Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Gastando um pouco e, depois, um pouco mais

Muito antes do que a maioria, Rupert Murdoch percebeu que a China poderia ser um prêmio financeiro sem igual. Ainda em meados da década de 80, por ocasião de sua primeira visita – acompanhado por Anna, então sua mulher, e seus filhos em idade escolar –, o magnata das comunicações australiano teve um jantar com os dirigentes.

Por grande parte dos vinte anos que se seguiram, Murdoch tentou conquistar a China. Sua meta inicial era a de criar uma rede de televisão por satélite que absorvesse parte da publicidade – atualmente calculada em 50 bilhões de dólares por ano – vendida a empresas de comunicação estatais. De saída, os chineses o incentivaram, mas depois recuaram. Por fim, derrotaram-no, vencendo-o em seu próprio jogo. Murdoch esperava que quanto mais investisse, mais cedo brotariam antenas parabólicas nos tetos das residências chinesas. Mas as antenas parabólicas ainda são regulamentadas, embora sem o rigor de antigamente.

Bruce Dover, australiano, foi o homem de Murdoch em Beijing até 1998. Seu livro constitui um relato único – de um homem de dentro da empresa – sobre como os chineses superaram um empresário que normalmente consegue tudo o que quer. Murdoch pensava que, se conseguisse uma reunião com o presidente Jiang Zemin, tudo iria dar certo, escreve Dover. Eventualmente, Murdoch conseguiu conversar com o presidente – e por um bom tempo, na realidade. Entenderam-se bem. Murdoch apresentou ao líder chinês, um cinéfilo, uma cópia exclusiva de Titanic, produzido nos estúdios da 20th Century Fox, dele próprio.

Choque com um ‘muro de pedra’

Os chineses permitiram que ele investisse abundantemente em empresas eletrônicas e de programação, repassando-lhes, dessa maneira, um precioso know-how técnico. Tinham especial admiração pela estrutura de gerenciamento de Murdoch porque se parecia com a sua: um Rei Sol no centro, com acólitos à sua volta. Os chineses foram excelentes negociadores, mas queriam os lucros da China para a China. Mesmo com investimentos na mais moderna tecnologia de produção de televisão na China, Murdoch não conseguiu as concessões que normalmente acompanham a publicação de editoriais favoráveis a presidentes e primeiros-ministros no Ocidente. O charme de Murdoch persuadira com sucesso os mais altos representantes de governos na Austrália, nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha. Na China não deu certo.

Mas Murdoch teve alguns benefícios. Em 2002, sua Star TV teve permissão para vender programas para sistemas a cabo, na província de Guangdong. Porém, quando a empresa tentou expandir sua distribuição pela porta dos fundos, usando a distante província de Qinghai como base e explorando um artifício regulatório para evitar a proibição que impede os chineses que possuem televisão a cabo de ter acesso a emissoras estrangeiras, a reação do governo foi imediata. O Departamento de Propaganda chinês obrigou a Star TV a encerrar a operação. A equipe da News Corporation avalia que o fracasso de Qinghai custou à Star TV algo entre 30 e 60 milhões de dólares. Posteriormente, em 2003, Jiang Zemin foi substituído pelo menos afável Hu Jintao. E dois anos depois, Murdoch anunciou que se chocara com um ‘muro de pedra’ na China.

Aposta no prestígio pessoal

Enquanto cortejava os dirigentes chineses, Murdoch conheceu Wendi Deng, uma talentosa executiva com um MBA da Universidade de Yale. Wendi Deng nasceu na China e trabalhava no departamento de desenvolvimento de negócios da Star TV em Hong-Kong. Foi Bruce Dover que os apresentou, durante um coquetel na empresa. Casaram-se em 1999 e Wendi Deng tornou-se a nova conexão de Murdoch com a China, embora ela pouco entendesse das políticas opacas de sua terra natal. Atualmente, Wendi Deng é responsável pelo MySpace.com na China. Assim como com todas as operações de internet no país, fica na mira dos censores chineses. Mas continua sendo uma das mais promissoras – e agora, limitadas – operações da News Corporation na China.

Murdoch perdeu o pique com a China. Recentemente, encontrou uma nova paixão: reorganizar o Wall Street Journal.

Poucos executivos da News Corporation escreveram sobre seu patrão. Bruce Dover o faz se maneira imparcial, sem maldade e num tom gozador que sugere que Murdoch foi um pouco ingênuo em relação aos chineses. Relata ao leitor a perpétua movimentação de Murdoch, sua mania de telefonar a seus executivos a qualquer hora do dia ou da noite, e como mantém sob controle seus negócios de 70 bilhões de dólares por meio de uma pasta azul com a contabilidade semanal e a situação de suas empresas de Nova York até Cairns.

No que se refere à China, ninguém apostou tanto em seu prestígio pessoal, diz Dover. As empresas estrangeiras ainda terão que conseguir permissão para serem acessadas pelos 380 milhões de residências chinesas que têm televisores. Agora com 77 anos, Murdoch começa a admitir que isso talvez não venha a ocorrer durante seu turno.

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