[do release da editora]
Ao se mudar de Curvelo (MG) para o Rio em 1932, aos 17 anos, Alceu de Paula Penna (1915-1980) partiu em busca de um sonho: conquistar o mundo como desenhista. Chegou bem perto disso. Tornou-se o primeiro e único brasileiro a publicar na revista americana Esquire; ensinou Carmen Miranda a gingar com a saia e escolheu as roupas do Bando da Lua; vestiu Marta Rocha no Concurso Miss Universo, em 1954; fez os figurinos dos espetáculos dos cassinos e dos teatros cariocas; e levou a moda brasileira para todo o planeta com os figurinos que ele mesmo criou para os monumentais eventos da Rhodia na década de 1960.
O que pouca gente sabe foi que Alceu se tornou também um dos pioneiros das histórias em quadrinhos no Brasil. E é essa história que aparece em detalhes no livro Alceu Penna e as garotas do Brasil, de Gonçalo Junior, que está sendo lançado pelo CLUQ (Clube dos Quadrinhos). Com mais de 200 imagens, a obra revela que, entre 1938 e 1941, o artista adaptou para o tablóide O Globo Juvenil, de Roberto Marinho, quatro clássicos da literatura mundial, dois deles com roteiros de ninguém menos que Nelson Rodrigues: O sonho de uma noite de verão, de William Shakespeare; Alice no país das maravilhas, de Lewis Carrol; Um yankee na corte do Rei Artur, de Mark Twain; O fantasma de Canterville, de Oscar Wilde; e O mágico de Oz, de L. Frank Baum.
Nesse período, Alceu se tornou o único brasileiro a publicar no jornal de Marinho. No total, ele produziu mais de 120 pranchas, sempre em tamanho tablóide e divididas em capítulos. Nelson assina O Fantasma de Canterville e O mágico de Oz. Mas, segundo Tereza Penna, irmã do desenhista, o ‘Robin’ que aparece como autor das outras duas versões era um pseudônimo do cronista, escritor e dramaturgo.
Traço inconfundível
Alceu voltou a produzir quadrinhos na década de 1950, na revista feminina A Cigarra, de Assis Chateaubriand, em parceria com Álvaro Armando. Os dois criaram um personagem único nas histórias em quadrinhos brasileiras, ‘Marido de Madame’. Tratava-se de uma inteligente série cujos diálogos eram escritos sempre com rimas, como se fossem literatura de cordel. A série, publicada durante meia década, revelou-se um experimento sofisticado que não seria repetido por outros artistas de gibis durante muito tempo.
Sempre com duas páginas, contava o cotidiano dos personagens Gonçalo e Lolita, um típico casal de classe média alta carioca dos anos 1950. Ela era uma bela jovem senhora que parecia não conhecer o preço de tudo aquilo que comprava praticamente todos os dias. E ainda adorava dar ordens ao marido. Ele era o sujeito baixinho, boa-praça e de óculos arredondados que não media esforço para satisfazer a mulher e, ao mesmo tempo, conter seus dispendiosos impulsos consumistas.
O autor revela também como a coluna ‘As Garotas’, de Alceu, publicada durante 26 anos, entre 1938 e 1964, ajudou a transformar O Cruzeiro num fenômeno editorial. Mostra que o traço singular e os tipos de letras que ele estabeleceu nas páginas da publicação influenciaram a imprensa, a publicidade, o design, a moda e o comportamento em todo país. Basta folhear revistas e jornais entre as décadas de 1940 e 60 para perceber que anúncios, estilo de paginação das revistas e editoriais de moda traziam sempre a mesma marca: o traço inconfundível de Alceu.
O autor
Gonçalo Junior é formado em Jornalismo e Direito. Entre 1996 e 2003, trabalhou no caderno ‘Leitura de Fim de Semana’, da Gazeta Mercantil. Em 2001, publicou o livro País da TV, pela Conrad Editora. Em 2004, participou de Glória In Excelsior – ascensão, apogeu e queda do maior sucesso da televisão brasileira, organizado por Álvaro de Moya para Imprensa Oficial de São Paulo.