Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Literata homenageia Guimarães Rosa

Há quem o considere o maior autor da língua portuguesa. Como não quero parecer bairrista nem radical, eu diria que Guimarães Rosa é um dos maiores, ao lado de Camões, Fernando Pessoa e Machado de Assis. Em sua homenagem, realiza-se de 17 a 20 de novembro a 1ª Literata – Festa Literária de Sete Lagoas, na Grande BH. Estarão presentes Moacyr Scliar, João Paulo Cuenca, Olavo Romano, Alice Ruiz, Arnaldo Antunes, Alcione Araújo, Nelson Cruz, Roger Mello, Wander Melo Miranda e Washington Novaes, entre outros convidados.


Rosa nasceu em Cordisburgo, que então pertencia a Sete Lagoas, e esse é o segundo motivo da justa homenagem. Como poucos, adotou uma forma narrativa própria e inimitável. Com olhar jornalístico e ouvidos atentos à prosódia mineira, abordou temas seculares, criou neologismos e resgatou palavras do português arcaico que estavam adormecidas. Não bastasse isso, sua escrita é musical, influenciada por autores clássicos de todas as épocas.


Tudo isso explica o fascínio que sua obra desperta em críticos e teóricos. Depois de Machado de Assis, Rosa é o escritor mais estudado nas universidades brasileiras e suas histórias – traduzidas em várias línguas – permitem as mais diferentes leituras. Embora tenha retratado o homem, a paisagem e a biodiversidade do cerrado mineiro, ele não se limitou a captar aspectos meramente regionais. Partiu da recriação desses fatores para narrar epopeias de cunho universal.


Leitores comuns e professores que trabalham a obra roseana em salas de aula devem procurar no texto não apenas as águas da superfície, onde se narra o enredo principal, mas também as correntes profundas, nas quais habitam senhas e símbolos de diferentes escolas filosóficas e esotéricas. O autor buscava um sentido oculto para tudo o que escrevia, fazendo da literatura um verdadeiro jogo. Além de poliglota e estudioso da palavra, era um aficionado em xadrez, enigmas e religiões.


A influência no cancioneiro nacional


Por essas e outras, os iniciados em sua obra são tentados a interpretar o texto sob a luz da Alquimia, da Astrologia, do Hinduísmo, da Maçonaria, do Platonismo, do Taoismo ou mesmo da Psicanálise. Isso faz de seu trabalho algo maior do que a literatura por excelência. O autor cresceu no sertão e em Belo Horizonte, morou no Rio de Janeiro, foi médico, militar e diplomata. Encantou-se para se fazer eterno ao terceiro dia de sua posse na Academia Brasileira de Letras.


Outro aspecto a ser notado é que, apesar da leitura aparentemente difícil, Rosa costurava suas narrativas com bom humor e senso crítico. Isso talvez explique o fato de ter se tornado um dos escritores nacionais mais adaptados para o cinema, por diretores como Carlos Alberto Prates, Roberto Santos, Nelson Pereira do Santos, Sandra Kogut e Pedro Bial, entre outros. Não bastasse isso, Grande Sertão: Veredas inspirou uma das melhores minisséries da televisão brasileira, numa excepcional adaptação de Walter Avancini.


Fã confesso de Luiz Gonzaga e da dupla Tonico e Tinoco, Rosa reproduziu trechos de canções populares em muitas de suas narrativas e também influencia o cancioneiro nacional. De Geraldo Vandré – autor da trilha do filme A Hora e a Vez de Augusto Matraga (de Roberto Santos) – a Tom Jobim, sua poética ecoa nos acordes de Chico Buarque (Assentamento), Milton Nascimento e Caetano Veloso (A Terceira Margem do Rio), Tavinho Moura e Ronaldo Bastos (Folia Sorriso de Nuvens), Sirlan e Paulo César Pinheiro (Cantiga de Beira D´Água) e Téo Azevedo (Veredas do Grande Sertão) – para citar apenas alguns compositores. A exemplo de Dante, Goethe e Pessoa, para ele a palavra era forma, fôrma e energia, uma força a transmitir ideias e a despertar o inconsciente do leitor.


Serviço


1ª Literata – Festa Literária de Sete Lagoas, de 17 a 20 de novembro, no Centro Cultural Nhô-Quim Drummond. Trata-se de uma iniciativa da Iveco, viabilizada pela Lei Federal de Incentivo à Cultura com patrocínio da Petronas e apoio da prefeitura local e Unifemm. Com entrada franca, o evento terá mesas sobre vários temas: contação de histórias, exposição de fotos, feira de livros, oficinas de artes, shows e sessão comentada do filme Mutum, de Sandra Kogut.

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Escritor, jornalista e curador nacional da 1ª Literata, Belo Horizonte, MG