Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Indenização judicial tira jornal gaúcho de circulação


Leia abaixo a seleção de terça-feira para a seção Entre Aspas.


 


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O Estado de S. Paulo


Terça-feira, 1 de dezembro de 2009


 


MÍDIA NA JUSTIÇA


Elder Ogliari


Indenização judicial tira jornal gaúcho de circulação


‘Detentor de dezenas de prêmios, inclusive um Esso nacional, o jornal mensal Já suspendeu sua circulação em novembro. O motivo: asfixia financeira determinada por decisão judicial que condenou a publicação ao pagamento de R$ 54 mil à viúva Julieta Diniz Vargas Rigotto, 88 anos, inconformada com a veiculação de matéria que julgou ofensiva à memória do filho Lindomar Vargas Rigotto, irmão do ex-governador Germano Rigotto (PMDB).


Os processos começaram em 2001, mas a mordaça se agravou em agosto deste ano, quando a Justiça determinou o bloqueio de 20% das receitas da Já Editores, responsável pelo jornal, para garantir a indenização. ‘Isso é pesado para quem é pequeno e tem rentabilidade baixa’, afirma Elmar Bones, diretor da empresa, que chegou a ter faturamento bruto de R$ 380 mil por ano em seus melhores tempos.


A penhora foi levantada no dia 24 de novembro porque a Justiça entendeu que o valor irrisório do faturamento atual da empresa não remuneraria nem a quantia devida ao administrador. Mas o caso não terminou. A autora tem dez dias para recorrer e pedir outras penhoras.


Lindomar foi uma das 22 pessoas e 11 empresas denunciadas pelo Ministério Público Estadual à Justiça por participação em fraude na Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), com base em informações oferecidas por uma sindicância interna, uma auditoria da Contadoria e Auditoria-Geral do Estado (Cage) e um relatório de Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia.’


 


 


LIBERDADE DE IMPRENSA


Moacir Assunção


‘Censura é enorme retrocesso’


‘O professor de Filosofia do Direito da Faculdade Padre Anchieta, em Jundiaí (SP), Sebastião Pujol, considera a censura ao Estado desde 31 de julho, por determinação do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF), ‘um enorme retrocesso’ no regime democrático. ‘O episódio demonstra que o fundamento do direito é o poder e vai exatamente no sentido contrário ao fortalecimento da democracia’, afirmou.


Pujol lembrou que, desde a Revolução Francesa, quando foi contestada e derrubada a monarquia absolutista, a evolução política da humanidade consiste em estabelecer o princípio de que todos são iguais perante a lei e ninguém estará acima da legislação que vale para todos, em um princípio de responsabilidade legal. ‘Com a censura, resgata-se um rol de pessoas de sua própria responsabilidade política e judicial.’


O professor destacou que, em tempos de democracia, a proibição de veiculação de informações pode ser decretada, porém somente em casos muito especiais e pontuais. ‘Caberia em uma situação de sequestro, em que é necessário garantir a integridade física do sequestrado ou nos de segredo de Estado, quando se precisa proteger informações de interesse público.’


No caso que envolve a censura ao Estado, mediante liminar concedida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal a pedido do empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado José Sarney (PMDB-AP), o especialista afirma que ela não se justifica. ‘Não há interesse público relevante a se proteger, mas apenas os interesses privados da pessoa que pediu a mordaça.’ Fernando foi indiciado por vários crimes pela Polícia Federal na Operação Boi Barrica.


A transparência nas relações do poder com os cidadãos comuns, de acordo com ele, é uma tendência mundial. ‘A ideia-força do Estado Democrático de Direito é a liberdade, que cria a noção de que todos os atos republicanos devem ser públicos, para que a sociedade possa fiscalizar seus representantes’, comentou.


Liminar do Tribunal de Justiça do DF em ação movida por Fernando Sarney proíbe o jornal de publicar dados sobre a investigação da PF acerca de negócios do empresário, evitando assim que o ‘Estado’ divulgue reportagens já apuradas sobre o caso’


 


 


IRAQUE


AP


Sem alarde, ‘TV Saddam’ estreia no mundo árabe


‘Ao ligar a TV na semana passada, muitos iraquianos se depararam com um rosto familiar: Saddam Hussein. O ditador iraquiano ganhou um misterioso canal que entrou no ar no aniversário de sua execução, pelo calendário islâmico (pelo gregoriano, em 31 de dezembro de 2006).


O canal transmite fotos e vídeos do ditador, além de mostrar bandeiras americanas sendo queimadas na época da resistência à ocupação americana.


Segundo a revista Time, ninguém sabe ao certo quem está financiando o canal, embora o governo iraquiano suspeite dos Baathistas, membros do partido político que era liderado por Saddam. A agência de notícias Associated Press ligou a emissora a um executivo em Damasco, na Síria, chamado Mohammed Jarboua, que afirma ser o diretor do Canal Saddam. ‘Não recebemos nenhum centavo dos baathistas’, disse. ‘Esse é um canal para iraquianos e outros árabes que têm saudade de seu governo.’


Transmitidas em boa parte do mundo árabe, as imagens de Saddam na TV provocaram reações diversas entre os iraquianos. ‘Não precisamos de um canal como esse, que tem intenções hostis’, disse o xiita Hassan Subhi, que tem um cybercafé em Bagdá. Mas muitos foram tomados pela nostalgia ao lembrar de seu líder, que era árabe sunita. ‘Toda minha família ficou muito triste’, disse a professora sunita Samar Majid, em referência às imagens da execução do ditador.’


 


 


DUBAI


Mídia e empresários locais veem exagero na crise


‘A mídia e líderes empresariais de Dubai apoiaram os esforços do emirado para administrar a crise de dívida, dizendo que os temores sobre os problemas foram exacerbados. A crise começou na quarta-feira, quando Dubai, um dos sete Emirados Árabes Unidos, pediu o adiamento do pagamento da dívida do conglomerado Dubai World e de seu braço imobiliário Nakheel, responsável pela construção das ilhas que atraem celebridades e milionários.


Riad Kamal, presidente-executivo da Arabtec, disse não ter dúvidas sobre o compromisso de Dubai de pagar sua dívida. ‘É preciso dar tempo para Dubai reestruturar sua dívida. Não vou perder meu sono por causa disso’, afirmou. ‘Estou bem calmo. Dubai nunca declarou moratória e não irá declarar’, disse Khalaf Al Habtoor, presidente do Al Habtoor Group. ‘Estou confiante de que o governo honrará os compromissos e ajudará as empresas.’


Um executivo do Emirates NBD, um dos maiores bancos da região, também procurou atenuar o tamanho do problema, dizendo que ‘não há nada com que se preocupar’. Já o presidente da empresa aérea Emirates, o xeque Ahmed bin Saeed Al-Maktoum, disse ao londrino Sunday Telegraph estar chocado com a queda dos mercados globais. ‘Dubai vai sair disso, como vamos também’, acrescentou.


Em editorial, o jornal Khaleej Times afirma que ‘a necessidade de reestruturar a Dubai World é real e a decisão de ir em frente com isso indica maturidade da parte dos tomadores de decisão do emirado’. O Khaleej Times defendeu o governo de críticos que disseram que o anúncio feito antes de um feriado religioso de quatro dias prejudicou a credibilidade e a transparência do emirado. ‘O momento do anúncio de um possível adiamento de seis meses do pagamento da dívida pode ser debatido pelos mercados, mas não a intenção por trás dele’, afirmou o jornal.


Algumas autoridades bancárias e investidores acreditam que o anúncio da reestruturação do Dubai World provocou um efeito desproporcional. ‘A crise em si foi exagerada. Ela é muito localizada em um setor e em um grupo. Ela foi elevada a uma questão maior’, disse Suresh Kumar, presidente-executivo do Emirates NBD capital.


O Ajman Bank, um dos menores bancos dos Emirados Árabes Unidos, divulgou um comunicado no qual afirma que mantém planos de abrir uma agência em Dubai ainda neste mês.


Alguns executivos de bancos internacionais também deram apoio a Dubai. Michael Geoghegan, presidente-executivo do HSBC, afirmou em comunicado no fim de semana estar ‘confiante de que Dubai e os Emirados Árabes Unidos superarão qualquer questão de curto prazo que enfrentem – que parecem ter sido em parte alvo de sensacionalismo – e continuarão a fornecer as bases para o crescimento sustentável’.


Mounir Husseini, presidente-executivo do Deutsche Bank no país, disse em comunicado que ‘está claro para mim que o comando de Dubai, com apoio de Abu Dabi, está comprometido em tomar as medidas certas’.’


 


 


TELEVISÃO


Keila Jimenez


Record ataca Ibope


‘A Record declarou guerra ao Ibope. A emissora, que chegou a pensar em romper com o instituto na segunda-feira, dia 23, resolveu usar o seu jornalismo para atacar o instituto.


Anteontem à noite, o Domingo Espetacular exibiu reportagem de 17 minutos questionando a imparcialidade das pesquisas do Ibope e o caráter do presidente da empresa, Carlos Montenegro. A briga começou no domingo, dia 22, após uma falha que comprometeu a medição de audiência em tempo real, justamente no horário de A Fazenda, da Record.


Com base nessa falha, a reportagem insinuava um suposto favorecimento do instituto à TV Globo, e levantava questões com relação à conduta da presidente do Ibope.


A emissora tomou como base a briga travada pela mexicana Televisa, que prometeu não se basear mais no Ibope até março de 2010. A Record pretende fazer o mesmo, uma vez que já não divulga mais dados fornecidos pelo instituto com relação a sua programação. A briga deve ir adiante nos noticiários da emissora, e pode ir até parar na Justiça.


Procurado, o Ibope não se manifestou até o fechamento desta coluna.’


 


 


 


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Folha de S. Paulo


Terça-feira, 1 de dezembro de 2009


 


TODA MÍDIA


Nelson de Sá


Em posição delicada


‘Sobre Honduras, o ‘New York Times’ destacou as ‘repercussões muito além’ do país, com ‘uma dor de cabeça para a política de Obama na América Latina’. No ‘Wall Street Journal’, ‘a aceitação internacional não é garantida’: espera-se ‘apoio crucial dos EUA’, mas ‘oposição de pesos-pesados regionais como o Brasil’, deixando Obama ‘em posição delicada’.


Final do dia e, na Folha Online, o assessor Marco Aurélio Garcia já dizia que, ‘se o Brasil considerar que tem que mudar de posição, mudará de posição’.


De sua parte, a ‘Economist’ postou que pelo jeito ‘o resultado será respeitado e a estratégia dos golpistas será premiada’. Agora ‘a grande preocupação é se um perigoso precedente foi estabelecido’ na região.


NA ‘NEW YORKER’


O fotógrafo da revista correu mundo para perfilar líderes globais. Sobre Lula, ‘foi difícil, ele me deu muito pouco tempo’. Sobre Cristina Kirchner, ‘homens são chatos, são todos tão conservadores, mas então vem esta dama’


REDESCOBRIMENTO


Lula deu longa entrevista ao ‘Diário Econômico’ de Portugal para a abertura da Cúpula Ibero-Americana, com a manchete ‘Portugal tem muito mais a ganhar com o actual momento do Brasil’. Foi a manchete também da nova versão do jornal, ‘Brasil Econômico’: ‘Brasil vai a Portugal para ser redescoberto’.


Na home do UOL, com Reuters, destaque à declaração, na entrevista, de que ‘substituir dólar por moeda global é exagero’. Ele prefere a ‘diversificação de moedas’.


‘WAR PRESIDENT’


Na manchete on-line do ‘NYT’, ‘Obama ordena mais soldados no Afeganistão’. No site Politico e em outros, a carta aberta do cineasta Michael Moore, questionando se se Obama quer ser, ele também, ‘presidente de guerra’, pedindo : ‘Por favor, diga que não é verdade’.


Ao fundo, o ‘NYT’ deu editorial atacando a ação de Obama no Oriente Médio. E o ‘WSJ’ deu o artigo ‘Árabes pararam de aplaudir Obama’, com o ‘desencantamento’. Foi a página ‘mais popular’ do site.


IMPÉRIO SOB RISCO


Na capa, ‘Como caem grandes potências’. Na reportagem, ‘Um império sob risco’. Para a ‘Newsweek’, ‘vencemos a Guerra Fria, mas a fraqueza econômica ameaça nosso poder global’


PARA COPENHAGUE


O britânico Channel 4 fez longa entrevista com Lula sobre a conferência. Diz o brasileiro que, sem acordo, ‘vamos enviar uma mensagem muito negativa ao mundo’.


E o francês ‘Le Monde’, com tradução no UOL, proclamou que o ‘Brasil assume liderança contra aquecimento’, sobre o anúncio em série de metas para o corte de emissões.


‘BIG OIL’ 2010


No alto da ‘Foreign Policy’, assinado por Ian Bremmer, presidente do Eurasia Group de Nova York, ‘consultoria de risco global’ para multinacionais, ‘Por que Lula está agindo como Hugo Chávez?’. Em suma, ‘Brasil se move agressivamente ao nacionalismo de recursos naturais’, com foto de Lula e Dilma Rousseff. Lamenta como sua ‘popularidade mantém a oposição calada, até José Serra’, sem questionar o plano do governo para o pré-sal:


‘Se Serra vencer, vai tentar reverter. Se Dilma vencer, as companhias internacionais de petróleo só terão alguma esperança de vitória na Justiça constitucional.’


‘Se vocês radicalizarem daí, eu radicalizo daqui.’


Do governador do Distrito Federal, JOSÉ ROBERTO ARRUDA , em ‘momento de forte tensão’ na reunião do Democratas, ‘quando um dos presentes defendia a expulsão imediata’, segundo o blog Radar. O ‘Jornal Nacional’ também deu, descrevendo como ‘ameaça’.’


 


 


TELEVISÃO


Silvia Corrêa


‘Apagão’ de audiência opõe Record, Ibope e telefonia celular


‘A medição de audiência em tempo real voltou a falhar no domingo na Grande SP. É o quarto dia em que o serviço tem problemas em uma semana. Os dados -que servem para as emissoras esticarem ou encurtarem atrações ao vivo- chegaram a apresentar até 15 minutos de atraso.


O Ibope diz que os problemas decorrem de falhas no sistema de transmissão dos dados dos domicílios ao instituto, feita por telefonia celular. Em nota, porém, as operadoras TIM e Vivo negam haver falhas.


‘A interrupção no ‘real time’ pode acontecer por uma única razão: problemas de transmissão’, diz Dora Câmara, diretora do Ibope. ‘Nós não temos dúvida disso. O sistema está instável desde o apagão [dia 10]. Quando a instabilidade se traduz numa recepção de dados inferior a de 450 domicílios [no total, são 750], temos que interromper o serviço.’


A divergência entre o Ibope e as empresas de telefonia foi alvo de uma reportagem do ‘Domingo Espetacular’ (Record). O texto sugere que o apagão da audiência serve para esconder índices e favorecer a Globo.


A Record suspendeu a divulgação do ibope de sua programação, mas não tomou nenhuma medida formal. Ela pode pedir a checagem das medições do instituto, que são anualmente auditadas pela Ernst & Young, contratada em conjunto pelas agências de publicidade e emissoras de televisão.


DOSE DUPLA


Pela primeira vez em 30 anos Roberto Carlos vai fazer duas apresentações do show especial de final de ano da Globo. Ele cantará nos dias 9 e 10 no ginásio do Ibirapuera. É uma homenagem a São Paulo.


REI A R$ 60


A venda de ingressos para os shows de Roberto Carlos começa amanhã -nas bilheterias do ginásio e pelo Ingresso Rápido (4003-1212). Os preços: R$ 60 (arquibancadas), R$ 280 (anel) e R$ 360 (pista).


VENDIDO


Caixa, GM e Ipiranga renovaram seus contratos com a Globo para patrocinar a Stock Car 2010. A Itaipava entrou no lugar da Nextel. Na tabela, cada cota custa R$ 8 milhões. O campeonato vai de 28 de março a 5 de dezembro, em 12 etapas.


FORA DO AR


É oficial: a última edição de ‘Geraldo Brasil’ (Record) vai ao ar no dia 18. A baixa audiência anteciparam o fim do programa, inicialmente previsto para abril, quando Geraldo Luís passará a ter um horário aos sábados, antes de Rodrigo Faro.


SEM DESGASTE


Vildomar Batista, diretor artístico da Record, que havia dito que ‘Geraldo Brasil’ estaria na grade de 2010, afirma que a medida foi antecipada para ‘resguardar a imagem de Geraldo para o novo projeto’.


PARA TODOS OS MALES


O horário será ocupado por um compacto de ‘A Fazenda’. Vildomar Batista se reunirá amanhã com Babi Xavier, que deve apresentar a atração. Se algo der errado, a solução interna será Amanda Françozo.’


 


 


CARTUM


Raquel Cozer


O bom do cara do ‘maus’


‘Art Spiegelman desconstrói para poder construir. O cartunista vem usando esse método desde o fim dos anos 60, quando surgiu no cenário underground dos EUA, para provar aos incrédulos que HQs são, sim, uma forma de arte.


O empenho lhe garantiu, em 1992, um inédito prêmio Pulitzer para um quadrinista, por sua obra ‘Maus’, em que relata a história de seus pais em campos de concentração nazistas.


Boa parte desse trabalho de dissecar os quadrinhos pode ser vista em ‘Breakdowns: Retrato do Artista Quando Jovem %@&*!’, que ganha caprichada edição da Quadrinhos na Cia.


Original de 1978, com os primeiros esboços de Spiegelman, o livro sai agora com extensa introdução, também ilustrada, em que ele analisa sua carreira. Por telefone à Folha, de Nova York, onde vive, Spiegelman, 61, falou sobre a HQ como terapia, a dificuldade em desenhar e a ‘sombra’ de ‘Maus’.


FOLHA – ‘Breakdowns’ analisa as HQs como arte, mas também é bem autobiográfica. Serve como terapia?


SPIEGELMAN – Olha, tentei terapia, é mais caro e é meio diferente. Tenho uma analogia horrível, mas não penso em nada melhor, que é: terapia envolve vomitar as coisas, quadrinhos é mais como engolir o vômito. É preciso vomitar antes de fazer algo com isso. Mas, sim, ambos envolvem autoanálise.


FOLHA – Pode-se dizer que a autoanálise é menos central que o fato de o sr. ver boas histórias na sua vida?


SPIEGELMAN – Sim, acho que até mais isso. Quando fiz ‘Maus’, pensei: ‘Seria ótimo fazer uma HQ com a densidade que se associasse a literatura séria’. Fiz aquela versão de três páginas [que está em ‘Breakdowns’] e pareceu desperdício, porque era uma história para contar. Trabalhei em ‘Breakdowns’ nos anos anteriores à versão em livro de ‘Maus’. Estava bem pouco interessado na história em si e mais no modo como imagem e texto se encaixam. Por isso ‘Breakdowns’ é tão difícil, ele requer foco, diferente de ‘Maus’. ‘Maus’ narra alguma coisa, mostra as forças em jogo numa trama complexa.


FOLHA – A nova introdução de ‘Breakdowns’ mostra o sr. tentando fugir da sombra de ‘Maus’. É ironia ou isso de fato o incomoda?


SPIEGELMAN – É irônico e me incomoda. Por um lado, gostaria que falassem: ‘Puxa, o que você está fazendo agora é fantástico’. Mas é claro que, quando fiz ‘Maus’, fiz o que no rock chamam de ‘crossover hit’, capaz de atrair inclusive quem não liga para HQs. Sou grato a ‘Maus’ porque, depois dela, foi possível publicar minhas HQs mais difíceis. Não que ‘Maus’ seja fácil, mas é difícil de modo diferente. Ali, para tornar claro algo complexo, tive de suprimir coisas interessantes, como a corrente de consciência do meu pai contando a história. Deixei isso de fora para que não ficasse muito joyceano. O fato é que a maioria dos cartunistas que conheço, inclusive eu, têm certa inveja de ‘Maus’ [risos].


FOLHA – ‘Breakdowns’ cita o artista Rodolphe Topffer sobre a ideia de que cartunistas ‘desenham mal, mas têm certo talento para escrita’ ou ‘escrevem de forma medíocre, mas têm belo estilo de desenho’…


SPIEGELMAN – Se tivesse uma tatuagem -sou contra ter tatuagens, porque ouvi que em Auschwitz eles transformavam as peles tatuadas em abajures; deve ser só rumor-, enfim, se tivesse uma frase tatuada, seria essa de Topffer, a coisa da existência entre dois lugares. Há quem compare HQ com literatura ou artes visuais, mas o cartunista fica entre as duas zonas e tem de equilibrá-las para que funcione. É um espaço híbrido, que exige dois dons. Embora grandes cartunistas possam ser péssimos desenhistas ou péssimos escritores.


FOLHA – O sr. acha que é melhor desenhista ou escritor?


SPIEGELMAN – Escrever é mais fácil para mim, desenhar é sempre uma luta. Quando desenho num guardanapo, por exemplo, é fácil. Mas, quando tento fazer algo específico, é um desafio. No ano passado, saiu nos EUA minha coleção de esboços ‘Be a Nose’ [seja um nariz], que é uma frase de um filme obscuro de Roger Corman, ‘Bucket of Blood’ [balde de sangue], sobre um cara que tem inveja dos artistas que pegam todas as garotas. A certa altura, ele começa a socar um monte de argila, dizendo: ‘Seja um nariz, seja um nariz!’. Ok, depois ele passa a matar pessoas para usá-las como esculturas, mas, para mim, aquele momento em que o cara soca a massa e diz ‘seja um nariz’, isso é ser um cartunista.


FOLHA – E o sr. faria um romance?


SPIEGELMAN – [pausa] Não. Às vezes, escrevo ensaios. Até agora, nunca tive satisfação com nenhuma ficção que tenha escrito. Eu me interesso demais em desconstruir as coisas para pensar em construir algo.


FOLHA – Quando criou a capa do 11 de Setembro para ‘New Yorker’, imaginou que seria antológica?


SPIEGELMAN – Me pareceu a resposta certa. E, mesmo quando a encontrei, não reconheci. Minha mulher [Françoise Mouly, editora de arte da ‘New Yorker’] foi quem disse: ‘Essa é a capa’. Agora olho para trás e penso: ‘Ok, foi um daqueles momentos transcendentais’.


FOLHA – Com que frequência o sr. cria quadrinhos hoje em dia?


SPIEGELMAN – Não trabalho com prazos. Se tento me expressar bem, demora. Não sou prolífico como meu colega Paul Auster, que lança um livro a cada ano…


BREAKDOWNS


Tradução: Vanessa Barbara


Editora: Quadrinhos na Cia.


Quanto: R$ 79 (312 págs.)’


 


 


 


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