Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Fruto de uma praxis

Carlos Tourinho é uma daquela pessoas que dispensa apresentações. Ao menos no Espírito Santo, é respeitado no meio jornalístico por seus mais de 25 anos como repórter, apresentador, editor e chefe de reportagem; e junto ao público, pela seriedade e profundidade com que sempre tratou questões relevantes para a região em entrevistas, reportagens, séries e programas de TV.

Perguntei-me, então, qual o sentido em escrever uma apresentação para seu mais recente livro? Encontrei a resposta ao olhar no retrovisor que mostra nossas trajetórias profissionais, desde nosso tempo de reportagens e parcerias, passando pela encruzilhada que nos separou profissionalmente já se vão 15 anos: ele, dando continuidade a sua carreira de sucesso como jornalista ‘do batente’, e eu, optando por desbravar novos caminhos pelo mundo acadêmico. Como em um Vale a pena ver de novo, lembrei de diversas conversas que tivemos ao longo dos últimos anos sobre o que estava acontecendo na prática e na formação em telejornalismo; e um ponto recorrente era exatamente o tema que ele traz para este livro: a inovação. Ele, sempre mais empolgado; eu, na maioria das vezes mais cético.

Para os mais desavisados, que podem pensar que esta obra trata apenas de temas tecnológicos ligados ao jornalismo, vai um alerta: o coração de Inovação no Telejornalismo: o que você vai ver a seguir está na constatação de que, diante das peculiaridades desta atividade, as estratégias empresariais perdem espaço para a subjetividade dos jornalistas que assumem funções de gestores. Desta forma, Carlos Tourinho constata que a decisão de se inovar no telejornal acaba sendo tomada a partir de critérios pessoais e informais e não a partir de protocolos ou normas previstas pela empresa de mídia.

Jornalismo e entretenimento

Falar de inovação é sempre muito arriscado, mas Tourinho não cai na armadilha do discurso fácil do determinismo tecnológico, ele rende-se a uma reflexão mais crítica de que as lógicas sociais são, no fundo, o gerador de qualquer processo de inovação. Os textos sagrados já alertavam há milhares de anos que ‘se é encontrada alguma coisa da qual se diz: `veja, isto é novo´, ela já existia nos tempos passados’. É a trágica constatação para os futurólogos de plantão: ‘Não há nada de novo debaixo do sol’.

Navegando nesta dialética, a narrativa do livro se confunde entre a da pesquisa acadêmica, uma grande reportagem e a de historia de vida, já que Tourinho vivenciou no dia-a-dia boa parte do que é aqui apresentado. Ele se valeu de referenciais tanto da Comunicação como da Economia para confrontar sua praxis; fez um levantamento bem didático dos caminhos e descaminhos do telejornalismo no Brasil; e realizou um estudo comparativo de diferentes gêneros da televisão e de novas mídias que surgiram em meio às crises deste fin de sciècle/ début de millenaire.

Duas das características das dinâmicas que envolvem as indústrias culturais são a constante renovação da oferta e o fator de variabilidade e imprevisibilidade da demanda. O ‘novo’ sempre é apresentado como um diferencial, mas de nada adianta se o telespectador se sentir atraído por outra ‘novidade’, mesmo que não esteja na emissora líder. A inovação no telejornalismo tenta atender a ambas características, pois está sempre ‘inventando algo novo’ ou, na maioria dos casos, requentando com outra roupagem modelos passados. Tudo na busca dos índices de audiência, e, consequentemente, do anunciante, este sim o cliente fim da televisão. Já que, como a teoria ensina, o produto à venda na televisão não são os programas, e sim sua audiência.

Neste livro, apesar do destaque dado ao telejornalismo da Globo, Tourinho também cita casos como o Aqui Agora, o Jornal de Vanguarda, o Abertura, o Repórter Esso e o recente CQC. E o que também é bem enriquecedor, é que não se prende aos programas informativos. Ele navega por outra categoria – o entretenimento – e alguns de seus gêneros, como os musicais, os humorísticos e a telenovela.

Leitura necessária

No mercado há uma máxima de que em time que está ganhando não se mexe. O problema para estas empresas que ousam pouco e têm medo de inovar é que a concorrência não está mais no canal ao lado, mas na inovação que vem dos usos que o receptor vem fazendo das tecnologias. Via uma câmera no celular e um programa de computador para subir seus vídeos no YouTube, ou mesmo enviando online para as emissoras convencionais, cada espectador começa a se tornar um emissor em potencial.

Mas será que os profissionais de televisão estão preparados para tais inovações? Há formação para isso? No fundo, o espírito do jornalista continua o mesmo, assim como o espírito dos professores de Jornalismo. Observo algo como um ‘nossos discos ainda são os mesmos e as aparências já não enganam não’; e apesar de fazermos tudo o que estamos fazendo, ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais.

Um caminho seria uma maior proximidade dos veículos com as escolas e vice-versa. Nas áreas tecnológicas, onde, aí sim, ‘inovação’ é a palavra de ordem, pesquisadores universitários e engenheiros do mercado compartilham não apenas laboratórios instalados no campus ou na empresa, como conhecimento e avanços. Na nossa área tais contatos são raríssimos. Mercado e academia se comportam como inimigos, e quem acaba perdendo é a sociedade.

Felizmente há profissionais como Carlos Tourinho para fazer esta mediação. Sem largar o dia-a-dia da redação, quer constantemente se aperfeiçoar buscando reflexões teóricas e, o mais importante: não guarda para si suas inquietações; ousa em publicar e provocar o debate.

Este livro é fruto desta praxis, por isso leitura necessária não só para jornalistas e estudantes, como também para empresários e gestores do setor; mas, sobretudo, é um livro para ser lido por quem assiste a telejornais.

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O autor

Carlos Alberto Moreira Tourinho é jornalista profissional há 25 anos, chefe de reportagem e editor de Séries Especiais na TV Gazeta (afiliada Rede Globo no Espírito Santo). Graduado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Espírito Santo, pós-graduado em Economia para Jornalistas na mesma universidade e em Estudos Avançados de Comunicação pela Faculdade Cândido Mendes, é autor dos livros 10 desafios para a gestão pública no Espírito Santo (2006) e Jornalismo Regional e Optativo na Rede Globo (2007), além de colaborador em outras publicações. É membro da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom)

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Jornalista, professor do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco e diretor de Relações Internacionais da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom)