Nasci do sexo feminino, mas me tornei de fato mulher quando percebi que meu desejo por um mundo melhor me fez descobrir o valor de reconhecer-se mulher em uma sociedade capitalista e gerada pelas regras do patriarcado. É preciso coragem para isso; para lutar contra valores subjetivos impostos em nossa sociedade; coragem para organizar a luta e ainda continuar com coragem para dizer em alto e bom som: sem medo de ser mulher, sem medo de ser feliz!
Ao longo da história da humanidade a sociedade tem se submetido aos princípios hegemônicos do capitalismo e do patriarcado. Em nossa luta por liberdade e igualdade, temos em nosso caminho uma inimiga atroz, a velha mídia, comandada por um pequeno grupo de pessoas que, na defesa dos interesses capitalistas das elites conservadoras continua a impor à sociedade seus valores discriminatórios, condicionando-a a perpetuar preconceitos arraigados durante séculos, de forma exponencial.
As produções da velha mídia se utilizam de todos os artifícios possíveis para fazer com que seus interesses comerciais e políticos prevaleçam: manipulação, mentiras, violência, desrespeito aos direitos humanos e reiteradas vezes, o desrespeito ao direito de ser mulher e de ser feliz.
Cotidianamente somos submetidas a inúmeros tipos de violência que nos perseguem desde os tempos mais remotos. Aristóteles, por exemplo, nos definia como um macho mutilado; Kant descrevia a mulher como pouco dotada intelectualmente e moralmente fraca.
Nos dias de hoje, a combinação sociedade de consumo e televisão é a principal responsável em tentar nos aniquilar, utilizando-se de um poderoso artifício: a sedução. A propaganda publicitária desde o seu surgimento mostra a mulher como produto de consumo, como parte integrante de um produto à venda, ou ainda, mostra o que a mulher deve fazer para transformar-se em um produto de consumo. No maravilhoso mundo da propaganda, a mulher é refletida a partir de estereótipos – como fúteis, submissas, pouco inteligentes, objeto sexual etc. Por isso na maioria das vezes aparece nos meios de forma voluptuosa, semi-nua (ou nua), ou então limpando a casa e cuidando dos filhos sozinha.
A televisão, que ainda detém a maior influência na população, nos impõe diariamente um único “padrão” de mulher – o idealizado no imaginário criado pela subjetividade, ignorando a diversidade racial e cultural de nosso país. Utilizando-se do erotismo e da violência, as grades de programação estão repletas de conteúdos que banalizam e culpabilizam a mulher, que mostram a fragilidade e a submissão como coisas naturais. Onde estão as mulheres de verdade na televisão?
Canto alto
É por isso e muito mais que a democratização dos meios de comunicação é urgente e nossa participação na construção de políticas públicas para o setor é fundamental. Reafirmamos o direito à comunicação como princípio e por isso lutamos pela construção de um novo marco regulatório para as comunicações, que respeite a pluralidade, a diversidade e que tenha controle social. Esse será apenas o início do processo de conquista da verdadeira democracia e liberdade de expressão.
No meu sonho por um mundo melhor figura o respeito, com mulheres e homens convivendo em igualdade de gêneros – na vida, no trabalho, nos espaços de poder e em todo o lugar. Mas, para poder cantar alto e em bom som o direito de ser mulher e de ser feliz, durante a vigília também é preciso lutar por novo marco regulatório. Nesta luta temos que ter o entendimento de que a comunicação é uma política pública e que as concessões de rádio e TV são um bem público e, portanto, é preciso ter mecanismos para a garantida de controle social – para que a imagem da mulher e de outros atores sociais não seja mais deturpada, caluniada, desrespeitada, explorada, violentada, descaracterizada e até mesmo caricaturada.
O estudo a seguir nos dará importantes subsídios para este enfrentamento e inspiração para insistirmos na luta por mudanças nas leis que regem a comunicação no Brasil.
Na vida real eu sonho e canto alto, porque ser mulher me deu coragem de não ter medo de ser feliz. E é por isso que continuo a lutar.
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[Rosane Bertotti é secretária nacional de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC)]