Volta e meia mergulho no velho oceano de livros, em busca de preciosidades. Os sebos são lugares arriscados e fascinantes. E um dos maiores prazeres do leitor insaciável é encontrar, nos recantos nem sempre bem iluminados, nas estantes nem sempre bem organizadas, livros esgotados… ou perdidos.
Não são obras raras, não são edições do século retrasado — são títulos das décadas de 70, 80, 90… títulos cujas editoras parecem ter rejeitado por medo de competir com os best-sellers que invadem as livrarias, ou com livros mais modernos e badalados do que aqueles que fizeram certo furor em passado recente… mas tornaram-se prematuramente obsoletos.
O saco de gatos, da Professora Walnice Nogueira Galvão, por exemplo (editora Duas Cidades). Estava lá, quieto, escondido, bem conservado, preço ínfimo, numa segunda edição (1976) que não chegou à terceira.
Outro feliz achado: Sob o signo de Saturno, de Susan Sontag (L&PM), também em segunda edição (1986), estudos interessantes a que, por enquanto, o leitor brasileiro não terá acesso muito fácil.
A editora Ampersand parece não querer relançar um excelente livro que encontrei por sorte, na impensável seção de turismo… A jornada do escritor, de Christopher Vogler, sobre as estruturas míticas subjacentes às grandes histórias, filmes, romances… A primeira e derradeira edição é de 1997.
Penúria, ausência
Livro indispensável para a formação dos jornalistas: A língua envergonhada, de Lago Burnett; encontrei-o envergonhado, mudo, empoeirado, terceira edição (revista e aumentada) pela Nova Fronteira (1991). E o mais impressionante é que esse livro esgotadíssimo está incluído na bibliografia básica do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina! Os alunos, certamente, terão de recorrer à fotocópia.
Mergulho mais fundo nos mares sebísticos, e vejo dois olhos iluminados me observando atentamente. É a capa de um livro do prestigioso Nicola Abbagnano, a coruja ilustrando A sabedoria da filosofia: problemas da nossa vida, pela editora Vozes, numa edição antiqüíssima: 1989! O preço exorbitante de R$ 10,00. Na Itália, lançada em 1985, esta obra já ultrapassou as quinze edições. Aqui, estacionou e desapareceu na primeira.
De fato, um dos grandes problemas da nossa vida de leitores brasileiros é esta sensação de penúria, de ausência. Nada contra os livros da última hora, os livros acompanhados de produções cinematográficas, os livros de sucesso. O insucesso está em que não possamos encontrar e ler os livros perdidos, perdida qualidade…
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Doutor em Educação pela USP e escritor (www.perisse.com.br)