Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Confecom marcou democracia brasileira

Ao aproximar a sociedade das discussões sobre a mídia, a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) demonstrou que a comunicação é um bem público, e não somente a política de alguns. O amplo debate proporcionado pelo encontro nacional marcou a democracia brasileira.

O diálogo entre a sociedade civil, sociedade civil empresarial e o poder público é outro exemplo desse exercício democrático. Para Rosane Bertotti, secretária de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e representante da entidade na Coordenação Executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), esse intercâmbio evidenciou o conflito de interesses que existem em uma sociedade de classes como a brasileira. E justamente por isso, afirma a dirigente, a conferência foi uma experiência rica de democracia.

Propostas de diálogo social

Quais os reflexos já percebidos do grande debate pró-comunicação no Brasil após a Confecom? A questão da democratização da comunicação entrou definitivamente na pauta nacional?

Rosane Bertotti – A Conferência Nacional de Comunicação marcou a democracia brasileira e a história da comunicação. Ela conseguiu colocar a democratização da comunicação na pauta, quando discutiu a comunicação não mais como uma política de alguns, e sim como uma política do Estado. Agora, temos a clareza que essa agenda não se esgotou. Por isso a importância do processo conferencial e da Conferência em si. Haja vista, por exemplo, o projeto de banda larga e as questões que dialogaram com o Plano Nacional de Direitos Humanos, uma vez que a Conferência demarcou a comunicação como um direito de todos e de todas. Esses pontos têm a ver com o resultado explícito da Conferência.

Como os sindicalistas representados pela CUT foram envolvidos pela Confecom?

R.B. – A CUT participou desde o princípio, assumindo como sua bandeira de luta a realização desta primeira Conferência Nacional de Comunicação. Por isso realizou o Encontro Nacional de Comunicação (leia aqui), cujo tema central era a construção de uma proposta cutista para a Conferência; elaborou uma cartilha com vinte e cinco mil exemplares, distribuída para todos os estados; fez encontros e debates com seus filiados; as CUTs estaduais participaram de forma muito ativa, incorporando quase todas as Comissões Estaduais, participando das Conferências Estaduais, mas acima de tudo, elaborando as propostas, defendendo não apenas aquelas do mundo do trabalho, mas as que têm a ver com a democracia brasileira.

A CUT fez ainda uma articulação importante com as entidades filiadas que integravam a Comissão Organizadora Nacional, como a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e com a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão (Fitert), e outras entidades como a Federação Brasileira de Trabalhadores em Telecomunicações (Fitel) e a Federação Nacional dos Empregados em Empresas e Órgãos Públicos e Privados de Processamento de Dados (Fenadados), que também têm conhecimentos técnicos da área.

Outra ação significativa feita pela CUT foi o contato com as demais centrais sindicais, chamando-as a assumir para si a pauta da Conferência, as propostas do diálogo social e a necessidade de uma conferência tripartite, reforçando a importância de ter os empresários e o poder público nessa discussão.

Democratização da comunicação

As questões levadas pela Central foram bem encaminhadas nos debates da Confecom?

R.B. – Para a CUT não existe democracia plena sem a democratização da comunicação e essa foi a pauta principal levada à Conferência. Nesse sentido, entendemos que propostas como a criação do Conselho Nacional de Comunicação e de políticas regulatórias do setor foram bem abarcadas por ela.

Alguns debates específicos do mundo do trabalho não foram completamente efetivados, como, por exemplo, a proposta da antena sindical. Mas esse projeto obteve 56% de aprovação em uma conferência tão adversa, então podemos dizer que foi apreciado e discutido. Questões como essas demonstram que nós precisamos continuar com o debate, a articulação e a mobilização social.

Como a CUT pretende acompanhar o prosseguimento das demandas após a Confecom?

R.B. – A CUT já está acompanhando. Na semana passada, inclusive, tivemos uma audiência na Secretaria de Comunicação da Presidência para discutir um pouco quais são as prioridades do governo e como ele pretende colocá-las em prática. O Conselho de Comunicação, por exemplo, foi defendido pelo governo e precisamos garantir a sua efetivação.

Além disso, vamos continuar nos articulando com o FNDC, pois entendemos que o Fórum é um espaço amplo e importante na elaboração e na luta pela democratização da comunicação. Continuaremos também a levar essa pauta nas nossas mobilizações; a evidenciar esforços na coordenação dos movimentos sociais, que veem a comunicação como uma questão estratégica; e vamos continuar a articulação com as demais centrais sindicais. E se necessário for, ocuparemos as ruas desse Brasil com a grande bandeira pela democratização da comunicação.

Cobertura da mídia, um desserviço

Qual é a sua avaliação sobre o processo de construção da Confecom e o diálogo entre os três setores: sociedade civil, sociedade empresarial e poder público?

R.B. – Nós vivemos numa sociedade de classes e que tem interesses antagônicos entre si. Por isso a construção da Conferência teve todos os percalços e a riqueza que teve. Fazer uma conferência tripartite com a participação do setor empresarial, do poder público e das organizações da sociedade civil do mundo do trabalho, significou entender a comunicação como um processo que envolve todos e todas as brasileiras.

Representou que, embora algumas pessoas tenham o monopólio da mídia, elas não detêm o monopólio da estrutura, e, por isso, precisamos atuar fortemente num rearranjo do sistema de comunicação brasileiro. Demonstrou também que vamos continuar por um longo tempo em uma sociedade com luta de classes – quero reafirmar isso – onde teremos de um lado os empresários e de outro os trabalhadores. Mas evidenciou também que o Estado precisa assegurar o seu papel enquanto indutor e gestor de políticas públicas.

Como você avalia a cobertura da mídia sobre a Confecom?

R.B. – Nenhuma outra conferência teve tanto espaço na mídia quanto a Conferência Nacional de Comunicação. O problema é a forma. Grande parte da mídia quando falou sobre a Conferência não a explicou devidamente, não disse qual era a sua pauta. Não informava, e sim expressava a sua opinião a respeito dela. Como não estava na conferência propriamente dita, usou os seus meios para fazer um desserviço à sociedade brasileira. Precisamos ressaltar, entretanto, o quão importante foram as coberturas da RedeTV!, da Rede Bandeirantes, da TV Brasil, que mostrou vinte e quatro horas a conferência, das mídias alternativas, como a Rede Abraço, e alguns blogs e revistas.

Articulação garantiu a unidade

Quais devem ser as bases para um novo marco regulatório da comunicação brasileira?

R.B. – Primeiro esse novo marco deve compreender a comunicação como um direito, um bem público. Portanto, ela deve ser tratada como política pública e assim ter participação social, transparência e regras claras. E ele tem que respeitar o processo das diferenças, olhar para o Brasil, dos brasileiros e das brasileiras, dos brancos e dos negros, e de toda a diversidade sexual. Tem que respeitar o processo cultural do país e as diferenças de classes.

Como você avalia a participação do FNDC na Confecom?

R.B. – A Conferência é fruto de uma proposta do FNDC, e das entidades que o compõem, durante uma de suas Plenárias. Foi ali que nasceu a ideia da conferência. O Fórum teve um papel fundamental, porque grande parte das entidades da sociedade civil não empresarial que compunham a Comissão Organizadora integram o FNDC.

Entidades como a CUT, a Fenaj a Fitert e a Abraço, embora tenham representatividade própria, conseguiram, articuladas dentro do FNDC, conduzir o processo de uma maneira mais coesa e decisiva, garantindo o brilho da Conferência. Essa articulação garantiu a unidade das entidades, a união nas propostas, a participação em todos os estados e a constituição de algumas conferências municipais e estaduais. Mas, principalmente, consolidou a própria Conferência e o FNDC, como um ator que articula as políticas para a democratização da comunicação.