Existe um descompasso entre a quantidade cada vez maior de biografias à disposição do leitor brasileiro e a ainda reduzida reflexão sobre o gênero biográfico nas universidades. Foi esse o motivo para eleger o tema como um dos mais importantes a serem discutidos em evento de crítica literária realizado há uma semana no Itaú Cultural, em São Paulo. “O território é ainda pouco explorado no campo dos estudos literários”, avalia uma das curadoras, Maria Esther Maciel, escritora e crítica literária, professora da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). “Existem exceções, mas o gênero não foi devidamente valorizado.”
Marisa Lajolo, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), e Italo Moriconi, da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), lembraram no evento do quanto as biografas costumam ser mais exploradas e estudadas em lugares como Reino Unido e França -nesses países, são vistas também como parte da história intelectual. Lajolo ressaltou que, independentemente do que ocorre na academia, a biografia dos autores sempre foi uma das principais âncoras do ensino de literatura nas escolas e de grande interesse da maioria dos leitores. “Em última análise, a biografia é lida pelo público como um grande romance”, disse Lajolo, que lançou uma biografia romanceada de Gonçalves Dias para o público infanto-juvenil, O Poeta do Exílio.
Para Moriconi, é preciso fazer com que os alunos aprendam a produzir boas pesquisas biográficas, cronologias e resumos de livros. “Parecem coisas simples, mas estudantes têm dificuldade de fazer isso”, avalia. Autor do perfil Ana Cristina César: o Sangue de uma Poeta e organizador da coletânea Caio Fernando Abreu: Cartas, Moriconi explicou que autores contemporâneos têm borrado cada vez mais a fronteira entre a autobiografia e a ficção.
Ao seu lado na mesa, a crítica literária Leonor Arfuch, autora de O Espaço Biográfico, citou Jorge Luis Borges, que brincava com a ideia da impossibilidade de ser retratado dando entrevistas falsas.
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[Josélia Aguiar é colunista da Folha]