Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Contra o remanso ideológico

Este livro foi escrito com a intenção de abordar de forma não rotineira as técnicas do jornalismo, a partir da primeira delas – a produção de textos. A finalidade é fugir do remanso ideológico em que estão confinados geralmente os estudos de nossa profissão, que alguns endeusam como sacerdócio essencial à democracia e outros reduzem a mero instrumento de controle da opinião pública pelos detentores de poder político e econômico.

A primeira distinção que se faz considera em diferentes níveis a notícia, a cobertura de fatos em processo em um lapso de tempo – um dia, uma semana – e a reportagem temática ou narrativa. Propõe-se o conceito de lead não como invento da indústria cultural mas como adaptação da maneira tradicional de transmitir informações singulares, objeto das máximas de Paul Grice e do conceito de relevância esmiuçado por Dan Sperber e Deirdre Wilson.

As diferentes formas de apresentação dos textos jornalísticos parecem conformar-se ao que se pretende com eles. Se informar é o que se quer, há certamente possibilidade de construir um discurso, se não objetivo, pelo menos voltado para o objeto; a distorção, aí, só poderá ser explicada com o recurso à cultura ou à História. O problema real se coloca quando se tenta impor uma interpretação como a única válida ou se atribui natureza indiscutível à opinião.

Outro parâmetro do texto ancora na mídia utilizada. O radiojornalismo tornou-se coloquial, íntimo e geralmente prolixo. O telejornalismo, com o surgimento dos equipamentos portáteis de captação de imagens, a pluralidade de canais e a facilidade de edição eletrônica, evoluiu rapidamente para incorporar técnicas de cinema nos mini-documentários em que se transformam as reportagens. O jornalismo impresso varia entre a especialização, a denúncia e o engajamento.

Não existem ainda condições para estabilização de uma técnica própria para o jornalismo na web, porque os equipamentos estão em constante atualização, de modo que várias gerações deles – computadores e meios de acesso – estão em uso simultaneamente; a melhoria das condições de transmissão de vídeo, por exemplo, tem potencial para provocar mudanças radicais na internet, afetando, entre outras coisas, os conceitos correntes de propriedade intelectual.

Durante todo o século 20, as técnicas do jornalismo foram consideradas desprezíveis pelos que viam e ainda vêem a profissão pela dimensão única da política. Hoje, quando computador incorporou toda tecnologia antes distribuída por equipes de trabalhadores blue collars, já não tão fácil sustentar essa falácia. Bons jornalistas escrevem mas também editam, programam rádio e, com certeza, em futuro, terão habilitação mínima para fotografar e gravar imagens em movimento.

Nesse sentido, creio que o texto que vão ler poderá animar os especialistas nessas habilidades a produzirem material didático sobre elas, sem precisar desculpar-se pela caretice.

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São os seguintes os tópicos de Teoria e Técnica do Texto Jornalístico: Os estilos e seu tempo; O texto moderno; A globalização do estilo; O texto das notícias impressas; Texto e lógica; Modelos da realidade; Linguagem jornalística; O texto da reportagem; Textos na mídia eletrônica.

Como se trata de livro técnico com intenção didática, as falhas observadas nesta 1a. edição serão objeto de uma errata na página da editora, disponível a partir de meados de outubro.

O autor

Nilson Lage é jornalista, professor titular da Universidade Federal de Santa Catarina desde 1992. É doutor em Lingüística, mestre em Comunicação e bacharel em Letras. Foi professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade Federal Fluminense e de instituições particulares.