Todos os anos, durante cinco semanas no verão, a Escola de Livros Raros da Universidade da Virgínia atrai 400 bibliotecários, conservadores, acadêmicos, vendedores, colecionadores e bibliófilos para cursos intensivos, de uma semana de duração, ministrados num ambiente que une a intensidade de um seminário, o caráter nerd de uma convenção de fãs de Jornada nas Estrelas e o clima de camaradagem de um acampamento de férias.
Vic Zoschak, de Alameda, na Califórnia, é piloto aposentado da Guarda Costeira e hoje dono de uma livraria de obras antigas. Ele fez seu primeiro curso na escola em 1998; desde então, já retornou para outros 14. “Pilotar missões de busca e resgate era um trabalho que me realizava”, disse. “Mas aqui eu encontrei pessoas do meu tipo.”
Para muitos, a Escola de Livros Raros representa uma oportunidade importante para fazer contatos úteis. Mas ela também preenche um nicho intelectual valioso, ensinando habilidades e conhecimentos que vêm sendo deixados de lado por escolas de biblioteconomia cada vez mais voltadas à tecnologia e departamentos de literatura cada vez mais imersos na teoria.
Trazer de volta aos estudos literários uma compreensão dos aspectos físicos do livro é algo do qual o padre jesuíta Michael Suarez, especialista formado em Oxford em literatura britânica do século 18 e, desde 2009, diretor da escola, fala com fervor quase missionário.
“Um livro é o fruto de uma coalizão de intenções humanas”, disse, usando uma frase repetida com frequência na escola. “Achamos que sabemos ler o livro porque sabemos ler a língua. Mas a leitura implica em muito mais que simplesmente a linguagem do livro.” O ambiente na Escola de Livros Raros é casual e igualitário, não obstante a presença entre o corpo docente de alguns dos maiores especialistas mundiais na história dos livros.
Passagem do tempo
A iniciação nas complexidades da história do livro é feita em palestras e sessões em laboratório, onde os estudantes aprendem a olhar mais além das palavras escritas no papel, recuperando o momento em que a tinta foi colocada sobre a página. Numa sala de leitura no andar de cima da Biblioteca Alderman, da universidade, certa manhã, alunos do curso de Bibliografia Descritiva Avançada se debruçavam sobre livros, armados com fitas métricas e pequenas espadas de luz chamadas Zelcos, vasculhando as páginas em busca de filigranas, linhas e outras pistas que pudessem indicar a origem de uma folha dada: uma forma específica de uma fábrica específica de papel.
O objetivo do curso de Bibliografia Descritiva Avançada é determinar com precisão como as páginas de um livro foram dobradas, cortadas, impressas e reunidas.
Mas a Escola de Livros Raros não se limita a estudar obras-primas da impressão. O que torna a experiência singular, dizem os alunos, é a oportunidade de ver e tocar vários objetos da coleção de 80 mil livros da escola, incluindo muitos que foram dobrados, manchados, encharcados de água, sobrescritos, devorados por traças ou, em alguns casos, totalmente eviscerados.
“Nós nos interessamos pelo modo como os livros são marcados pela passagem do tempo”, disse Barbara Heritage, diretora da escola e curadora da coleção.
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[Jennifer Schuessler, do The New York Times]