Aos 76 anos, Francisco Ribeiro do Nascimento resolve acrescentar mais um fruto a tantos outros que soube plantar e cultivar ao longo de uma vida dedicada à militância e às causas humanísticas: o resultado dessa pesquisa sobre a imprensa comunista no Brasil, particularmente sobre o jornal Tribuna do Pará.
No Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, onde o conhecemos por sua participação na direção da regional de Santos, Seo Chiquinho – como é carinhosamente chamado pelos colegas – é uma presença constante desde 1982. ‘O Sindicato é como se fosse a extensão da minha casa’, diz Seo Chiquinho. E é aqui no Sindicato que o colega de diretoria vem me pedir para fazer a apresentação do seu trabalho.
Fosse pelos conhecimentos da matéria – a história da imprensa comunista no país – eu não poderia aceitar a tarefa. Mas, para escrever sobre a presença desse militante digno entre nós, e da riqueza que contém uma vida dedicada à luta por uma Nação brasileira livre e soberana, sobre isso, sim, posso escrever.
Além da postura sempre calma e afetuosa para com os companheiros, Seo Chiquinho tem outros traços que o distinguem: nasceu na Ilha de Marajó, no Pará (afinal, bem pouca gente teve esse privilégio); criou 10 filhos com a mesma companheira, e nunca deixou de ter coerência política. ‘Sempre estive com as esquerdas’, diz. Mesmo o fato de ter deixado o Partido Comunista Brasileiro, o Partidão, em 1983, depois de 38 anos de militância, não abalou suas convicções. ‘Sofri muito antes de tomar a decisão. Passei noites e noites em claro, pois o Partido havia sido minha verdadeira Universidade’, conta Seo Chiquinho, acrescentando: ‘Foi lá que me formei humanisticamente’.
Seo Chiquinho entrou para o jornalismo em 1954, na própria Tribuna do Pará, agora seu objeto do estudo. Ficou quatro anos, até 58, quando assumiu a direção do jornal. Infelizmente, não ocupou por muito tempo o cargo de diretor, pois foi nesse mesmo ano que a Tribuna do Pará deixou de circular, ‘por problemas financeiros, como tantos outros veículos da imprensa popular’, esclarece o autor.
Fico pensando na riqueza de uma vida como a do Seo Chiquinho, que passou por todos esses momentos da história do País e da própria militância de esquerda. Por momentos tão significativos como o ano de 1945, da redemocratização, quando Seo Chiquinho, estudante do segundo grau, se interessou pela política e entrou no PCB então legalizado, com 18 anos de idade. Ou em 1954, quando era técnico laboratorista e foi preso em Parintins, no Amazonas, quando liderava uma manifestação pelo aniversário de Prestes. Ou em 1964, após o golpe militar, quando ficou seis meses clandestino, para fugir de nova prisão, em Belém do Pará.
Uma militância que veio até os dias de hoje, quando o sentido da própria militância encontra-se em xeque. Pois vivemos tempos em que os indivíduos se enclausuram em seus objetivos e desejos particulares de vida.
Com uma trajetória tão longa e plena de tantos desafios, emociona testemunhar a continuação dessa coerência. Se a Universidade foi a militância no PCB, Seo Chiquinho continua essa trajetória peculiar e se transforma em pesquisador por vontade própria e por amor à história. Graças à obstinação de sempre e à solidariedade dos colegas, Seo Chiquinho traz à luz sua obra, procurando revelar aos jovens a existência de uma imprensa que tinha outra razão de ser que não os mecanismos do mercado. Que era veículo das grandes lutas formadoras da consciência da nacionalidade, de soberania nacional e tantos outros conceitos que ajudaram a soldar esse formidável e discrepante país em que vivemos. Uma luta brutalmente interrompida em sua vertente democrática pela ditadura militar, instalada no país em 1964, cujo legado nos esforçamos agora para suplantar.
O trabalho de pesquisa que resultou neste volume é, sem dúvida, mais um momento de superação do obscurantismo que a direita golpista e os militares, respaldados pelos sempre presentes interesses dos Estados Unidos no Continente, tentaram impor indefinidamente ao País. Eles não conseguiram. Aqui estão duas provas: essas Páginas de Resistência e os 76 anos de resistência do seu autor, Francisco Ribeiro do Nascimento.
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Presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo