Um filósofo francês de 95 anos de idade, Stéphane Hessel, publicou há pouco um panfleto de poucas páginas, com o título de Indignem-se (“Indignez-vous”). Nele, defende que os jovens de hoje devem retomar a indignação que sua geração tinha contra o nazismo e o capitalismo; adicionando a indignação contra o capital financeiro; a desigualdade; e a indiferença que tomou conta do mundo diante das injustiças e ineficiências do sistema econômico-financeiro.
É um bonito texto em menos de trinta páginas e que vem sendo vendido em grande quantidade.
Comprei a 13ª edição francesa na cidade de Hamburgo, Alemanha. Ao lado da livraria, em um café Balzac, de uma só vez li todo o texto e ali mesmo, inspirado no Hessel, que eu conheceria alguns meses depois, escrevi este Reaja. [Cristovam Buarque – Brasília, setembro 2011
Trechos
>> Reaja ao conceito de progresso baseado no crescimento econômico, que consome a vida das pessoas e destrói o equilíbrio ecológico em busca de aumentar a produção de bens materiais privados e de curta duração. Não aceite como lógica a riqueza medida pelo Produto Interno Bruto que inclui as armas como benefício e não inclui as mortes entre os custos. Não aceite como lógica o que não atende à razão ou ao sentimento.
>> Reaja contra uma civilização que produz quase setenta trilhões de dólares por ano, dez mil por cada pessoa, e tem crianças com fome, sem roupas, brinquedos, higiene. Sem escolas nem assistência médica. Reaja contra o triste futuro da civilização estampado nos olhos desses meninos e meninas pobres do mundo, não importa o país.
>> Não considere banal a paisagem urbana onde crianças estiram as mãos para pedir esmolas, nem a realidade social que entristece os olhos de mães com crianças no colo; crianças no colo só devem combinar com olhos alegres. Reaja à banalização da fome, do analfabetismo, da falta de escolas, de postos de saúde e hospitais. Não se acostume com tanques de guerra nas ruas, nem fuzis apontando para civis. Não veja poesia nesta rima maldita. Não se acostume com o fato de que, para acender a luz de sua casa, foi preciso destruir florestas, expulsar índios de seus hábitats, exterminar espécies biológicas e até biomas inteiros.
>> Não se acostume com o conforto pessoal que vem da concentração de renda e com o custo de destruição ambiental. Lembre que hoje não nos acostumaríamos com os privilégios da nobreza ou com a exploração de escravos. E naquele tempo todos estavam acostumados. Não se acostume agora com o luxo dos ricos ao lado da miséria dos pobres. Escravocratas são todos os que vivem indiferentes à pobreza que os rodeia.
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[Cristovam Buarque é senador (PDT-DF), foi governador do Distrito Federal, ministro da Educação e é professor da Universidade de Brasília]