Relação dos jornalistas profissionais registrados no Brasilme saiu um pouco salgado num dos sebos do Rio de Janeiro. Mas não hesitei em comprar o volume, muito mal conservado, de 160 páginas. Foi editado pelo Serviço de Documentação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Não tem qualquer data nem a menor indicação de época. Apenas o nome de quem foi o dono do livro: Soter.
O dito cujo deve se chamar Soter Ferreira de Paula. Debaixo desse nome está a única anotação feita no livro, em caneta hidrocor de tinta vermelha. Soter foi registrado como jornalista com o número 270 na Delegacia Regional do ministério em São Paulo, que tinha pouco mais de seis mil, abaixo apenas do Rio, que ainda era a capital federal. O primeiro é Luiz Silveira e o último, Oscar Augusto de Camargo. O antepenúltimo eu conheci: Paulo Affonso Grisolli, que trabalhou na TV Globo.
Apesar de não ter data indicada, o que constitui uma falha surpreendente para um órgão oficial, o livro deve ter sido editado na década de 1950. Nessa época, a delegacia do trabalho no Pará possuía o registro de 143 jornalistas profissionais.
O professor Themístocles Santana Marques é o número um da relação. S., como assinava os seus artigos, foi um dos mais importantes jornalistas paraenses. Era o responsável por O Estado do Pará, fundado por Afonso Chermont. Quando o jornal fechou, passou para a Folha do Norte. Escrevia muito bem. Era bem ponderado nas suas análises, mas não tão independente quanto parecia. Como muitos dos jornalistas dessa época, tirava mais rendimento das suas atividades no setor público.
Logo depois dele vêm Orlando de Moraes, João Malato Ribeiro (um dos mais ferinos articulistas, com intensa e extensa participação na vida pública estadual), Armando Vieira de Mendonça, Antenor Cavalcante, Paulo Eleutério Alves da Silva, João Motta de Oliveira, Manoel Ferreira de Azevedo e Ildefonso Tavares.
Trajetória documentada
A partir desses 10 primeiros jornalistas com registro profissional no Pará, seguem-se alguns dos nomes mais conhecidos, pela ordem cronológica: Carlos Augusto de Mendonça (número 20), José Hermógenes Barra (21), Lindolfo Mesquita (23), Bianor Penalber (27), Paulo Eleutério Cavalcante da Silva, Pedro da Silva Santos (primeiro presidente do sindicato dos jornalistas), Georgenor Franco, Anaxágoras Gomes Barreiro (repórter de polícia, que viria a ser personagem de Haroldo Maranhão no romance Rio de raiva), José Sampaio de Campos Ribeiro, Rogero Cabral, Laurentino Soares, João Maranhão, Paulo Maranhão (50), Daniel Coelho de Souza, Diogo Costa, Levi Hall de Moura, Clóvis Maranhão, Sandoval Lage da Silva, Everardo Guilhon, Arnaldo Moraes Filho, Ossian Brito, Edyr Proença, Antero Soeiro, Haroldo Maranhão (73), Mário Rocha, Cunha Gonçalves, Orlando Zoghbi, Osvaldo Mendes (80).
E mais: Jaime Barcessat, Armando Mendes, Cláudio Augusto de Sá Leal (o maior jornalista de retaguarda da imprensa paraense), Milton Trindade (que foi senador e dirigiu os Diários Associados), Francisco Cronje da Silveira, José Tomaz Maroja, Raimundo de Souza Moura, Álvaro Tupiassu, Pádua Costa, Júlio de Alencar, Geraldo Palmeira, Carlos Castro, Elmiro Nogueira, Cunha Coimbra, Dejard de Mendonça, Cyro Proença, Ismaelino de Castro (111), Caubi Cruz, Lameira Bittencourt (senador), Egídio Sales, Benedito José de Carvalho, Maria Lúcia Bentes Pinheiro (primeira mulher registrada como jornalista, sob o número 120).
E ainda: João Botelho, Ápio Campos, Carlos Platilha, Evaristo Cardoso, José Coutinho de Oliveira, Leonam Cruz, Raymundo Cavaleiro de Macedo, Peri Augusto, Lobão da Silveira (senador), Hamilton Moreira, Carlos Vítor Pereira (irmão de Dalcídio Jurandir), Raimundo Noleto, Eunice Favacho (segunda mulher), Victória Gonçalves, Flaviano Pereira, Mário Faustino (o poeta, número 140), Helena Cardoso e Leão Álvares de Castro.
Nessa época, jornalista não pagava imposto de renda, tinha direito a desconto de 50% nas passagens aéreas e a financiamento integral da casa própria. Daí muitas pessoas procurarem uma forma de participação ou colaboração na imprensa para ter esses privilégios, eliminados pelo presidente Castelo Branco, o primeiro do ciclo militar pós-1964.
A listagem de nomes permite acompanhar e reconstituir a trajetória da imprensa no Pará. Nessa época o Amazonas tinha 63 jornalistas registrados (o último deles, Umberto Calderaro, dono de A Crítica, por muitos anos o líder de mercado em Manaus). No Maranhão havia 87.
***
[Lúcio Flávio Pinto é jornalista e editor do Jornal Pessoal (Belém, PA)]