A polêmica proposta de transferir aos municípios a competência de legislar e estabelecer suas próprias políticas de radiodifusão comunitária volta ao Parlamento com a apresentação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 360/09. De autoria do deputado Manoel Junior (PSB-PB), a PEC defende que o alcance e caráter local das rádios comunitárias e a relevância desse meio para as comunidades fazem com que a legislação sobre elas seja de natureza essencialmente municipal.
A municipalização das rádios comunitárias tem como argumento a burocracia, morosidade e pouca transparência do processo de concessão de outorgas, prerrogativa do Ministério das Comunicações. Dados da Secretaria de Serviços de Comunicação Eletrônica do Minicom de agosto de 2007 revelam que, dos quase 12 mil processos protocolados naquele ano, cerca de 6,5 mil foram indeferidos ou arquivados e somente 2.868 entidades forma contempladas.
Cristiano Aguiar Lopes salientou na matéria ‘Municipalizar é Democratizar ou engessar as comunitárias?’, publicada pela revista MídiaComDemocracia em fevereiro de 2006, que ‘o enfoque primordial da discussão não deve ser jurídico ou administrativo, mas sim, político’ e, nesse sentido, considera a municipalização das outorgas ‘uma estratégia equivocada’. Lopes, consultor legislativo da Câmara Federal, temendo que o ‘clientelismo’ nas concessões apenas fosse mudar de mãos, apontou, então, para a necessidade de uma nova legislação para o setor. ‘Havendo critérios justos e controle social, não importa qual nível federativo terá a prerrogativa de conceder outorgas de radiodifusão’, avaliou.
Interesses e neutralidade
Para José Luiz Nascimento Sóter, coordenador-geral da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), a regulamentação municipal facilitaria o processo de outorga e fortaleceria o caráter comunitário das emissoras. Segundo o dirigente, ‘há diferenças de município para município. Além disso, a descentralização é necessária para que o princípio da inclusão nos meios seja atendido. Nesse sentido, acredito que pode ser uma boa iniciativa do Congresso Nacional fazer essa alteração’.
De acordo com deputado Júlio Semeghini (PSDB- SP), que integra a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara, a municipalização, mesmo agilizando o processo, pode desvirtuar o caráter de interesse público das emissoras comunitárias e comprometer a neutralidade na concessão de outorgas. ‘Poderá haver uma tendência na definição de quem terá ou não uma licença para implantar uma rádio comunitária’, alertou o deputado em entrevista à Rádio Câmara (confira aqui).
‘Coronelismo’ ganharia força
Sóter defende o controle público nos processos de concessões de outorga, indicando a criação de conselhos de comunicação nos níveis, municipal, estadual e federal como alternativa. ‘Com a participação direta da população nesses conselhos, a definição de quais comunidades seriam atendidas estaria mais afinada com as realidades locais’, assinala.
Clementino Lopes, coordenador da Abraço no Rio Grande do Sul, reafirma a posição da entidade em relação à municipalização da radiodifusão comunitária. Contudo, salienta a necessidade de um debate amplo com a sociedade. Clementino pondera que, embora ‘as rádios comunitárias tenham uma abrangência local, com a competência do município, o `coronelismo´, especialmente no interior do país, ganharia mais força. Isso seria um ponto negativo para municipalização’.
A PEC 360/09 está em analise na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) do Legislativo Federal. Caso aprovada, a proposta passará pelos trâmites da Casa e irá à votação no Plenário.