Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O abalo dos anos 60

5 Anos que Abalaram o Brasil (de Jânio Quadros ao Marechal Castelo Branco), de Mário Victor, é um livro de 632 páginas, editado pela Civilização Brasileira, de Ênio Silveira, no fervente ano de 1965. É trabalho do melhor jornalismo, a crônica diária de um quinquênio conturbado da história republicana. Na época do lançamento eu o li com avidez e proveito. Mas parece ter sido esquecido. Talvez por ser puro jornalismo factual. Talvez por preconceito acadêmico. Mas não merecia ficar no fundo do arquivo.

O desembargador Augusto Borborema, que foi governador substituto e presidente do Tribunal de Justiça do Estado no início do século XX, também o leu, naquele mesmo ano. Encontrei seu exemplar num sebo de Belém, todo riscado a caneta (o que não se deve fazer; sempre usar o lápis). Na época, o livro andou sendo perseguido pelo regime militar, como a própria editora, tida por subversiva.

Um dos assuntos que interessou a Borborema foi o resultado da primeira comissão de inquérito administrativo, instaurada no governo de Jânio Quadros, em 1961, para apurar irregularidades na SPVEA (Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, antecessora da Sudam). A comissão concluiu pela irregularidade no uso de 350 milhões de cruzeiros na gestão de Valdir Bouhid, que integrava o PSD “baratista” do Pará e foi governador por duas semanas, numa “Operação Bananal”, em conjunto com a Fundação Brasil Central. A aprovação foi dada pelo então presidente Juscelino Kubitscheck, do mesmo partido.

A punição recomendada foi a destituição do responsável pelo desvio, mas Bouhid já havia deixado a SPVEA. Restava cobrar-lhe as responsabilidades civil e penal, “configurada, simultaneamente, como peculato e como emprego irregular de verbas”.

O inquérito do governo JQ seria usado como uma das razões para o governo militar cassar o mandato de senador e os direitos políticos de Juscelino, em maio de 1964. A história é caprichosa.

***

[Lúcio Flávio Pinto é jornalista, editor do Jornal Pessoal (Belém, PA)]