Em determinados assuntos, como desastres e catástrofes, a mídia costuma ser extraordinariamente célere na ânsia de atingir o leitor/espectador/ouvinte. Uma sociedade como a nossa, de discutível politização e informação, passa a ser bombardeada pelo noticiário policial-eleitoral recente: dossiês, dólares, caminhos escusos de dinheiro, políticos se atacando e tudo o mais, em tese em favor do próprio processo eleitoral e da democracia, mas às vezes a serviço de acusados ou acusadores.
Acidentes de ônibus, tiroteios em favelas, caos do banditismo em São Paulo, tsunamis, 11 de Setembro, Andraus, Joelma – tudo isso sempre voou rapidamente do local da notícia para o consumidor. Quando se fala em acidente aéreo, então, as coisas costumam ganhar quase sempre as manchetes e a divulgação imediata dos fatos. Não foi assim com o Boeing da Varig que caiu na selva amazônica ou com o Fokker da TAM em São Paulo? No caso deste último, curiosamente, eu estava chegando a Congonhas pela própria TAM vindo de uma cidade do interior, em 1996, quando ocorreu o famoso acidente: dava para ver fumaça e correria na direção do Jabaquara, e ao sair do aeroporto, no táxi, as rádios já começavam a prestar seu serviço em tempo real.
Eis que na sexta-feira (29/9), um pouco antes das 17h, desapareceu das telas dos controladores de vôo um Boeing da Gol com 149 passageiros e 6 tripulantes. Logo se teve a informação de que um Legacy particular havia colidido com o jato e conseguido pousar sem vítimas numa base aérea – um acidente que, pelas proporções, poderá figurar como o mais grave acontecido no Brasil, sem falar de fatos como o raro choque em pleno ar entre aeronaves em velocidade de cruzeiro, ou que os aviões, novos, eram equipados com o que há de mais moderno em tecnologia, e ainda haver o jato fabricado pela Embraer pousado, permitindo a rara oportunidade de testemunhas, incluindo o piloto, poderem auxiliar a esclarecer o que pode ter acontecido.
Contudo, mesmo com todos esses elementos presentes, a notícia só chegou ao público, em especial via rádio e algumas TVs, e mesmo nos sites de internet, quase às 21h! Mais misteriosamente ainda, a correspondente da CNN no Brasil já noticiava o fato bem antes, e apenas quem tem TV por assinatura pôde saber do fato com antecedência. Sem entender bem as razões do silêncio dos veículos de comunicação nacionais, ao menos até as nove da noite.
Que responda o outro lado
Explicações? Não as tenho. Mas elas podem variar de cochilo da imprensa a teorias conspiratórias: havia funcionários de alto escalão da Infraero no vôo? Quem seria o americano dono do avião particular? Teria o governo interferido no fato? A imprensa estaria dando tanto atenção às eleições que deixou em segundo plano um acidente aéreo? Exercitando a imaginação, a coisa não vai parar.
De qualquer modo, fica uma nuvem cinzenta sobre a imprensa nacional: mesmo que a Gol, a Infraero, o DAC, a Anac e demais envolvidos não quisessem que a notícia fosse dada, bem como a própria Embraer, que fabricou um dos aviões envolvidos, ou ainda que as eleições estivessem ocupando a totalidade da capacidade funcional da mídia, a CNN (para variar, ela de novo…) saiu na frente! No governo Clinton virou rotina e piada o fato de que a Casa Branca acreditava mais no que informava a CNN do que seus próprios serviços de inteligência [no governo Bush, a TV de confiança é a Fox News] – pelo menos, isso ainda não havia acontecido por aqui.
Ou seja, nem sempre as notícias voam. Resta, então, o grande mistério: onde estavam nossos jornalistas que não souberam – em tese – o que a CNN estava divulgando em inglês e espanhol no próprio Brasil? Por que demoraram horas para levar a notícia à população? Ao que me consta, e salvo engano, a própria Globo se ausentou, e nem um plantãozinho foi ao ar. Que responda o outro lado – neste caso, a própria imprensa.
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Médico, São Paulo