as declarações de Gilmar Mendes, publicada pelo Estado de S.Paulo, o leitor atento fica sabendo, quase por acaso, que o presidente do Supremo Tribunal Federal está sendo processado no Mato Grosso. Por iniciativa do Ministério Público Federal.
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