Outra coletânea de pequenos livros no mercado. Detalhe: escrita exclusivamente por jornalistas, com temáticas contemporâneas e dedicada à formação e à informação essencial dos cidadãos, estudantes do segundo grau e universitários. O jornalismo investigativo e científico da Coleção Repórter Especial, das editoras Terceiro Nome e Mostarda [Ruy Mesquita Filho, do Grupo Estado, é um de seus co-fundadores], começa com nove títulos, publicados em brochura e formato 12×18 cm. O diferencial é o preço: R$ 18 cada. De leitura fácil, pautados pelo didatismo, pesquisa e referências bibliográficas, os exemplares – média de 90 páginas – primam pela clareza e objetividade, sem perder a profundidade.
É assim em Aids: veja a que distância estamos da cura – Acredite: o melhor é a informação. Uma característica da coleção são os longos títulos dos livros. A jornalista e mestre em História da Ciência (PUC-SP) Ivonete Lucírio usa o melhor remédio para interagir com o leitor: a informação. Descarta qualquer milagre, e observa um quadro, que se mostra a cada dia mais eficiente em atacar o HIV. No livro, o interesse jornalístico e social tem a dimensão da problemática social: tirar dúvidas ainda existentes, ajudar na prevenção e esmiuçar possibilidades reais de cura. ‘Afinal, a que distância estamos da cura? Levando em conta que, na maioria dos casos, apenas 1% dos vírus ainda não pode ser capturado pelas drogas anti-retrovirais, a resposta seria ‘perto, muito perto’. Mas, quando se calcula a dificuldade que é dar cabo desse 1%, a resposta muda para ‘longe, bem longe’. A questão não está na distância, e sim no tempo que ela levará para ser percorrida. Nem os mais otimistas apostam em uma possível cura dentro de uma década. Os estudiosos do assunto que arriscam um palpite falam em quinze ou vinte anos’, adverte a autora.
Sem esgotar a temática, em Assassinatos sem a menor importância: banalização da violência no Brasil, o dramaturgo e jornalista Gilberto Amendola, atualmente repórter do caderno Cidades do Jornal da Tarde, parte de várias perguntas ao propor uma discussão ampla e atual sobre o assunto: por que se mata tanto e por motivos tão banais? Que papel exercem nos altos índices de criminalidade as dificuldades econômicas, as desigualdades sociais, o tráfico e o consumo de drogas, as cenas de violência veiculadas pela televisão? Onde ocorrem com mais freqüência os crimes? Nas ruas, no trabalho, nos bares, dentro da própria casa? O diagnóstico, a partir dos seus trabalhos e pautas do JT, revela que a maioria dos crimes acontece entre pessoas que se conhecem (familiares, vizinhos, amigos, colegas).
Ajuste de conta
O livro apresenta várias estatísticas, análises de especialistas e autoridades. Revela reflexões pungentes sobre drogas, alcoolismo, mortes no trânsito, mau uso da internet e do mundo virtual, e aponta a educação como uma das soluções para minimizar o problema. Constata que o Brasil ocupa o segundo lugar em mortes causadas por armas de fogo, ficando atrás da Venezuela – 100 mortes por dia, uma pessoa a cada 15 minutos. E relembra os 59,1 milhões de votos que legitimaram o comércio de armas de fogo e munição no referendo do dia 23 de outubro de 2005. Confirma o óbvio, que muitos ousam não enxergar: já é hora de os governos municipais, estaduais e federais se mexerem.
José Tadeu Arantes estudou Engenharia Química e História. Mas deixou ambos os cursos para se dedicar ao mundo da comunicação social. Especialista em jornalismo de divulgação cultural e científica, já passou por Globo Ciência, Superinteresante e Scientific American Brasil. Atualmente, presta assessoria de imprensa ao Hospital Israelita Albert Einstein, e participa da coleção com três títulos. O primeiro deles é a Ciência e espiritualidade – Bacon e Newton: em busca da alma do mundo. A pesquisa histórica do autor revela que não foram os filósofos materialistas do século 18, mas o teólogo franciscano Guilherme de Ocamm (1285-1349), citado em O nome da rosa (Umberto Eco), que promoveu o divórcio entre a espiritualidade e a filosofia, e, em decorrência, entre a espiritualidade e a ciência. Os sucessores de Ocamm, de acordo com o livro, foram o filósofo Roger Bacon (1214-1292) e o matemático Isaac Newton (1642-1727) que se utilizaram da alquimia e construíram uma teologia herética.
Em suas reflexões Arantes deixa bem claro: ‘Meus livros sobre ciência e espiritualidade têm, pra mim, o sabor de um ajuste de conta, pois procuram compatibilizar aquilo que, no passado, me parecia antagônico. Acho que a negação da dimensão espiritual engendrou uma visão de mundo mutilada e árida, com trágicas conseqüências. Mas, para além das formas históricas específicas assumidas pelas diferentes religiões, presenciamos hoje um renovado e genérico interesse pela espiritualidade’. Noutro título, Do xamã ao prêmio Nobel, todos são filhos de Deus, o autor faz reverberar que há mais em comum entre a ciência e a espiritualidade do que supunha o cientificismo estritamente materialista. Destaca o xamanismo pré-histórico, o shaiva siddhanta indiano, o taoísmo chinês, o pitagorismo, o neoplatonismo grego, a kabbalah, a alquimia cristã e o sufismo islâmico, como práticas religiosas que exerceram papel decisivo na concepção e evolução da ciência.
Previsões e cenários
Em O maior perigo do Islã: não conhecê-lo, Arantes reconhece que a religião muçulmana é a que mais cresce no mundo, e recapitula em perguntas contundentes aquilo que a maioria das pessoas insiste em não saber: quem foi Maomé? Qual o seu legado? Qual a importância do Corão? Quais foram as contribuições do islamismo para a civilização? Com discernimento disseca o Islã e mostra os preconceitos e a ignorância com que o assunto é visto pelo mundo ocidental.
Em As grandes cidades morrem: você pode salvá-las, Fabio Schivartche, que trabalhou no Jornal da Tarde e na Veja e está na Folha de S.Paulo, realiza uma cobertura ambiental atenta, pertinente e atual. Aborda a questão da poluição urbana que, segundo estudos da USP, mata indiretamente oito pessoas por dia. Focaliza a crescente escassez de água tratada. No geral, o título explica o que é a poluição urbana, suas causas e conseqüências para a saúde da população, as possíveis soluções para o problema e os progressos já feitos para combatê-la. Numa linguagem leve, rápida e clara, é um trabalho acessível à compressão de todos, o grande mérito do livro.
Outro título chama a atenção: Cuidado, a internet está viva! Os incríveis cenários para o futuro desse fenômeno, de autoria de Alexandre Barbosa, jornalista especializado em tecnologia da informação, ciência e energia, ex-colunista do Jornal do Brasil e Diário do Comércio e Industria, e colaborador das revistas Linux Magazine e Info Corporate. A internet, uma tecnologia da Guerra Fria, espalhou-se e hoje é utilizada por um bilhão de pessoas. O autor analisa previsões feitas por estudiosos e possíveis cenários para o futuro deste fenômeno. De forma humorada comenta:
O que me motivou a escrever o livro foi o desafio de tentar explorar um território absolutamente desconhecido, a partir das referências presentes. Apesar da decepção com a internet na época da bolha (entre 1998 e 2000, quando se acreditava que a economia digital mudaria todas as regras), a verdade é que as interações digitais pela Web transformaram mercados e modelos de negócios facilitando a comunicação entre as pessoas e até criando problemas para outros veículos, tais como o uso de ligações de voz pela internet, perturbando o faturamento das empresas de telefonia, e o consumo da música digital, com lojas como o iTimes vendendo canções isoladas em vez de CDs inteiros, por exemplo. Acho que as pessoas vão querer ler este livro para entender como acontecem essas mudanças e de que forma elas podem perceber indicadores de mudança na economia digital no dia a dia. Assim, elas poderão antecipar os cenários futuros mais prováveis, e se preparar para as oportunidades e desafios que a internet trará. Além disso, é uma forma de poder compartilhar da visão condensada de grandes especialistas colhidas ao longo do período de reportagem, de forma fácil e simplificada. E, garanto, é bom nos prepararmos para a mudança. A internet do futuro próximo fará a ‘nossa’ internet parecer brincadeira de criança.
Um dos melhores
No oitavo selo, O mundo tem medo da China? Nós também: O maior enigma da economia mundial, da pesquisadora Patrícia Campos Mello, mestranda em Jornalismo Econômico e Financeiro pela Universidade de Nova York, aponta o vertiginoso crescimento econômico, os problemas internos e externos, e a capacidade notável de se transformar enquanto país. Convenhamos, hoje, a China, faz o mundo tremer. De tanto que cresce, e de modo tão rápido, pode ver-se abrigada a parar de maneira abrupta. O que acontecerá então com o gigante asiático? E com o resto do mundo? O livro lança luzes sobre esse grande enigma, e reflete sobre aquilo que todos querem saber: afinal, a China é uma aliada? Uma parceira? Um cliente? Uma ameaça para o capitalismo?
Para terminar, um assunto bem instigante. Atualíssimo. Fátima Cardoso, que já passou por Veja, Quatro Rodas e Época, e faz pós-graduação em Gestão de Processos Comunicacionais, toca num tema delicado no livro Transgênicos são do bem. Transgênicos são do mal. Entenda de uma vez essa questão. Um terreno que movimenta pesquisas, questões legais, religiosas, tempo e muito dinheiro. É seguro comer alimentos transgênicos? Inserir genes de uma espécie dentro de outra pode ou não prejudicar o ambiente? Eis o centro da polêmica. O livro abre um leque de argumentos favoráveis e contrários.
‘A biotecnologia é amplamente utilizada na indústria alimentícia, sendo responsável por salvar da morte gerações inteiras de bezerrinhos (de cujo estômago se extraia uma enzima usada na fabricação de queijo, agora produzida por microorganismos geneticamente modificados). A mesma biotecnologia criou a soja transgênica, mas ela é de fato uma boa solução para a agricultura?’, observa a autora. Um dos melhores livros da série. Merece ser lido com atenção.
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Jornalista, escritor, ensaísta e pesquisador, formado em Economia (UFMG), pós-graduado em Jornalismo Contemporâneo (UNI-BH), autor de Pavios Curtos (anomelivros, 2004) e Em Linha Direta (no prelo); Belo Horizonte